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Filme jovem, temas adultos: Herdeiro de "A Culpa" aborda morte para teens

Cena do filme "Tudo e Todas as Coisas" 2 - Divulgação - Divulgação
Amandla Stenberg e Nick Robinson são o par romântico de "Tudo e Todas as Coisas"
Imagem: Divulgação

Eduardo Graça

Colaboração para o UOL, em Nova York (EUA)

15/06/2017 04h00

A expectativa não poderia ser diferente. "Tudo e Todas as Coisas", a partir desta quinta-feira (15) nos cinemas brasileiros, tinha tudo para ser uma espécie de "A Culpa É das Estrelas". A história gira em torno de um casal de adolescentes, envolve uma doença aparentemente incurável, e traz um galã (Nick Robinson) compreensivo, boa-pinta e proto-feminista.

Enquanto "A Culpa..." foi inspirado pelo best-seller de John Green e transformou de vez a protagonista Shailene Woodley em estrela de Hollywood, "Tudo e Todas as Coisas", publicado em 2015 pela americana de origem jamaicana Nicola Yoon, também ganhou legiões de fãs entre leitores adolescentes, inclusive no Brasil, justamente por causa da protagonista Maddie, vivida no filme por Amandla Stenberg ("Jogos Vorazes"). A atriz de 18 anos, ainda mais militante do que a ecologicamente correta Shailene, é o maior destaque do filme dirigido pela canadense Stella Meghie. Mas nem tudo é, afinal, aquilo que parece.

Cena do filme "Tudo e Todas as Coisas" - Divulgação - Divulgação
Amandla Stenberg e Ana de la Reguera em cena de "Tudo e Todas as Coisas"
Imagem: Divulgação

"Não. Para mim, os dois filmes são como água e vinho", diz Amandla, negando as comparações com "A Culpa...". "São dois filmes românticos sobre adolescentes, mas até a premissa da doença é completamente diferente. É uma história sobre uma menina lidando com sua doença, o que vai surpreender o público".

Stella deixa claro ser fã de "A Culpa..." e do diretor Josh Boone, mas a cineasta também traça uma linha divisória entre os dois filmes teen. "Minhas aspirações foram bem diferentes das do Josh, creio. Ele não foi uma influência direta. Vi dois filmes repetidas vezes antes de começar a dirigir: 'Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças' (2004), de Michel Gondry, por causa do surrealismo, e 'A Grande Beleza' (2013), de Paolo Soerrentino, um dos meus filmes favoritos na vida".

Amandla, Stellla e Nicola são negras, uma das diferenças mais nítidas entre "A Culpa..." e "Tudo e Todas as Coisas" já que o casal central é birracial. E, igualmente significativo, o fato é apresentado no filme como corriqueiro. "A gente se acostumou a ver apenas um tipo de história sobre minorias na ficção, o que é muito perigoso", aponta a autora. "Negros, homossexuais, mexicanos, não são um bloco único. Não é porque se tem a mesma cor de pele ou sexualidade que as pessoas são iguais", diz Nicola.

Preconceito racial não é obstáculo para o amor de Olly e Maddie. E, aqui, família disfuncional é a do menino branco, que muda de cidade em cidade por causa da realidade dos pais. O problema central para o amor dos protagonistas é a doença rara de Maddie, que a impede de sair de casa e ter contato físico com qualquer pessoa além do trio feminino formado por sua mãe, a enfermeira de origem latino-americana e a filha dela, sua melhor amiga.

Literatura jovem, temas adultos

A trama ganha em complexidade com diagnósticos médicos pouco ortodoxos, mas acaba centrada, assim como outros títulos para adolescentes, em temas sérios, como depressão, o relacionamento entre jovens e seus pais, e a possibilidade real da morte quando ainda jovem. Sim, exatamente como "A Culpa..." e, mais recentemente, a serie da Netflix "13 Reasons Why".

"A literatura para jovens está passando por um momento crucial. Parece ter sacado que os adolescentes passam pelos mesmíssimos problemas dos adultos, só que com uma grande diferença: eles estão encarando estes obstáculos pela primeira vez", diz Nicola, que segue: "Os jovens de hoje estão se questionando sobre temas como vida e morte".

Amandla concorda com a tirada existencialista da escritora. Para a atriz, Hollywood não descobriu apenas mais um filão lucrativo com os filmes com temas profundos voltados para o público jovem. A indústria do cinema americano está, ela diz, "correndo atrás" para refletir, na tela, o que a internet e as redes sociais já descobriram há tempos.

"Hoje nós, jovens, podemos criar nossas plataformas de conteúdo muito facilmente. Tratamos do que lemos, do que sentimos, de nossas aspirações e dores. E atingimos tanta ou mais gente do que muitos filmes. É natural levar esta força viva para o cinema, e filmes como o nosso buscam dialogar com este público, pela linguagem da cultura pop, mas sem medo de passear por temas de conteúdo mais denso", acredita a atriz.

Ela não se avexa em tratar, nas mais diversas mídias, de questões de gênero, sociais e de identidade. Amandla se revelou bissexual e diz que "fazer do mundo um lugar melhor" é o mínimo que qualquer cidadão, jovem ou não, pode almejar.

"O ativismo, para mim, é natural. A paixão pelo manifestar-se publicamente sobre temas que considero importantes vem de um monte de influências, incluindo a minha mãe. Desde os 11 anos tenho uma conta no Instagram, que foi minha primeira plataforma para me relacionar com o mundo, através de fotos muitísismo mal feitas, mas com motivações muito claras", conclui.