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Como a Netflix sabe o que você quer ver? Executivo da empresa explica

Netflix divulgou pesquisa sobre quais séries levaram o público a acompanhar os heróis da Marvel - Divulgação/Netflix
Netflix divulgou pesquisa sobre quais séries levaram o público a acompanhar os heróis da Marvel Imagem: Divulgação/Netflix

Beatriz Amendola

Do UOL, em São Paulo

22/08/2017 09h00

“Diga-me com quem andas que te direi quem és”. Na Netflix, a frase pode facilmente ser adaptada para “diga-me que séries vês que te direis quais você vai ver depois”, já quem um dos pilares do serviço de streaming está na habilidade de sugerir novas séries e filmes ao usuário com base no que eles acabaram de assistir (e gostaram).

No sistema, produções tão diferentes como “Jessica Jones” e “Orange Is the New Black” podem estar relacionadas, como descobriu a Netflix com uma pesquisa sobre quais outras séries levaram o público a embarcar nas tramas feitas em parceria com a Marvel – a mais recente, “Os Defensores”, estreou na última sexta-feira (18).

Na pesquisa, a empresa descobriu alguns padrões: anti-heróis como os de “Breaking Bad”, “Dexter”, “Bloodline” e “House of Cards” levam os espectadores a “Demolidor”; já quem vê “Jessica Jones” gosta de histórias criminais como “Making a Murderer”, com mulheres fortes, como “Orange”, ou com um senso de humor afiado, como “Friends” e “Master of None”.

“Luke Cage”, por sua vez, atraiu os fãs de produções sobre o lado sombrio da sociedade, como “Amanda Knox” e “Black Mirror”, e de mundos perigosos, como os de “Narcos” e “The Walking Dead”. Já “Punho de Ferro” foi a escolha de quem gosta de histórias de amadurecimento, como “Love” e “13 Reasons Why”, e de produções sobre o mundo da luta, como o “Ultimate Beastmaster”. 

Entre os assinantes que assistem às séries da Marvel na Netflix, um em cada oito não consumiam conteúdo baseado em histórias em quadrinhos. E coisas similares acontecem com outros gêneros: um em cada cinco fãs de “Stranger Things” não via produções de terror antes de embarcar na série.

Mas o que explica que coisas tão diferentes como “Friends” e “Jessica Jones” estejam ligadas, além do humor presente nas duas produções? Particularidades de gênero têm seu papel, mas são os assinantes que ditam os rumos. “Nós não tomamos essa decisão, nossos membros e o comportamento deles tomaram essa decisão”, explica Todd Yellin, vice-presidente de produtos da Netflix e responsável pelo algoritmo de recomendações aos usuários.

“Nós notamos que há centenas de milhares de pessoas ao redor do mundo que tendem a assistir uma coisa e também a assistir e gostar de ‘Jessica Jones’. É o comportamento deles que nos disse que deveríamos colocar essas duas coisas juntas, não necessariamente os nossos palpites. Porque se confiamos apenas nos palpites, frequentemente vamos estar errados”.

E o sistema dá resultado: segundo Yellin, 80% do que os assinantes escolhem na Netflix aparece no topo das recomendações para elas. “Muito do que as pessoas escolhem se baseia em encontrar o que é popular nas comunidades nas quais elas estão interessadas. É claro que quem assiste ‘Demolidor’ ou ‘Jessica Jones’ às vezes é apenas um fã de quadrinhos e está nesse nicho. Mas é provável que eles gostem mais de mulheres fortes, como a Jessica Jones, ou de ação sombria e violenta, como em ‘Demolidor’. Cada um deles tem traços específicos e isso é o mais importante na hora de encontrar o público para essas séries, mais importante até do que o fato de eles serem baseados em história em quadrinhos”.

Opções crescentes

Na hora de apresentar novos filmes e séries aos usuários, a Netflix tem de lidar com o desafio de um catálogo cada vez maior. Neste ano, a empresa está investindo US$ 6 bilhões em conteúdo original e já estreou dezenas de filmes e séries, mas muito disso nem será visto pelo assinante: segundo Yellin, em média as pessoas olham apenas 40 ou 50 títulos antes de escolher algo para ver.

Série "Friends" - Divulgação - Divulgação
"Friends" tem mais a ver com "Jessica Jones" do que você pensa
Imagem: Divulgação

Como então fazer o usuário se interessar? Dando ainda mais informações para que ele possa escolher, como um recurso disponível desde o ano passado para quem acessa a Netflix pela TV. “Para tornar mais fácil encontrar algo, você tem que colocar a informação na frente das pessoas. Quando você para em um título, automaticamente entra um trailer que vai te mostrar, imediatamente, se aquilo é algo que você curte”, conta o executivo.

Também no último ano, a Netflix abandonou a separação por países e regiões para tornar seu sistema mais eficiente. “O que descobrimos, por experiência, é que conseguimos reunir dados de um jeito muito mais inteligente se colocamos tudo junto e tornamos o algoritmo global. Alguém que mora em São Paulo pode ter um gosto mais parecido com o de alguém do Norte da Califórnia, onde eu vivo, do que com alguém do mesmo bairro”.

E nas séries novas?

Os dados coletados pela Netflix já trouxeram bons resultados no que se refere a produtos originais: “House of Cards”, a primeira série própria da empresa, foi o resultado de uma análise que provou que os trabalhos do diretor David Fincher e do ator Kevin Spacey, além da versão britânica da trama, eram muito bem assistidos na plataforma. O caminho, porém, não foi o mesmo traçado pelas produções da Marvel.

“A Marvel e a Netflix estão criando histórias boas e atraentes que tenham variedade”, diz Yellin. “Como acabamos fazendo isso: Nós vamos a uma companhia como a Marvel, nos reunimos e dizemos a eles: ‘para a Netflix, há tantos gostos no mundo, quando criarmos essas histórias baseadas nas suas histórias em quadrinhos, nós queremos realmente usar as particularidades delas’. É por isso que ‘Luke Cage’, que se passa no Harlem e se centra na comunidade afro americana, é tão diferente de ‘Punho de Ferro’, que é um jovem rico e brando em Manhattan, que sai em uma jornada à Ásia e descobre uma coisa”.

No fim das contas, de acordo com o executivo, o que importa é a diversidade: “Há pessoas que gostam tanto de ‘Luke Cage’ como de ‘Punho de Ferro’, mas há muitos outros que gostam de uma ou de outra, e formam públicos diferentes. Então quando pensamos em criar essas histórias com a Marvel, o que gostamos é que elas têm histórias diversas”.