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Com mais de R$ 4 mi captados, filme sobre RiR está há 2 anos na geladeira

Leonardo Rodrigues

Do UOL, em São Paulo

03/10/2017 04h00

"Se a Vida Começasse Agora", filme que tem o Rock in Rio como pano de fundo, deveria ter sido lançado nas comemorações de três décadas do festival, completadas em 2015. Não foi. Passados dois anos e duas edições do evento, o longa ainda é uma incógnita para sua distribuidora, para o próprio Rock in Rio e até para pessoas diretamente envolvidas na produção, estrelada por Caio Castro, Luiza Valdetaro e Marcelo Serrado, que interpreta o empresário Roberto Medina.

A história foi dirigida por Alexandre Klemperer ("Salve Jorge" e "Caminho das Índias") e teve cenas rodadas há dois anos no Brasil e nos Estados Unidos. Conta a saga de um casal (Caio e Luiza) que se conhece durante o primeiro ano do festival e se reencontra em edições posteriores. Nelson Freitas, Sophia Abrahão, Ícaro Silva e Karen Junqueira também integram o elenco.

Ostentando a marca de um dos maiores eventos do planeta, o projeto ainda está em fase de captação de recursos. Apenas um teaser e algumas cenas foram divulgadas pela distribuidora Imagem Filmes em 2015, incluindo a do histórico encontro entre Roberto Medina (Marcelo Serrado) e o cantor Frank Sinatra.

Por trás do filme está o produtor catarinense Roberto Carminati, sócio da Influência Filmes. Ela foi autorizada pela Ancine (Agência Nacional de Cinema) a captar R$ 5,9 milhões via Lei do Audiovisual, que concede incentivos fiscais a pessoas físicas e empresas privadas patrocinadoras. Em 2016, após cinco anos, o orçamento saltou para R$ 8,5 milhões. Desse total, R$ 4,2 milhões foram levantados, segundo a agência —a captação teve início em agosto de 2011 e, há pouco mais de um mês, foi estendida pela terceira vez, até o fim de dezembro.

O produtor Roberto Carminati - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
O produtor Roberto Carminati
Imagem: Reprodução/Facebook

O UOL entrou em contato sucessivas vezes com Roberto Carminati e seu sócio Erico Ginez nas últimas semanas, em busca de informações sobre o longa, mas não obteve retorno em ligações, mensagens de celular e e-mails. Procurada, a distribuidora Imagem Filmes diz não saber o motivo do atraso e que não há previsão de lançamento. Atores do filme também não foram informados sobre a finalização e nem se novas filmagens seriam realizadas.

De acordo com o diretor Alexandre Klemperer, que abandonou o projeto, houve um sério atraso de cronograma. "Não sei o que ocorreu", afirma ele. "Tive que retornar à Globo para dar início a uma novela ['Haja Coração'], e a direção do filme retornou às mãos do Roberto Carminati. Ele me convidou para dirigir o filme porque havia sofrido um acidente grave que havia limitado seus movimentos, mas, quando saí, ele já estava apto a retornar."

O produtor Diller Trindade, amigo de Roberto Medina e que trabalhou no roteiro a pedido de Carminati, aposta na tese da dificuldade em captar recursos. "O Medina já cobrou o lançamento. Vivemos uma das piores crises da história. Imagino que agora seja o momento de esperar a crise passar", pondera. "O que sei é que 50% foi filmado. Falei com o Carminati há uns meses, e ele estava apreensivo com as mudanças recentes feitas na direção no Ministério da Cultura, que poderiam atrasar o processo."

"Não sou produtor do filme, por isso não estou a par do andamento. Fui contratado apenas para escrever a história e até acompanhei algumas filmagens, mas não sei em que pé as coisas estão", completa o roteirista oficial do longa, Zé Dassilva.

Procurado pelo UOL, o Rock in Rio diz não saber por que o filme está parado, já que vinha acompanhando o projeto pontualmente. O festival frisa que não financiou a produção, autorizando apenas o uso de sua imagem. A questão financeira ficaria a cargo exclusivo da Influência Filmes. "Encontrei com os atores, e eles todos foram pagos", diz Roberta Medina, vice-presidente do Rock in Rio. "Estive junto quando eles foram para Las Vegas filmar, no Rock in Rio Las Vegas, mas confesso que não sabemos onde a história parou."

Marcelo Serrado como Roberto Medina em cena do filme "Se a Vida Começasse Agora" - Divulgação - Divulgação
Marcelo Serrado como Roberto Medina em cena do filme "Se a Vida Começasse Agora"
Imagem: Divulgação

Acusação de golpe

O atraso na entrega de "Se a Vida Começasse Agora" não é o primeiro no currículo de Roberto Carminati, que já dirigiu produções da Globo como "Amazônia, de Galvez a Chico Mendes" e "Caminho das Índias" e filmes como "A Fronteira" e "Segurança Nacional" —este último demorou mais de três anos para vir à luz, e, durante a produção, o catarinense foi condenado pela Justiça do Trabalho a indenizar em R$ 10 mil o ator Marcio Rosario por falta de pagamento.

O caso de maior repercussão envolve o filme "O Arrasa Corações" ("Hertbreaker"), que Carminati dirigiu e produziu em parceria com a americana Sunshine Entertainment, do executivo brasileiro Francisco das Chagas. Estrelado por Giovana Antonelli, o longa saiu apenas nos Estados Unidos via streaming, após Carminati ser acusado de paralisar as filmagens e tentar se apropriar dos direitos da obra.

O cineasta alegou que a Sunshine não depositara o investimento previsto em contrato, inviabilizando o lançamento e a distribuição. O filme foi financiado com com dinheiro público: R$ 1,2 milhão oriundo do Fundo Estadual de Incentivo ao Turismo (Funturismo) de Santa Catarina. O Ministério Público denunciou as irregularidades no repasse dos recursos, e o caso foi parar na Justiça. Em 2016, Carminati foi condenado pelo Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina a devolver R$ 980 mil aos cofres públicos.

"Não conheço ninguém que tenha uma boa história dele para contar. Ele tem mente de estelionatário, já me acusou de ameaça de assassinato. Nós entramos na Justiça americana para conseguir as fitas e tivemos acesso a parte do material, com qualidade questionável. Então descobrimos para onde havia ido o dinheiro que mandamos [cerca de US$ 450 mil]. Ele comprou câmeras e lentes [da marca] Red para alugá-las por meio de uma produtora no Rio", diz Francisco das Chagas.

O executivo denuncia ainda calote de fornecedores, falsificação de documentos e a transferência para seu nome de uma dívida de quase US$ 30 mil referente à produção do filme "A Fronteira" (2003), lançado antes de ele conhecer o produtor. Questionada pelo UOL, a empresária Roberta Medina se mostrou surpresa com esse histórico. "Estou sabendo disso tudo agora com você. Se soubéssemos antes, quando autorizamos o projeto, poderíamos ter repensado."