Incômodo, filme de Danilo Gentili deixa no chinelo "peladão" do museu
O que é arte? A pergunta, tão vaga quanto chata, está no centro da polêmica de duas exposições que, segundo grupos conservadores de direita, "erotizam as crianças" e "fazem pedofilia". Pois um dos ídolos dessa "patrulha", Danilo Gentili, produziu um filme que põe no chinelo a "criança viada" da exposição "Queermuseu" e o "peladão" do MAM (Museu de Arte Moderna de São Paulo).
Do ponto de vista cinematográfico, "Como se Tornar o Pior Aluno da Escola", que estreia nesta quinta-feira (12), é uma obra de arte, embora tenha "roteiro de filme lixo", como o próprio filme brinca. Despretensiosos, Gentili e o diretor, Fabricio Bittar, simplesmente emularam o humor inconsequente de clássicos da "Sessão da Tarde" e do "Cinema em Casa" (inclusive produziram uma chamada com o locutor do SBT), como "Porky's" (1982) e "Curtindo a Vida Adoidado" (1986).
Mas não chame um conservador para assistir a "Como se Tornar o Pior Aluno da Escola". Se os "patrulheiros" invadiram o MAM a socos e pontapés exigindo a prisão de Wagner Schwartz por "pedofilia", porque uma menina acompanhada da mãe tocou o pé, a canela e a mão do corpo nu do artista, imagine a histeria deles ao ver uma cena de masturbação entre um homem e o protagonista de 14 anos no filme de Gentili! E mais: como reagiriam ao ver os testículos do humorista na tela grande?
No longa, Gentili ensina dois estudantes de 14 anos a deixarem de ser "cabaços" (palavra repetida 27 vezes no longa). Eles bebem cerveja (o público não sabe que é guaraná), fumam, fazem bullying e objetificam mulheres. Para a "patrulha" de esquerda, será mais um pretexto para xingar o humorista. Já a "patrulha" de direita, que se chocou com o "peladão" do museu, terá motivos para invadir a casa de Gentili, do diretor, a sede da distribuidora, Paris Filmes...
Por isso, não há época melhor para Gentili lançar o filme, baseado no seu livro de 2009 em que conta como se tornou o pior aluno de sua escola. Em produção há quase seis anos, ele chega ao cinema no momento de forte contestação artística e mobilização em defesa da família, da moral e dos bons costumes. Todos os bons costumes, aliás, foram ridicularizados no longa. Quem quiser ver zoeira juvenil sairá feliz no final da sessão.
Aula de malandragem
Vamos à história: um adolescente dedicado nos estudos começa a ir mal nas provas e precisa de uma nota dez para não ser reprovado, quando encontra uma caixa de sapatos Kichute (uma das referências do filme aos anos 80) com o guia para ser o pior aluno da escola. Ele e outro colega chegam ao autor da obra, interpretado por Gentili, que no filme é praticamente o "rei do camarote" e sempre se dá bem em suas "pequenas corrupções".
Os "bons costumes" são representados por Carlos Villagrán, o eterno Quico da série "Chaves". Ele interpreta o diretor da escola onde os discípulos de Gentili estudam, Ademar Frederico Melquior (uma das várias citações a "Chaves" no filme). Ele se orgulha por ter eliminado o bullying da instituição, mas logo é surpreendido pelas travessuras dos dois alunos.
Mesmo tendo aprendido português, Villagrán sofre para pronunciar palavras simples, como "rebeldia". Algumas frases ficaram ininteligíveis, mas o próprio filme faz piada com o ator mexicano: "Por que contratamos se não entendemos nada do que ele fala?".
A escola-modelo também tem suas "maçãs podres", como diz Ademar Melquior: Olavo, faxineiro interpretado por Moacyr Franco, dá aval para as crianças aprontarem, e o professor de História vivido por Rogério Skylab não para de pedir aumento e "rouba" até no café da sala dos mestres.
Após aprender a arte da malandragem com Gentili, os estudantes tocam o terror na escola. Se passasse na "Sessão da Tarde", o locutor diria que "essa turminha da pesada apronta altas confusões". Explosões, brigas e fugas em alta velocidade fazem as duas crianças parecerem a versão brasileira do endiabrado "Pestinha".
O filme traz um convite à anarquia e ao lema "f... o sistema" --a palmatória na primeira cena e a trilha sonora roqueira reforçam a ideia. É praticamente um "Another Brick in the Wall" da zoeira. Como Gentili explicou aos jornalistas, a escola é uma metáfora de outros cenários "opressores", como faculdade, trabalho ou qualquer lugar com que o espectador pode se identificar (há o projeto de lançar uma trilogia com outros ambientes).
Ao mostrar o diretor, que proibiu o cigarro na escola, fumando escondido, o longa também manda um recado para a sociedade conservadora e hipócrita, a mesma que deve "patrulhar" as cenas polêmicas com as crianças protagonistas. Se a arte serve para chocar e incomodar, "Como se Tornar o Pior Aluno da Escola" o faz com louvor.
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