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"Black Mirror": "Black Museum" mistura horror e fan service

Rolo Haynes (Douglas Hodge) recebe Nish (Letitia Wright) em seu Black Museum - Jonathan Prime/Netflix
Rolo Haynes (Douglas Hodge) recebe Nish (Letitia Wright) em seu Black Museum
Imagem: Jonathan Prime/Netflix

Beatriz Amendola

Do UOL, em São Paulo

12/01/2018 09h29

“Black Museum”, sexto e último episódio da quarta temporada de “Black Mirror”, é praticamente uma antologia dentro da antologia. Como o especial “White Christmas” fez antes, ele amarra três contos – mas, dessa vez, pendendo mais para o horror e com uma trama pontuada por inúmeras referências a capítulos passados, no momento mais “fan service” que a série já teve.

Atenção: O texto traz spoilers abaixo. Não leia se não quiser saber o que acontece.

O museu que dá nome ao episódio tem um acervo peculiar (e macabro), formado por objetos tecnológicos que foram usados em crimes. Estão lá o pirulito de “USS Callister”, o tablet de “Arkangel”, a banheira de “Crocodile” e uma abelha de “Hated In The Nation”, só para citar alguns. A viajante Nish (Letitia Wright) acaba em uma visita ao local, conduzida por seu idealizador, Rolo Haynes (Douglas Hodge).

"Black Museum", de "Black Mirror" - Reprodução - Reprodução
"Black Museum" tem momentos perturbadores
Imagem: Reprodução

Antes de abrir o museu, Haynes trabalhava com inovações tecnológicas dentro de um hospital chamado St. Juniper (pegou a referência?), onde conduzia experimentos de ética questionável – todos relacionados a transmissão de sensações e consciência. Ele começa contando a sua única visitante a história de Peter Dawson, um dos médicos da instituição. Abalado pela perda de alguns de seus pacientes, Dawson é abordado por Haynes com uma oferta irrecusável: colocar um implante que, usado em conjunto com uma touca, permite a ele sentir o que seus pacientes estão sentindo. As coisas dão errado bem rápido, e Dawson se torna viciado em dor, tendo que ir cada vez mais longe para satisfazer seus impulsos.

A segunda história gira em torno de Carrie e Jack. Os dois começam como um casal apaixonado com um filho, mas ela é atropelada e acaba em um coma profundo. Haynes, mais uma vez, traz uma proposta tentadora. Ele oferece transmitir a consciência de Carrie para a mente de Jack, o que permitiria que ela pudesse não apenas conversar com o marido, como voltar a abraçar o filho pequeno. Está mais do que claro que isso não é uma boa ideia, mas Jack, fragilizado, aceita. A boa convivência dos dois dura pouco e, quando uma outra mulher aparece em cena, Carrie é colocada em um macaco de pelúcia que só pode realizar duas ações: dizer “macaco te ama” ou “macaco precisa de um abraço”.

A terceira e última história é reservada para a principal atração do museu: o holograma de um homem negro, Clayton, injustamente condenado à morte pelo assassinato de uma mulher. Acionando uma alavanca, os frequentadores podem vê-lo novamente fritando na cadeira elétrica, o que torna se torna um atrativo para os clientes sádicos (e racistas).

À moda “Black Mirror”, uma reviravolta encerra o episódio: Nish é, na verdade, filha de Clayton, e foi ao museu para se vingar de Haynes – o que ela consegue fazer em grande estilo.

“Black Museum”, o episódio mais polêmico da temporada, é um desvio do tom realista que permeia a maior parte dos episódios da série. O episódio privilegia o horror, seja na claustrofobia do confinamento de Carrie, no ciclo eterno de dor ao qual Clayton é submetido ou nas cenas explícitas de violência que o médico Peter Dawson comete contra si e contra os outros – duas delas estão entre as mais fortes já vistas em “Black Mirror”, e podem cair mal entre os mais fracos de estômago. Os toques de um humor ácido trazido pela narração de Haynes dão o toque final na trama.

Não espere, aqui, o tapa na cara que tantos episódios da trama trazem. As histórias de Hayes trazem assuntos sérios como vício e racismo, mas eles são apenas pincelados de forma superficial. O momento de Clayton, o condenado à morte, tinha potencial para trazer a grande catarse do episódio ao expor o lado mais cruel da tecnologia de transmissão de consciência, mas acaba ficando aquém do esperado ao deixar de entrar de cabeça no tema para privilegiar a surpresa final.

O episódio também peca por seu ritmo. Com 1h09, ele é um dos mais longos da temporada, e acaba se dando ao luxo de estender seus contos de forma desnecessária; quando o último finalmente começa, o espectador já está cansado. 

O maior acerto de “Black Museum” está seu aceno ao quadro geral da série, o que faz com que ele funcione muito bem como o encerramento da temporada. Além de divertir os fãs, as pequenas referências deixadas pelo episódio têm uma função clara: elas estabelecem um universo compartilhado “Black Mirror”, o que tem motivado uma série de teorias na internet e deve, inclusive, servir de base para a condução de futuras temporadas. A julgar pelo pós-apocalipse de “Metalhead”, o futuro não será gentil com a humanidade na trama.