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Opinião: Preso no passado, "Arquivo X" não sobrevive no mundo de hoje

Dana Scully (Gillian Anderson) e Fox Mulder (David Duchovny) em cena de "Arquivo X" - Divulgação
Dana Scully (Gillian Anderson) e Fox Mulder (David Duchovny) em cena de "Arquivo X"
Imagem: Divulgação

José Bueno de Souza

Do UOL, em São Paulo

13/01/2018 04h00

Aconteceu outra vez. Na noite desta quinta-feira, a Fox exibiu a estreia da 11ª temporada de "Arquivo X", e eu me juntei às estatísticas de velhos fãs da série que reencontraram seus paranoicos preferidos: Mulder e Scully. E, exatamente como em 2016, o retorno foi em vão. Os personagens estão lá, Mulder está sempre disposto a se meter em uma conspiração, Scully tenta puxá-lo para a realidade, mas, a essa altura do campeonato, não há mais ceticismo que resista.

Muita água adulterada por grupos governamentais secretos já passou por debaixo da ponte para que se possa negar que os homenzinhos verdes (ou cinzas, como preferir) estão por aqui. E é justamente essa relutância em seguir à frente o principal problema desta nova fase da história.

A retomada da série tenta retirar dois chips implantados nas nucas de seus fãs. Primeiro, desfazer a bagunça que se instaurou ao final do 7º ano, quando David Duchovny deixou o elenco permanente para só fazer algumas aparições pontuais até a desastrosa conclusão da 9ª temporada, em 2002. Em segundo lugar, procura uma maneira de recolocar as peças fundamentais da trama em suas posições características. Eis que o Canceroso volta a ser o grande mestre tramando com alienígenas para a dominação mundial, Skinner novamente é o aliado dúbio e o grande conselho do Garganta Profunda - “não confie em ninguém, agente Mulder” - continua sendo sumariamente ignorado pelo protagonista, que se vê perdido. 

Mas, ao fazer essa ginástica narrativa, a trama acaba passando do ponto em olhar para trás e tentar referenciar momentos do passado mais interessantes de "Arquivo X". Aparecem então explicações malandras, com o Canceroso tentando nos convencer de que tudo está correndo de acordo com o planejado:  desde aquela cena da primeira temporada em que Scully é incumbida pelos seus chefes de trabalhar com o “estranho” Mulder.

A intenção é positiva (qualquer coisa é melhor que o primeiro final da série), e o coração do fã pode até fazer uma força para reavivar aquele sentimento de perseguição e de desamparo. Não custa lembrar que naqueles tempos em que a série era exibida na Record e a internet só tinha mato, as dúvidas e meias explicações deixadas pelas aventuras dos agentes eram mais do que suficientes para alimentar a curiosidade do público. Hoje, porém, o cenário é diferente. A vigilância já venceu: está nos nossos smartphones. O terror agora não é mais um monstro ou uma conspiração, mas os nossos espelhos, a sociedade conectada. Agora, nenhum mistério parece capaz de sobreviver por muito tempo antes de ser gravado no celular de alguém e multiplicado em Whatsapps e Facebooks instantaneamente. 

Aquelas instigantes atividades paranormais não sustentam mais o mesmo interesse, inclusive por causa das explicações mirabolantes que a série tentou nos dar nesses anos todos. O que restou à nova volta do "Arquivo X" então é um primeiro episódio cheio de perseguições de carros, armas apontadas para as cabeças das pessoas e um monte de frases de efeito do Canceroso. O segundo episódio – como era comum acontecer nos tempos áureos da série – diminui um pouco o tom, mas continua com Mulder e Scully fugitivos e agora se deparando com os falecidos Pistoleiros Solitários, outra dívida deixada pela conclusão da 9ª temporada.

A verdade (que continua lá fora) é que a 11ª temporada até que pode tocar o fã saudoso, mas não conseguiu nestes dois primeiros episódios mostrar ser mais do que nostalgia e propor uma renovação para a história sem reciclar a velha conspiração comandada pelo grande vilão e seus cigarros Morley.