Novo "Wall Street" atualiza especulação econômica
SÃO PAULO - Enquanto a maioria dos filmes hollywoodianos parece insistir que os anos de 1980 ainda não acabaram, "Wall Street - O Dinheiro Nunca Dorme" caminha exatamente na direção contrária.
Logo na primeira cena, estabelece que aquela década é coisa do passado. O protagonista do primeiro filme, Gordon Gekko (Michael Douglas), sai da prisão e recebe seus pertences - entre eles, um gigantesco telefone sem fio, um verdadeiro monstro comparado aos celulares minúsculos da atualidade.
É assim que o diretor Oliver Stone estabelece o tom do seu novo filme, que estreia em circuito nacional. Não estamos mais na era yuppie, época retratada no primeiro "Wall Street - Poder e Cobiça" (1987) e também de forma sarcástica em "O Psicopata Americano" (2000). O novo século trouxe não apenas novas tecnologias, mas novos valores morais e econômicos.
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Gekko, mais do que um exemplo a não ser seguido, com seu lema "ganância é bom", definiu uma geração que, na superfície, se transformou na década de 1990, mas no fundo manteve a mesma moral dúbia e egoísta.
No primeiro filme, Stone penetrou num mundo pouco conhecido, e, por isso mesmo exótico. Termos, siglas e operações pareciam fazer parte de uma língua de outro planeta. Agora, mais de 20 anos e crises econômicas mundiais depois, nada daquilo é misterioso. Neste cenário, entra o termo "risco moral", que, associado com os altos e baixos da economia, pode trazer resultados desastrosos para investidores.
No roteiro assinado por Allan Loeb ("Coincidências do Amor") e Stephen Schiff ("Crime Verdadeiro"), a crise econômica de 2008 substitui a Segunda-feira Negra de outubro de 1987. Este se torna, assim, um dos primeiros filmes a ter a grande quebra dos mercados como tema. Não apenas isso: Stone faz questão de apontar dedos para os responsáveis.
Ao sair da prisão, Gekko torna-se uma espécie de palestrante motivacional, excursionando por escolas e vendendo sua biografia. Jacob (Shia LaBeouf, da série "Transformers") é um corretor que poderia transformar-se em Gekko dentro de duas décadas. Mas o rapaz tem outra visão sobre o mundo e a especulação, especialmente depois que seu protetor, Zabel (Frank Langella, de "Frost/Nixon"), se mata quando circulam rumores sobre uma dívida de milhões. A empresa dele acaba comprada por Bretton (Josh Brolin, que interpretou George W. Bush em "W.", também de Stone) - e este se torna o vilão do filme.
Jacob é namorado de Winnie (Carey Mulligan, de "Educação"), filha de Gekko que rompeu os laços com o pai negligente depois do suicídio do irmão. A trama familiar tem um peso tão importante quanto a econômica em "Wall Street - O Dinheiro Nunca Dorme". Talvez seja nesses momentos que a história perde um pouco da sua força, ao retratar a transformação - um tanto forçada - de Gekko.
Stone sempre foi um diretor capaz de extrair entretenimento a partir de acontecimentos econômicos e sociais - especialmente em suas cinebiografias de presidentes americanos. Mas continua apegado a cacoetes cinematográficos desnecessários, como cortes e imagens múltiplas. Por outro lado, a fotografia realista de Rodrigo Prieto ("Abraços Partidos") e várias canções de David Byrne (algumas em parceria com Brian Eno) conseguem, em vários momentos, impor-se sobre estes problemas de direção.
Há na trama um paradoxo inevitável que já existia no primeiro filme: evitar que personagens negativos se tornem figuras carismáticas e poderosas. Há, como antes, a arrogância dos corretores e a ganância desmedida, mas também há o fascínio, especialmente por Jacob - que, apesar do modo yuppie de vida, enquadra-se no perfil de bom moço, pois pretende ajudar um cientista e sua pesquisa sobre sustentabilidade.
Stone parece tentar a todo custo evitar o maior problema do primeiro filme, uma parábola anticapitalista cujo personagem central é carismático, sedutor - ao contrário daquilo que o diretor esperava. Aqui, para não se ter dúvidas, Gekko se regenera antes da metade do filme, Jacob tem cara de bom rapaz e o vilão mostra a que veio logo no começo. Tudo isso não diminui o interesse e até certa relevância que "Wall Street - O Dinheiro Nunca Dorme" tem para os dias atuais.
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