"Família Vende Tudo" ri de preconceitos da classe média
De um filme cujo título nos créditos iniciais aparece na etiqueta de uma calcinha barata, pode-se esperar tudo, menos bom gosto. O resultado de "Família Vende Tudo", comédia de Alain Fresnot ("Desmundo", "Ed Mort"), não é de causar nenhuma surpresa, ao contrário do excesso de prêmios que o filme recebeu no último Cine PE, em abril passado, entre eles o de melhor ator para Caco Ciocler e melhor atriz, para Marisol Ribeiro (este dividido com Leandra Leal, por "Estamos Juntos").
O filme parte do pressuposto que uma família pobre e em sérias dificuldades venderia tudo para conseguir dinheiro - por "tudo", entenda-se a própria filha. Ariclenes (Lima Duarte, curiosamente, interpretando um personagem que leva o nome de batismo do ator) e Cida (Vera Holtz) moram na periferia de São Paulo e vivem de trambiques e muambas.
Quando um carregamento deles é confiscado na fronteira do Paraguai, a família tem uma ideia brilhante. A filha, Lindinha (Marisol), deverá seduzir o cantor brega Ivan Carlos (Ciocler) - rico, rei de um estilo chamado Xique, ele é uma espécie de sub-Latino (que, aliás, deu aulas ao ator e faz uma pequena participação no filme).
TRAILER DO FILME ''FAMÍLIA VENDE TUDO''
O artista fez rios de dinheiro explorando o gosto duvidoso do povão. Ariclenes e Cida tornam-se cafetões da filha e conseguem que seu plano dê certo. Apesar de casado com Jennifer (Luana Piovani), Ivan não pensa duas vezes em passar noites com fãs e dispensá-las na manhã seguinte.
Como esperado, o plano dá certo e a família vai cobrar seus lucros da gravidez da moça, batendo de frente com a primeira-dama do Xique. Nesse processo de ganhar dinheiro às custas de Lindinha, a família toda se corrompe. Até o filho evangélico (Robson Nunes) revela-se mais interessado no dinheiro do que em suas crenças.
Um a um, os personagens de "Família Vende Tudo" mostram-se corruptíveis. Se todos são imorais, o filme em si é extremamente amoral, debochando sem dó da classe C, partindo de preconceitos numa visão mundo-cão que ficaria bastante confortável em qualquer programa sensacionalista da televisão.
Não há qualquer preocupação em entender personagens, construir tramas, dramas e conflitos. A opção do diretor e roteirista do filme é simplesmente pelo escracho, forçando preconceitos ao extremo. Lindinha nada mais é do que uma versão das Maria Chuteiras no mundo musical, com a qual os pais encontram, na fragilidade moral de Ivan, a brecha para a tranquilidade financeira da família.
Desde sua concepção - ridicularizando seus personagens - o filme os julga e se coloca num patamar acima deles, olhando-os de cima para baixo. "Família Vende Tudo" opta pelo tipo de riso mais fácil, rápido e perigoso que pode existir: o que resulta do preconceito.
(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)
* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb
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