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"Trabalhar Cansa" combina realidade e sobrenatural

29/09/2011 09h02

"Trabalhar Cansa," que marca a estreia na direção de longas dos premiados curta-metragistas Juliana Rojas e Marco Dutra ("Um Ramo"), transita entre o horror e o drama social. Há ainda o horror que advém das diferenças sociais e do mercado de trabalho no Brasil, mas isso passa longe do sobrenatural, já que é o drama real da classe média.

O filme estreia em São Paulo, Rio de Janeiro, Campinas e Porto Alegre. Concorrente na seção "Un Certain Regard" no último Festival de Cannes e premiado no Festival de Paulínia deste ano (prêmio especial do júri e melhor som), "Trabalhar Cansa" participa da mostra competitiva do Festival de Brasília, que acaba na próxima segunda-feira.

Em sua obra, os diretores sempre lidaram com o sobrenatural, às vezes de forma explícita, às vezes apenas em um flerte. Por isso, não é de se estranhar quando esses elementos surgem em "Trabalhar Cansa" (título inspirado numa obra do italiano Cesare Pavese). Mas nem sempre há um trânsito orgânico entre eles e o realismo na trama, também assinada pelos diretores.

No filme, Otávio (Marat Descartes, de "Os Inquilinos") perde seu emprego na mesma época em que sua mulher, Helena (Helena Albergaria), abre um mercado de periferia. Chega à casa da família Paula (Naloana Lima), empregada e babá que vai cuidar da filha pequena, Vanessa (Marina Flores).

TRAILER DO FILME ''TRABALHAR CANSA''

Aos poucos, os papéis de Otávio e Helena se invertem. Ela se torna a chefe do lar, traz o dinheiro e sustenta a casa, trabalhando fora o dia todo, enquanto ele procura emprego e tenta pequenos bicos, como telemarketing. As relações trabalhistas também ficam tensas, tanto entre Helena e um funcionário de seu mercado, quanto entre o casal e a empregada.

O toque sobrenatural começa com um cachorro na porta do mercado e uma umidade inexplicável na parede do estabelecimento. Os elementos se intensificam e, mesmo que nunca totalmente explicados, servem como uma metáfora para as deturpadas relações familiares, sociais e trabalhistas dos personagens.

A simbologia acaba bastante carregada no filme e o foco recai sobre elementos de estranhamento, deixando narrativa e personagens em segundo plano. Há muitas vezes a necessidade de apenas estranhar, pelo simples estranhamento. Nem sempre isso causa uma reflexão ou perplexidade, algo que faria muito sentido por conta dos temas do filme.

A atriz Helena Albergaria, que participou de outros curtas da dupla, cria uma protagonista um tanto fria, distante, uma dona-de-casa que começa a se entusiasmar pelo capitalismo e quer se transformar numa mulher de negócios. Por outro lado, Marat Descartes é capaz de trazer à tona toda a humanidade e conflitos de seu personagem - de longe, o mais estruturado e complexo do longa.

(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb