Cineasta iraniano condenado à prisão desafia proibição de filmar em "Isto Não É um Filme"
SÃO PAULO (Reuters) - Apesar de todo o cerceamento que lhe vem sendo imposto pelo governo iraniano, o cineasta Jafar Panahi conseguiu, no começo de 2011, romper o círculo de silêncio com um novo filme, ironicamente chamado "Isto Não É um Filme" - um engenhoso título que ao mesmo tempo parodia a famosa obra do pintor surrealista René Magritte ("Ceci n'Est Pas Une Pipe" - "Isto Não É um Cachimbo"), bem como ironiza sua própria condição.
Um filme de guerrilha, autodocumentário, feito com a cumplicidade indispensável de um colega e compatriota, o codiretor Mojtaba Mirtahmasb, também preso e acusado de "espionagem" no Irã. O filme estreia nesta sexta-feira (2), apenas em São Paulo.
Simples até a medula, este manifesto visual saiu do Irã clandestinamente - num pendrive escondido num bolo - em maio passado, rumo a Cannes, o primeiro de uma série de festivais que o acolheram pelo mundo afora. Retrata o cotidiano solitário e claustrofóbico do diretor de "O Balão Branco", "O Círculo" (Leão de Ouro em Veneza), "Ouro Carmim" e "Fora de Jogo".
Proibido de sair de seu apartamento pelo estado de prisão domiciliar e desfrutando da companhia insólita de Igi, o iguana de sua filha, Panahi conversa com o colega que o filma, com parentes, amigos e com a advogada, pelo telefone - procurando saber suas perspectivas no apelo que fez a um tribunal para suspender sua sentença. Ele foi condenado a seis anos de prisão, mais 20 de proibição de filmar, escrever roteiros, falar com a imprensa e sair do país.
Dois contatos pessoais são acidentais. O primeiro, com uma vizinha que tenta convencê-lo a tomar conta de seu cachorrinho, o que acaba dando errado. O segundo, com um rapaz que veio buscar o lixo, um estudante de arte fazendo um bico e com quem o cineasta solitário puxa conversa e até dá uma pequena saída no elevador, até o pátio de entrada de seu prédio. Uma pequena e documentada transgressão ao seu cárcere privado.
O segmento mais comovente é quando Jafar tenta encenar algumas partes de um roteiro que não pode filmar. Quando ele constrói com uma fita o cenário do quarto da protagonista e descreve a situação de opressão da personagem (é uma menina que entrou na faculdade de arte, mas é trancada pelos pais para não se matricular), impossível não pensar na situação do próprio diretor, condenado por "agir contra a segurança nacional" e "criar propaganda contra o regime".
Poucos meses depois do filme, em outubro, a sentença do diretor foi confirmada por um tribunal em primeira instância, restando agora como última esperança de uma reversão um apelo à Suprema Corte do Irã. Um quadro, como se sabe, com poucas esperanças no curto prazo, já que existem vários outros cineastas, jornalistas, artistas e ativistas presos naquele país, bem como alguns que procuraram o exílio, caso de Mohsen Makhmalbaf, convidado da recente Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)
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