Em clima de terapia de grupo, Eduardo Coutinho mostra as músicas da vida de 18 personagens em "As Canções"
SÃO PAULO (Reuters) - O documentarista Eduardo Coutinho gosta de investigar os avessos. Prefere os bastidores às fachadas. Dos apartamentos de um prédio em Copacabana ("Edifício Master"), à religião ("Santo Forte"), à velhice ("O Fim e o Princípio"), aos sonhos de sindicalistas dos anos 1970/1980 ("Peões") e ao próprio teatro ("Moscou"), muitos temas passaram pelo crivo de sua curiosidade, tão reveladora quanto respeitadora da intimidade. Um verdadeiro paradoxo, mas Coutinho é isso mesmo. A antítese do reality show.
Seu foco mais recente é o cancioneiro brasileiro, não em si, mas as músicas que ficam na memória e sintetizam os momentos mais dramáticos da vida das pessoas. No filme "As Canções", que estreia em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília nesta sexta-feira (9), são 18 personagens, de um total de 42 filmados.
Todos deviam estar sozinhos e sentados diante da câmera - essa era a regra do diretor. Mas ele mesmo a transgride, deixando no filme alguns momentos em que os personagens se levantam e ficam em cena, às vezes já se despedindo, porque é aí que se revelam mais significativos.
O campeão de escolhas musicais é, como o diretor já esperava de antemão, Roberto Carlos. Coutinho pensou um dia em fazer um filme só sobre as músicas do cantor e compositor, mas desistiu - as negociações dos direitos seriam infernais. Aliás, "As Canções" é o primeiro filme de Coutinho que exige esse tipo de negociação.
Como sempre, a grande atração é humana. E o melhor está na história que cada um conta para explicar porque aquela determinada canção é a trilha de sua vida. Como o homem que canta "Esmeralda", de Carlos José, e chora lembrando da mãe de 85 anos - que, ao contrário do que se poderia imaginar, está viva. O mesmo homem, pouco depois, comenta o choro, para ele mesmo, inexplicável.
Outra mulher reconstitui um complicado caso de amor, que a levou a seguir o amado, suspeito de traição, num táxi - e foi aconselhada pelo taxista a não flagrá-lo ali. Um fã de Jorge Ben Jor utiliza a câmera para recordar as várias etapas de sua complicada e afinal feliz paixão por uma certa Jacira e pede, no fim, para louvar a Deus. Uma bela mulher encerra o filme, cantando "Retrato em Branco e Preto", de Chico Buarque, chave do epílogo de sua longa e tumultuada história de amor.
Não há grandes peripécias a contar nestas vidas, todas muito comuns e parecidas com as da plateia que as verá. Por isto é que uma sessão de "As Canções" terá tudo para se parecer com uma silenciosa terapia em grupo, em que ninguém precisa contar nada, só acompanhar no escuro. Cada um com a sua canção, ou canções, na cabeça, quem sabe concordando com algumas ouvidas na tela.
Coutinho mesmo, que jurou em entrevistas que não tem a música de sua vida, é ouvido cantarolando "Fascinação" junto com uma de suas personagens. O que certamente também não estava no script.
(Neusa Barbosa, do Cineweb)
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