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Ugo Giorgetti analisa ditadura por meio de relações familiares e sociais em "Cara ou Coroa"

Otávio Augusto vive pai reacionário em "Cara ou Coroa", filme de Ugo Giorgetti - Divulgação
Otávio Augusto vive pai reacionário em "Cara ou Coroa", filme de Ugo Giorgetti Imagem: Divulgação

Alysson Oliveira

Do Cineweb*

06/09/2012 09h03Atualizada em 07/09/2012 00h47

A dualidade do título do novo longa do cineasta Ugo Giorgetti (da franquia "Boleiros") é um indício do caminho que o filme irá percorrer: a história de dois irmãos, João Pedro (Emilio de Mello, de "Cazuza - O Tempo Não Para") e Getúlio (Geraldo Rodrigues, de "Linha de Passe"), que perdem a inocência no começo da década de 1970, durante os anos de chumbo da ditadura.

Entre esquerdistas e reacionários

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    "Cara ou Coroa", nono filme de Ugo Giorgetti, chega aos cinemas no feriado do dia 7 de setembro

O teatro é o pano de fundo de "Cara ou Coroa" e serve como uma metáfora para as relações familiares e sociais nas quais esses personagens estão envolvidos. João Pedro é diretor de teatro e, no momento, ensaia uma montagem de "O Interrogatório", de Peter Weiss. Mas seus problemas não são bem com a censura, mas com o Partido Comunista que espera catequizar as massas com a obra. João Pedro quer ser livre, vive para e pela sua arte, e, como diz, vai atrás do novo, esteja onde estiver.

Já Getúlio precisa pedir ajuda à namorada, Lilian (Julia Ianina), neta de um general (Walmor Chagas) na reserva, para esconder num quartinho em sua mansão dois perseguidos políticos. Este é o teatro da vida real no filme. O casal -- especialmente a garota -- vive dentro de uma encenação para o avô. São poucos dias, mas cada segundo os consome, os transforma como seres humanos e também a sua relação.

Giorgetti, que ainda escreveu o roteiro, tem um olhar delicado e, ao mesmo tempo, bastante realista sobre seus personagens e seu momento histórico -- passando longe da visão de guerrilheiro repleto de glamour, idealizado ou mártir. São pessoas fazendo pequenas coisas dentro de seus cotidianos, tornando-se pequenas heroínas. É nesse sentido que irão perder a ingenuidade e perceber que a luta real é mais complexa e delicada do que aquela professada em discussões.

João Pedro gostaria que sua arte fosse livre, que pudesse fazer teatro a seu modo -- pela paixão, não com uma agenda política tão evidente, enquanto Getúlio é tragado quase que contra sua vontade para ajudar os dois militantes.

O retrato que o filme faz de uma época e de seus integrantes vai se complementando com pequenos personagens que trazem, em seus detalhes, nuances dos dois lados. Otávio Augusto é o tio reacionário que logo na primeira cena expulsa de seu táxi um homem de cabelo comprido e roupas hippies.

Já Carlos Meceni traz, em seu personagem, tanto um olhar mais crítico como um alívio cômico. Ele é o sujeito que chega e se acomoda, fila cigarro, bebida, faz comentários, quer vender notícia proibida mimeografada, mas não vai além disso -- parece mais um relações públicas da militância.

É com esse painel de personagens que Giorgetti olha para o período. Muito ajuda o seu elenco bem dirigido -- especialmente o trio central, Mello, Rodrigues e Ianina. A dimensão humana e palpável que eles dão aos seus personagens é o que traz densidade ao filme. A partir do retrato intimista, Giorgetti é capaz de captar algo bem maior e fazer um filme necessário.

*As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb

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