Alessandra Negrini vive mulher em crise em "O Abismo Prateado"
Inspirado numa proposta do produtor Rodrigo Teixeira, que lhe sugeriu fazer um filme a partir de uma canção de Chico Buarque de Holanda - e que acabou, por opção, sendo "Olhos nos Olhos" -, o diretor Karim Aïnouz realiza mais um filme à flor da pele de sua protagonista em "O Abismo Prateado", estrelado por Alessandra Negrini.
O filme, que teve estreia mundial na Quinzena dos Realizadores de Cannes 2011, com roteiro de Beatriz Bracher (roteirista de "Os Inquilinos"), acompanha o pior dia da vida de Violeta (Alessandra Negrini). Dentista, 40 anos, casada há 14 com Djalma (Otto Jr.) e mãe de um adolescente (João Vitor da Silva), ela acaba de mudar-se para um novo apartamento em Copacabana. Depois de uma tórrida noite de amor com a mulher, ele parte para uma viagem de negócios. E deixa uma mensagem no celular de Violeta, avisando que não vai mais voltar.
Como sempre no cinema de Aïnouz, autor de "Madame Satã" (2002) e "O Céu de Sueli" (2006), a história se materializa no corpo dos personagens, no presente, no aqui e no agora, mais do que em flashbacks, explicações, psicologismos. Uma postura que serve na justa medida a uma crônica da perda, do desespero, do inconformismo, da procura do novo passo a dar numa trajetória que se rompeu.
Como aconteceu com Lázaro Ramos, em "Madame Satã", e Hermila Guedes, em "O Céu de Sueli", Alessandra Negrini abraça o projeto do diretor, expressando com seu rosto e seu corpo sempre em primeiro plano as emoções desencontradas de sua personagem, no auge da crise.
TRAILER DO FILME BRASILEIRO "O ABISMO PRATEADO"
Alessandra, aliás, é uma atriz ousada em suas escolhas no cinema. Famosa pelas novelas globais, ela gosta de arriscar-se, saindo de sua zona de conforto ao estrelar filmes autorais como os de Julio Bressane - ela esteve à frente de dois deles, "Cleópatra" (2007) e "A Erva do Rato" (2008) - e mesmo este "O Abismo Prateado", em que se submete a uma exposição quadro a quadro de uma mulher abandonada.
Muito do filme é não-verbal, o que aumenta a importância da entrega da protagonista. Procurando em vão o marido e explicações para o seu ato, ela anda sem rumo pelas ruas de Copacabana, entra num hotel, numa danceteria e sai de uma rotina perfeitamente controlada. Ferimentos reais, na pele ou na alma, somam-se a este mergulho na dor.
Mas a história não se esgota na perda, procura os acasos. Como o encontro da dentista com uma motorista de táxi falante, vivida por Carla Ribas ("A Casa de Alice"), muito mais à vontade do que Violeta para falar das próprias decepções amorosas.
Mas é particularmente no contato com uma garotinha, Bel (Gabi Pereira), e seu pai, Nassir (Thiago Martins, de "Era uma vez...") que a história se expande. Convivendo com estes outros dois perdidos na noite, Violeta compartilha algo mais. Nada mágico, nada redentor como um filme de Hollywood, mas uma comunicação humana, pequena, delicada, capaz de destravar sua incapacidade de olhar ao redor. São boas as cenas do trio num aeroporto Santos Dumont vazio, com suas luzes artificiais, como um laboratório, um território de transição para o futuro, por mais incerto que seja.
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