Topo

Premiado "Tatuagem" combina amor e contestação em tempos de ditadura

Alysson Oliveira

Do Cineweb*

14/11/2013 14h31

Ao centro do premiado drama "Tatuagem" está um grupo de artistas libertários, pós-hippies na periferia de alguma metrópole do Nordeste, nos anos de 1970. Levando a sério o lema de fazer amor e revolução, eles criam espetáculos debochados e críticos, que, além de divertir, podem levantar uma consciência política-social em plena ditadura militar. Esses são os protagonistas do primeiro filme dirigido por Hilton Lacerda --roteirista de filmes como "Amarelo Manga" e "Árido Movie".

Clécio (Irandhir Santos, como sempre, grande) é uma espécie de líder informal da trupe, que se chama Chão de Estrelas, e conta, entre outros, com a desbocada e debochada travesti Paulete (Rodrigo García, uma bem-vinda revelação), estrela de alguns dos shows.

O filme não se apressa em apresentar o grupo, em estabelecer as relações afetivas entre seus personagens. Clécio, por exemplo, é gay e pai do filho pré-adolescente de Deusa (Sylvia Prado). E quando ele aluga uma grande casa, todos vão morar juntos numa comunidade.

O contraponto desse universo colorido e alegre é o quartel onde está Arlindo, apelidado Fininha (Jesuíta Barbosa) por causa de sua voz, namorado da irmã de Paulete, que mora no interior, próximo à família do soldado. Quando finalmente este visita um dos shows do Chão de Estrelas, se encanta não apenas com a possibilidade de transformação da arte. Quando começa um relacionamento amoroso com Clécio, Fininha não parece ter muitos conflitos e se entrega a essa paixão, apesar da pressão que começa a sofrer no quartel.

Lacerda dirige com sensibilidade e, junto com sua equipe, recria um período conturbado de nossa história, além de inventar shows de beleza visual e contestadora. A transgressão não está apenas no comportamento dos personagens. No momento em que Fininha se entrega de vez ao desbunde com seus novos amigos, o filme aponta a necessidade de novos tempos. O elenco todo está muito bem, e é nítido um trabalho de preparação, convivência e criação conjunta dos personagens.

Como quase todos os estreantes, porém, Lacerda parece ter apego demais ao filme. "Tatuagem" é excessivo em sua narrativa, suas situações. Parece faltar um olhar de fora para limar momentos desnecessários, cuja ausência traria mais força ao filme, que se dilui às vezes na repetição de cenas muito parecidas.

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb