Documentário sobre Salinger faz retrato superficial do escritor americano
A vida do escritor norte-americano J. D. Salinger, nascido Jerome David Salinger em 1919, tem assunto suficiente para alimentar, ao menos, um mês de tabloides. Autor de apenas quatro livros --o mais famoso é "O Apanhador em Campo de Centeio", de 1951-- viveu recluso.
Existem poucas fotos dele e a mitologia que o cerca, na verdade, é mais conhecida do que sua própria obra --como sua obsessão com adolescentes até o suposto fato de que bebia sua própria urina.
O documentário "Memórias de Salinger", de Shane Salerno, que estreia nesta sexta-feira (7) em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, pouco (ou nada) ajuda a iluminar essa figura controvertida da literatura norte-americana.
O diretor é coautor de uma biografia sobre o escritor, que acaba de ser lançada no Brasil, e cuja pesquisa também serviu de base para o filme. Responsável pelo roteiro de filmes como "Alien vs Predador 2" e um possível "Avatar 4" (previsto para 2018), Salerno não parece ter muito tato para um documentário.
O filme --que traz entrevistas de amigos, escritores e outras personalidades-- se contenta em ser superficial e convencional. Os depoimentos não trazem tanta novidade assim, mesmo de pessoas próximas a ele.
Um dos entrevistados, por exemplo, diz que o sonho do autor, quando jovem, era publicar na revista "The New Yorker", pois era o lugar para um escritor começar --uma informação que se encontra facilmente na Internet.
Nem o depoimento da escritora Joyce Maynard, com quem Salinger teve um relacionamento nos anos de 1970, é capaz de trazer fatos que já não foram explorados em seu livro de memórias de 1998.
Em dezembro de 1980, Mark Chapman matou a tiros John Lennon, e carregava consigo uma cópia de "O Apanhador em campo de centeio". Talvez pudesse ser "As vinhas da ira", "Lolita" ou até a Bíblia, mas, claro, criou-se outra mitologia em torno do fato e de outras tentativas de assassinatos, alguns consumados, como o da atriz Rebecca Schaeffer, em 1989. Todos os criminosos dizem que o livro os influenciou.
Salerno dedica um bom segmento ao romance, o que é óbvio. Celebridades contam como o livro os afetou, e adolescentes ao redor do mundo, na rua, em parques ou sala de aula, mostram que o estão lendo.
Quando Salinger se isolou em New Hampshire, em 1953, ele queria paz, distância da badalação e do mundinho intelectual de Nova York --embora o filme faça parecer que esse ato foi uma tentativa de buscar ainda mais fama.
"Memórias de Salinger" é tão equivocado quanto essa ideia que tenta vender. Intrusivo --tal qual a insuportável trilha sonora assinada por Lorne Balfe-- o documentário, que em sua forma é bastante amador, não desperta a curiosidade daqueles que desconhecem o autor, nem ilumina quem já conhece.
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