Topo

"Philomena" abre o baú do passado sombrio da Igreja Católica irlandesa

Neusa Barbosa

Do Cineweb*

13/02/2014 16h22

Baseado numa impressionante história real, ocorrida na Irlanda dos anos 1950, "Philomena", filme do inglês Stephen Frears, acompanha o calvário de Philomena Lee (Judi Dench, indicada ao Oscar de melhor atriz), uma enfermeira aposentada que procura pelo filho, Anthony. O filme estreia nesta sexta-feira (14) nos cinemas.

O menino lhe foi arrancado, ainda pequeno, quando ela vivia internada num convento --destino das moças que, como ela, engravidavam fora do casamento e eram abandonadas pelas famílias. Seus filhos eram encaminhados para adoção, em troca de polpudas doações para o convento, e elas trabalhavam por anos em regime servil, até pagarem sua "dívida" com as freiras que as acolhiam e também as exploravam.

Philomena é ajudada em sua busca pelo jornalista Martin Sixmith (o comediante Steve Coogan, coprodutor e corroteirista do filme), que entra na parada a contragosto. Cínico, ateu e ex-poderoso jornalista político, ele está num momento frágil na vida profissional. Não tem, portanto, nenhuma afinidade evidente com Philomena, que ele conhece já em seus 70 anos, 50 anos depois do sumiço do filho. Uma mulher simples, mas nada simplória, que apesar de tudo que sofreu não perdeu a fé católica.

Por interesse jornalístico, com intenção de vender a impressionante história de Philomena para uma revista, Martin acaba mergulhando numa jornada de detetive, que inclui uma viagem aos Estados Unidos em busca das pistas do pequeno Anthony --que adotou o nome de sua família adotiva.

Narrativa clássica e equilibrada, "Philomena" não perde o foco nem o ritmo. Aliás, é mesmo o melhor de dois mundos, ou seja, um filme com uma grande história, grandes atores (Judi Dench e Steve Coogan, este abandonando sua aura cômica), um esplêndido diretor veterano em grande forma (Stephen Frears, que foi contratado para esta direção), ritmo preciso entre todas as emoções, harmonia nas doses de melodrama e um humor muito adequado se infiltrando em todas as brechas. Por isso mesmo, merece tudo, dos prêmios --está indicado a quatro Oscars, incluindo filme, atriz, roteiro e trilha original-- ao sucesso de bilheteria.

Para completar, "Philomena" traz novamente à tona os crimes cometidos em conventos católicos irlandeses, retirando crianças de suas jovens mães solteiras, obrigadas a trabalhar ali dentro e a entregar seus filhos para adoção, uma prática que vigorou até os anos 1960. O trabalho virtualmente escravo dessas moças, pobres e abandonadas pelas famílias por moralismo, já havia sido abordado anteriormente em 2002, no filme "Em Nome de Deus", de Peter Mullan.

Que a Igreja Católica vive outros tempos fica evidente também pela recente audiência, concedida pelo papa Francisco, à verdadeira Philomena Lee, ao lado de Steve Coogan, em fevereiro. Philomena continua lutando para que outras mulheres tenham acesso aos registros de adoção de seus filhos na Irlanda e possam reencontrá-los.

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb