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"Nostalgia da Luz" recorre à ciência para abordar crimes da ditadura chilena

Neusa Barbosa

Do Cineweb, em São Paulo

25/02/2015 15h35

Conhecido por seus trabalhos engajados, como "Salvador Allende", "O Caso Pinochet" (2000) e sobretudo pela magistral fusão de pesquisa e memórias pessoais de "A Batalha do Chile" (1973-1979), o cineasta chileno Patricio Guzmán oxigena a visão da política, tornando-a ampla o bastante para revelar suas conexões com a ciência no documentário "Nostalgia da Luz", que estreia nesta quinta (26).

O longa foi contemplado com vários prêmios internacionais como o Grande Prêmio da Academia Europeia de Cinema, em 2010; o Prêmio de Melhor Documentário nos festivais de Guadalajara, no México, Yamagata, no Japão, Los Angeles, nos EUA, e Toronto, no Canadá. Em 2010, Patricio Guzmán recebeu no Festival do Rio o prêmio Fipresci pelo conjunto da obra. Seu circuito de lançamento é São Paulo, Porto Alegre, Salvador, Brasília e Curitiba.

Foi no deserto de Atacama que política, arqueologia e astronomia se encontraram. Ali onde, em 1962, astrônomos europeus e norte-americanos instalaram um observatório, pelo céu cristalino e as excepcionais condições de observação das estrelas, e arqueólogos pesquisam os vestígios de vários povos antigos que ali viveram, a ditadura de Augusto Pinochet executou e ocultou os corpos de centenas de prisioneiros políticos.

Estes altos e baixos da história chilena são explorados por este documentário fascinante, impregnado da memória pessoal de Guzmán sempre se colocando como uma testemunha, mas nunca descuidando nem da pesquisa, nem da procura de personagens sólidos, não raro, encantadores.

Como o arqueólogo Lautaro Nuñez, cujo conhecimento do deserto contribuiu para o encontro de ossadas de desaparecidos; o astrônomo Gaspar Galaz e sua visão cósmica do mundo; o arquiteto Miguel Lawner ex-preso político cujos precisos desenhos, feitos de memória quando se exilou na Dinamarca, expuseram ao mundo os detalhes do horror de campos de concentração da ditadura e Victoria Saavedra e Violeta Berrios, a incansável dupla de velhas mulheres que bate as areias de Atacama há cerca de 30 anos, numa procura heroica pelos despojos de seus parentes.

A sintonia entre todos os relatos e aspectos dessa realidade complexa do Chile torna o filme de Guzmán um programa desses que merece o nome de obrigatório. Felizmente, apesar do atraso de cinco anos, o filme chega às telas no Brasil, onde o acerto de contas com a guerra suja de nossa própria ditadura continua aberto e irresolvido.

*As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb