Al Pacino vive ator decadente em "O Último Ato", baseado em Philip Roth
Há mais ou menos uma década —talvez desde sua participação como o personagem central de "O Mercador de Veneza"—, Al Pacino não procurava algo no cinema que se assemelhasse o mínimo que fosse a um desafio.
Desde a participação em um filme de Adam Sandler ("Cada Um Tem a Gêmea Que Merece") a policiais inócuos ("88 Minutos" e "As Duas Faces da Lei", no qual divide cena com Robert DeNiro), o ator que interpretou Michael Corleone na trilogia "O Poderoso Chefão" não saía da zona de conforto.
Em "O Último Ato" —adaptação do romance "A Humilhação", do escritor norte-americano Philip Roth, que estreia nesta quinta (2)—, Pacino mostra do que é capaz, algo que talvez tivéssemos esquecido há algum tempo, e se destaca mais do que o filme, algumas vezes histérico, em outras certeiro.
O tema é um ator envelhecido que está perdendo a razão num mundo governado por e para jovens mentes brilhantes. Os velhos e os fracos não têm vez.
Pacino é Simon Axler, ator veterano que, durante uma apresentação de uma peça de Shakespeare na Broadway, percebe que está perdendo aquilo que o fazia especial, algo maior do que seu talento apenas. A partir de então, o personagem entra numa espiral de insegurança e incerteza, no que considera uma espécie de reta final de sua vida.
Isso não transforma o filme, dirigido por Barry Levinson ("Assédio Sexual", "Mera Coincidência") em algo melancólico, pelo contrário, o tom predominante é de cinismo. Isso talvez porque o próprio diretor, o ator e o autor do romance estejam na mesma faixa etária do personagem, portanto, sabem como encarar essa fase com um humor sarcástico.
Num momento parecido com uma cena de "Birdman", Axler se tranca do lado de fora do teatro onde estará em cena em poucos instantes, e não consegue convencer o segurança de que precisa entrar no palco a todo custo.
Quando, finalmente, consegue entrar, provoca um incidente e acaba num hospital psiquiátrico, onde conhecerá Sybil (Nina Arianda), uma mulher rica e perturbada que pede ajuda para matar o marido que, supostamente, abusou da filha do casal.
A dificuldade que esta mulher tem para distinguir entre realidade e fantasia é um dos temas que permeiam o filme —até mesmo a vida do protagonista, embora num outro nível. Como o projeto de vida dele parece ser trazer a verdade para seus papéis, a linha entre a imaginação e o mundo real é tênue.
Quando Pegeen (Greta Gerwig) entra em cena, a vida de Axler torna-se mais movimentada, mas também mais confusa. Ela é filha de um casal de amigos, Asa (Dan Hedaya) e Carol (Dianne Wiest), com quem ele trabalhou no passado.
A moça, em alguns momentos, é mais complicada do que ele, e parece não pensar duas vezes em usar as pessoas para conseguir seus objetivos ? embora pareça ser uma jovem sem muitas certezas ou convicções.
Ela é lésbica assumida, mas entra num relacionamento doentio com Axler, mesmo mantendo um caso com a reitora da faculdade onde dá aula, Louise (Kyra Sedgwick); e também atraindo a atenção de Prince (Billy Porter), um transexual.
Não é difícil entender a atração que todos sentem pela moça, apesar do seu irritante egocentrismo. Ela transmite uma aura de poder que fascina ? mesmo sabendo que, mais cedo ou mais tarde, irá se livrar de quem seduziu, quando não lhe for mais proveitoso.
É curiosa a visão do filme sobre as mulheres —materializada nas personagens Nina e Peegan—, nenhuma muito positiva ou minimamente simpática. A chave cômica atenua, mas não apaga, a ameaça de destruição que elas representam para o protagonista.
Em seus últimos romances, publicados entre 2006 e 2010, o autor Philip Roth mostra-se preocupado com momentos limítrofes da existência, criando narrativas que caminham para uma conclusão, vidas que se aproximam da morte, e com isso, todo o peso de meditação e reflexão que trazem junto.
A transposição de "A Humilhação" para o cinema perde um pouco dos questionamentos e lamentos do livro mas, ainda assim, mantém-se fiel ao espírito do escritor.
Assista ao trailer legendado de "O Último Ato"
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