Drama do roteiro prevalece sobre acontecimentos reais em "Os 33"
Há certa expectativa sobre o filme "Os 33", da mexicana Patricia Riggen ("Sob a Mesma Lua"). Baseado no relato dos 33 mineiros soterrados por 69 dias em uma mina em São José, no Chile, que atraiu os olhos da mídia mundial para o deserto do Atacama por semanas, a produção mostra os suplícios dessas pessoas, seus parentes e as desesperadas tentativas de salvá-los.
Um drama humano visceral, que dificilmente passaria despercebido pelos estúdios norte-americanos, ávidos para comprar os direitos de roteirizar o livro "Deep Down Dark" (2014), escrito pelo jornalista dos EUA Hector Tobar que, por sua vez, negociou os direitos do livro ainda sem saber se os mineradores seriam resgatados. Uma situação que mostra a crueldade não apenas dos infortúnios de quem estava dentro, mas também do oportunismo de quem estava do lado de fora.
Das expectativas, portanto, a principal é a de saber como sobreviveram os 33 mineradores, na versão para o cinema e livro, liderados por Mario Sepúlveda (Antonio Banderas). E, nesse ponto, esperava-se mais do roteiro do quarteto Mikko Alanne, Craig Borten, Jose Rivera e Michael Thomas. Toda a tensão inerente à tragédia se define em um par de cenas, com pouco vigor.
Isso porque a narrativa se divide em três núcleos: o dos mineradores (mal explorado), o dos familiares, liderados por María Segovia (Juliette Binoche, em uma atuação chileníssima), e da estrutura do Estado que tenta resolver o assunto, na pele do ministro Laurence Golborne (Rodrigo Santoro).
Nenhum dos conflitos se resolve, como produção e técnica, recaindo bem mais no sentimentalismo gratuito. Há um desejo, quase solene, de fazer o público chorar (a incessante trilha sonora e subterfúgios narrativos o provam), mais do que demonstrar uma real condição trazida por fatos, que por si sós, já carregariam o filme com um forte apelo emocional.
Outro ponto que pode explicar, ainda que não totalmente, o artificialismo é o fato de o filme ser todo falado em inglês, com poucos chilenos, estes colocados em terceiro plano. Como é o caso da excelente Paulina Garcia, vencedora do Urso de Prata no Festival de Berlim, por Gloria, em 2013, e aqui relegada a um personagem secundária que nem nome tem.
Mais velho do que as próprias Cordilheiras do Andes, o tino comercial da indústria faz com que o grosso das produções use atores com mais apelo de consumo e atração para os papéis. Mas o fato de fazer Antonio Banderas, Lou Diamond Phillips, Bob Gunton e Juliette Binoche pronunciarem um "espanglês" beira o desatino.
Muito se falou, no Chile, sobre uma possível vertente política do filme, propagandística até, pelo fato de um dos investidores e produtor ser Carlos Eugenio Lavín (suspeito e preso por sonegação no país). Entretanto, a diretora Patricia Riggen passa ao largo de toda essa questão política, bastante ausente da história.
Extraindo o talento do elenco, muito pouco sobra para o filme, além do aspecto piegas. Como a cena da Santa Ceia, em que os mineiros alucinam em seu próprio sofrimento, esperando serem salvos, sem pecar, por um ato de Deus. "Deus ganhou", disse Mario Sepúlveda, ao ser resgatado. Mas esse não é o discurso predominante no filme, que na verdade é bem humano.
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