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Ficha completa do filme

Animação, Fantasia

Fantasia (1940)

Antonio Farinaci

Antonio Farinaci

Colaboração para o UOL 21/01/2011
Nota: 5

Quando foi lançado em 1940, o clássico ''Fantasia'', dos estúdios Disney, deveria ser o primeiro de uma série de filmes a juntar animações com música clássica, algo que o estúdio, na época, chamava de ''uma nova forma de entretenimento''.

''Fantasia'' é notável por mais de um motivo. Formado por segmentos independentes, o filme reúne algumas das melhores animações já produzidas pela Disney, além de ter lançado um sistema de som próprio, o Fantasound, gérmen do atual sistema "surround", que distribui canais ao redor da plateia, para maior realismo acústico.

Nascido de um encontro de Walt Disney com o maestro inglês Leopold Stokowski, quando este era regente da Filarmônica da Filadélfia, o filme, no entanto, não emplacou na bilheteria, e o projeto foi abandonado. Anos depois da estreia, Disney teria declarado: "fico feliz de que tenhamos produzido 'Fantasia', e não me arrependo, mas hoje não sei se poderíamos tê-la feito".

Levou quase 60 anos para que o estúdio retomasse a ideia, para lançar "Fantasia 2000", uma série de animações concebidas e agrupadas nos mesmos moldes do filme original. Ambas foram relançadas agora em DVD, numa edição comemorativa dupla.

O forte dos estúdios Disney sempre foi a personificação de animais e objetos inanimados. Isso compõe o que há de melhor nos dois filmes. Os segmentos de "Fantasia" dedicados ao "Aprendiz de Feiticeiro", protagonizado por Mickey Mouse; a "Dança das Horas", com a surpreendente coreografia de hipopótamos, elefantes e jacarés, e o "Quebra Nozes", com a ciranda dos cogumelos, são clássicos da Disney.

Em "Fantasia 2000", o apanhado geral de animações está longe de ser tão memorável, mesmo assim, destacam-se os flamingos que jogam ioiô, ao som do "Carnaval dos Animais", e, com alguma boa vontade, o trecho protagonizado pelo Pato Donald.

O conjunto de animações apresentado nos dois filmes é testemunho também de que nesses 60 anos que os separam, a Disney não saiu do lugar no que diz respeito a seu calcanhar de aquiles: as animações abstratas. Tanto em "Fantasia" original como na versão "2000", esse é o pior do que o estúdio tem a oferecer.

Para dirigir as sequências "abstratas" de "Fantasia" - a "Tocata e Fuga em ré menor" de Bach e o trecho da "Trilha Sonora" -, Disney chegou a contratar o artista alemão Oskar Fischinger, conhecido por seu suas animações experimentais.

Fischinger, no entanto, abandonou os trabalhos, insatisfeito com o realismo figurativo que o patrão impunha às animações. No segmento da "Tocata", pode-se de fato perceber uma "briga" entre composições puramente geométricas ou de texturas (ondulações estilizadas, manchas, campos de cor) com elementos figurativos que parecem ter sido sobrepostos (nuvens, o sol nascente, partes de instrumentos).

O encadeamento dos segmentos animados de "Fantasia" padece também de falta de ritmo. Disney convidou o crítico musical e compositor Deems Taylor para ser o mestre de cerimônias que introduz cada trecho com uma explicação sobre a animação e a obra que será executada. Taylor era o responsável por fazer comentários durante as transmissões de rádio da Filarmônica de Nova York, e era conhecido por seu texto leve e bem humorado. Em ''Fantasia'', no entanto, ele errou na mão. Algumas de suas análises musicais são francamente antiquadas, e o que ele diz sobre as animações chega a ser um ''spoiler''.

Em ''Fantasia 2000'', a figura de um único mestre de cerimônias foi substituída pela de vários artistas (Steve Martin, Bette Middler e Quincy Jones entre eles), o que dá mais dinâmica ao filme.

No geral, no entanto, a estrutura foi mantida. Ambos têm uma animação abstrata no começo, um balé de animais, um trecho protagonizado por um personagem clássico da Disney, uma peça de um compositor do século 20 e um personagem assustador no segmento final, além de outros paralelismos. Postos assim, lado a lado, a superioridade de ''Fantasia'' (1940) é nítida.

A edição em DVD duplo nacional, lançada em 2010, é modesta nos extras. O disco de ''Fantasia'' traz os comentários em off do escritor e radialista Brian Sibley e um documentário de 4 minutos sobre o Walt Disney Family Museum, com depoimentos da filha e do neto de Disney. O disco de ''Fantasia 2000'' traz apenas o documentário ''Musicana'', sobre um dos projetos de continuação de ''Fantasia'', abortado por razões comerciais. A versão americana do DVD traz também a animação ''Destino'', concebida pelos estúdios Disney em colaboração com o pintor espanhol Salvador Dalí e finalizada apenas em 2003. Para quem quiser ficar mesmo por dentro do universo de ''Fantasia'', vale a pena ir atrás do DVD ''Fantasia Legacy'', lançado em 2000.

O lançamento do DVD duplo chega acompanhado pela trilha sonora de ''Fantasia 2000''. A trilha segue a onda do filme e traz também uma reprise do ''Aprendiz de Feiticeiro'' (de Paul Dukas), além da suíte ''Pássaro de Fogo'' (de Stravinsky), o movimento final de ''O Carnaval dos Animais'' (de Saint-Saëns) e outros ''hits'' do repertório clássico, como o primeiro movimento da ''Sinfonia No 5'' (de Beethoven) e marchas de ''Pompa e Circunstância'' (de Elgar). Desta vez, a regência é de James Levine, com a Sinfônica de Chicago (à exceção do ''Aprendiz'', que é da versão original, com Stokowski e a Filarmônica da Filadélfia).

A comparação com o repertório do primeiro ''Fantasia'' é também inevitável e desfavorável à versão ''2000''. Em 1940, a trilha do filme era mais ousada para a época: Stravinsky na época era vivo e representava a música contemporânea de seu tempo. A nova trilha não sai do óbvio.

10 curiosidades sobre a série ''Fantasia''

- O primeiro segmento de ''Fantasia'' a ser produzido foi ''O Aprendiz de Feiticeiro''. Disney pretendia utilizá-lo como um veículo para reacender a popularidade de Mickey, como uma animação independente, da série ''Silly Symphony''. Depois decidiu dar-lhe uma ''embalagem'' mais grandiosa, e assim nasceu ''Fantasia''.

- O sistema de som Fantasound, desenvolvido para a primeira versão de ''Fantasia'' (1940), exigia que os cinemas tivessem de 30 a 80 caixas de som posicionadas estrategicamente. O sistema veio a dar no ''surround sound'' utilizado atualmente.

- Walt Disney cortou na edição um trecho da ''Pastoral'' de Beethoven, no segmento dos centauros, em ''Fantasia''. Ele quis também cortar o final da ''Tocata e Fuga em ré menor'' de Bach, mas Stokowski o teria impedido, dizendo: ''Só por cima do meu cadáver''...

- Para a reedição do filme em DVD, alguns trechos do segmento dos centauros foi reenquadrado, para deixar de fora uma ''centaurete'' negra que aparecia como uma espécie de criada das outras personagens.

- Um segmento em que duas garças voam ao luar, ao som de ''Clair de Lune'' (de Claude Debussy), foi deixado de fora de ''Fantasia'', para que o filme não ficasse longo demais. O trecho foi restaurado em 1996 e lançado em 2000, no DVD "Fantasia Legacy".

- O segmento de ''Fantasia'' que mostra o surgimento da vida na Terra, ao som de ''Sagração da Primavera'' (de Igor Stravinsky), ilustra desde os primórdios do universo até o desaparecimento dos dinossauros. Disney não quis mostrar o surgimento do homem e a sua evolução para não ofender os criacionistas.

- Único compositor vivo a ter uma música utilizada em ''Fantasia'', Igor Stravinsky teve reações ambíguas ao filme. Primeiro, declarou ter gostado. Depois, chamou-o de ''imbecilidade irresistível''. Mais tarde, liberou mais três de seus trabalhos para a Disney: ''Fogos de Artifício'', ''A Raposa'' e ''Pássaro de Fogo'' (utilizado no último segmento de ''Fantasia 2000'').

- ''Cavalgada das Valquírias'' (de Richard Wagner) e outras músicas foram consideradas para ''Fantasia'', mas ficaram apenas em esboços: ''Aventuras num Carrinho de Bebê'' (de John Alden Carpenter), ''O Cisne de Tuonela'' (de Jean Sibelius), ''Convite à Dança'' (de Carl Maria von Weber) e ''O Voo da Abelha'' (de Rimsky-Korsakov).

- ''Musicana'', sequência nunca concluída de ''Fantasia'', incluiria músicas com o trompetista Louis Armstrong, a cantora Ella Fitzgerald e a peruana Yma Sumac, conhecida por sua incrível extensão vocal de cinco oitavas.

- A animação do segmento ao som de ''Rhapsody in Blue'' (de George Gershwin), em ''Fantasia 2000'', é inspirada nos traços do desenhista Al Hirschfeld, famoso ilustrador do jornal ''The New York Times''.

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