UOL Entretenimento Cinema

Ficha completa do filme

Drama

Queimada! (1968)

Rubens Ewald Filho

Rubens Ewald Filho

Especial para o UOL Cinema
Nota: 5
Queimada!

Realizado pelo mesmo diretor de "A Batalha de Argel", "Queimada" foi o único filme de Pontecorvo rodado em inglês, por causa da presença de Brando, com quem ele teve batalhas homéricas. Originalmente, o filme iria se chamar "Quemada", e o colonizador seria espanhol, em uma ilha imaginária das Antilhas. Optaram pelo português porque causava menos polêmica e porque os espanhóis ameaçaram proibir todos os filmes do produtor Alberto Grimaldi. Isso foi mudado durante a dublagem, em que se falou um português abrasileirado. Mas trouxe dois erros históricos: Portugal não colonizou nada nas Antilhas e, num diálogo, Brando explicou erroneamente: "Você sabe que Portugal e Inglaterra são inimigos tradicionais" (isso acontecia com a Espanha, Portugal sempre foi aliado da Inglaterra).

Rodado com grande dificuldade na Colômbia, o filme teve num dos papéis centrais Evaristo Marquez, totalmente inexperiente. A fita teve problemas com a censura brasileira, que a recolheu mesmo depois de ela já ter saído de cartaz. A cópia americana do filme tem 112 minutos. Ed Harris interpretou o mesmo personagem que Brando, sir William Walker, na fita "Walker" (1988, de Alex Cox). Quando estreou no Brasil em 1971, "Queimada" nos pareceu o filme que todo cineasta brasileiro do Cinema Novo sonhou fazer, mas nunca conseguiu: tratar um tema político de maneira clara, objetiva e artística. Não que seja um filme imparcial, ele tem uma tese a provar e faz isso muito bem, é engajado e polêmico.

Esta é uma parábola política sobre a penetração econômica dos EUA nos países subdesenvolvidos. Para tornar as coisa mais alegóricas. O agente é britânico (a potência colonialista e imperialista da época) e vai a Queimada para promover uma revolta. Quando chega à ilha, descobre que não há líderes e precisa encontrar alguém com essas qualidades. Essa pessoa acaba sendo um estivador (Evaristo), que se torna herói e líder rebelde. Mas, quando a revolução vence, patrocinada por uma companhia inglesa que explora o monopólio de cana-de-açúcar, este, despreparado para governar, afasta-se.

Nove anos depois, Brando volta à ilha, e Evaristo tornou-se o líder guerrilheiro lutando contra o governo, já uma ditadura. E Brando, que tinha inventado aquele rebelde, agora precisa destruí-lo. O meio de fazer isso é queimar a ilha até expulsá-lo da floresta. E, quando finalmente oferece-lhe uma alternativa - a morte ou a liberdade -, ele prefere morrer. Assim, nunca mais seu nome deixará de existir, nascerá sua lenda, bandeira para os rebeldes que o substituírem. Queimada termina com o olhar revoltado, com um grito abafado. Leva à reflexão, não à ação (são claras as referências a Cuba; os guerrilheiros se refugiam numa montanha chamada Sierra Madre).

Artisticamente, tem dois pontos altos: a direção de arte de Piero Gherardi, o mesmo dos filmes de Fellini, infelizmente morto por causa de uma doença adquirida nas locações, e a música de Morricone, excepcional no cortejo de chegada de Evaristo à capital. Por isso o filme é muito bonito, praticamente perfeito. A fotografia, porém, é menos feliz, com muita câmera na mão, muita teleobjetiva. Brando na época já estava ficando gordo, barrigudo e careca, mas tem uma interpretação totalmente carismática. Evaristo, que nunca sequer tinha visto um filme, tem a naturalidade do personagem. O filme, que não perdeu sua atualidade, continua a ser uma lição de cinema político. O diretor Pontecorvo (1919-2006), no entanto, nunca mais chegou a fazer outro grande filme.

Compartilhe:

    Siga UOL Cinema

    Sites e Revistas

    Arquivo