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Ficha completa do filme

Musical

Meias de Seda (1957)

Resenha por Rubens Ewald Filho

Rubens Ewald Filho

Especial para o UOL Cinema 01/01/2003
Nota 4

É Cyd Charisse quem apresenta o making of legendado - ela afirma ser seu papel preferido -, aqui chamado de "Cole Porter em Hollywood: Satin and Silk", com depoimentos de Andre Previn e Janis Paige. Traz ainda trailer, os curtas da Metro, a overture do "The Poet and the Peasant" (tocada por orquestra sinfônica e fotografada em CinemaScope, com som estereofônico) e uma surpresa: um delicioso e histórico curta "Paree, Paree", com Bob Hope e Dorothy Stone, Billie Leonard, de 1934, de Roy Mack, com canções de Cole Porter (originalmente do musical "Fifty Million Frenchmen", incluindo "You Do Something to Me", "Find me a Primitive Man", "You've Gotta that Thing").

Se Cole Porter não for o maior compositor americano, fica perto, numa trilogia com Gerswhin e Berlin. Sem dúvida, era o mais sofisticado, o mais completo (escrevia letra e música, fato raro no ramo) e não-judeu (como 90% deles, o que permite levantar a teoria - sem qualquer preconceito - de que a música popular norte-americana é basicamente judia).

Pertencia a outra minoria ativa, era homossexual, mas também casado e, segundo todos os relatos, muito feliz. Tinha com a esposa um bonito relacionamento de amizade. Sem nunca terem se divorciado, compôs algumas das mais inteligentes e belas canções do século 20, no entanto, passou quase 30 anos de sua vida aleijado, sofrendo terríveis dores.

Como muitos outros gênios, nunca ganhou um Oscar (em 1956, escreveu "True Love", para ver se levava o prêmio, mas deram a estatueta para a bem mais infantil "Que Sera, Sera", que até sua intérprete, Doris Day odiava). E sofreu a indignidade de uma biografia cinematográfica totalmente fictícia ("Night and Day"/"Canção Inesquecível", 1946, de Michael Curtiz, onde o casal era vivido por Cary Grant e Alexis Smith).

Nada disso, porém, explica porque a obra de Cole Porter continua tão atual, continuamente regravada e admirada. Suponho que a explicação seja simples: o que é bom é imortal, não envelhece. Mesmo numa época como a nossa, onde se valoriza o vulgar e a baixaria, Porter ainda nos recorda um mundo elegante, charmoso, onde se bebia champanhe, se vestia black-tie para jantar, a conversação ainda era uma arte, ironia e malícia, ousadias que poucos conseguiam utilizar.

Mesmo sua biografia é muito curiosa. Nascido em 9 de junho de 1892, numa cidade chamada Peru (não o país, mas num lugar em Indiana), compôs sua primeira canção aos 9 anos. O pai era farmacêutico, mas o avô materno era um milionário industrial, O. J. Cole. Depois de freqüentar as universidades de Yale e fazer Direito em Harvard, chegou a se alistar na Legião Estrangeira Francesa em 1916 (dizem que para escapar de lutar na Primeira Guerra Mundial).

Dois anos depois, teve seu primeiro sucesso na Broadway ("Very Good Eddie") e descobriu sua verdadeira vocação: ser um bon vivant. Viajou pela Riviera, cultivou a amizade dos ricos, escreveu seus sucessos e foi muito feliz até 1937, quando sofreu um acidente de equitação (caiu de um cavalo que esmigalhou sua perna, relutou muitos anos, sofrendo até sua amputação, em 1958). Apesar da dor, continuou como se nada houvesse, compondo para Hollywood e o teatro.

A coleção de DVDs que está sendo lançado pela Warner reúne filmes que foram originalmente de sua contribuição para os estúdios da Metro. Houve antes encontros também memoráveis com a dupla Astaire-Rogers em "Alegre Divorciada", em 1934, a dançarina Eleanor Powell ("Nascida para Dançar", 1936, "Rosalie", 1937). A coleção deixa de lado, porém, uma de suas obras mais radicais, "O Pirata" ("The Pirate", 1948), de Vincente Minnelli, com Judy Garland e Gene Kelly.

Uma fita toda estilizada, que foi enorme fracasso de bilheteria e hoje é considerada uma obra-prima ousada e inovadora (a canção mais famosa é "Be a Clown"; todas foram compostas especialmente para a tela). Por que não está na coleção que traz seus filmes posteriores na mesma MGM? Também ficou de fora no Brasil "Broadway Melody", de 1940, de Norman Taurog, porque era em preto e branco.

Felizmente, não há por que reclamar. "Meias de Seda" é uma refilmagem, desta vez de "Ninotchka", de Lubitsch, com Greta Garbo e Melvyn Douglas, em 1939. Foi a última montagem teatral na Broadway, em 1955, com Don Ameche e Hildegarde Neff. Ou seja, uma sátira mostrando como os encantos de Paris e do capitalismo derrubam as crenças comunistas da heroína. Aqui não se fala em obra-prima, mas qualquer filme que reúna Fred Astaire e Cyd Charisse (ela no auge do esplendor, das pernas mais belas do cinema) está longe de ser descartável.

Porter já não tinha a mesma inspiração (pontos baixos são uma sátira ao CinemaScope e som estereofônico), mas não deixa de ser curioso ver Peter Lorre cantando e dançando. Cyd e suas pernas excepcionais (dublada nas canções por India Adams) e a classe de Astaire são, porém, dignos do melhor Porter. No making of, ela chama a atenção para a corista que se tornaria afilhada de Astaire (Barrie Chase) e para os problemas do diretor em trabalhar no CinemaScope (widescreen) e também com os censores (que o achavam ousado).

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