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Ficha completa do filme

Comédia

A Comilança (1973)

Resenha por Rubens Ewald Filho

Rubens Ewald Filho

Especial para o UOL Cinema 01/01/2003
Nota 4

Proibido no Brasil e liberado pela Censura apenas em 1979. Pode ser que "A Comilança" seja mesmo uma visão apocalíptica da sociedade de consumo ou simplesmente a história de quatro gourmets que se isolam para um "seminário gastronômico". O fato é que o filme de Marco Ferreri, que foi no Brasil a primeira liberação importante da Censura na sua fase de abertura, seis anos depois de ter escandalizado o Festival de Cannes e provocado a ira da crítica francesa, ainda é um verdadeiro soco no estômago. Ou purgante.

Alguns irão passar mal ao assisti-lo. Os estetas vão reclamar da cenas de aerofagia (na época fora do comum, hoje banais) e há os que simplesmente vão ficar chocados com a mistura profana de erotismo com escatologia. Mas não há como não reconhecer que a fórmula é explosiva.

Prolonga-se a idéia de "O Discreto Charme da Burguesia" de Buñuel, levando o prazer gastronômico às ultimas conseqüências. Só que na verdade o filme pretende ser mais filosófico que metafísico. A decisão do suicídio dos quatro protagonistas não é consciente, afirma Ferreri, a auto-destruição nasce como conseqüência do interminável banquete.

Realizado apenas com um esboço de roteiro e muita improvisação, com uma ambientação propositalmente francesa (afinal não é lá o país de cem mil restaurantes?) a fita está longe de ser perfeita. Com duas horas e treze minutos, é longa, repetitiva e se ressente da falta de um clímax. Fica com a impressão de que ela na verdade, foi a preparação para mais tarde Pasolini levar a proposta adiante, com seu "Saló ou Os 120 dias de Sodoma".

Ferreri não é tampouco um revolucionário. Ao contrário, ele diz fazer cinema burguês e exprime sua visão pessimista do mundo, procurando constatar os pontos aberrantes de nossa sociedade. Pena que suas idéias se mostrem por vezes herméticas e nem sempre a alegoria seja muito feliz.

Se os personagens funcionam como símbolos não é fácil identificá-los. Muitos vão se perguntar qual é a função dos cachorros, do emissário com a lanterna japonesa, até do próprio Jardim do Poeta. Acontece que Ferreri não fornece dados, nem explicações e parâmetros para que possamos entendê-los. Ao contrário, quer que o espectador faça uma leitura apenas literal, compreendendo apenas o que está vendo. E o que se vê é tão forte que não se pode nem sequer resumir aqui.

Nem tanto as cenas de sexo, todas realmente importantes dentro do contexto, mas principalmente as mortes dos heróis, que são das mais chocantes, em particular a de Tognazzi e Piccoli (que literalmente explodem). Mas com um elenco absolutamente magistral (e a gorda Andréa está sublime), "A Comilança" é um prato forte que não vai deixar ninguém indiferente. É o retrato cru e ousado de um sistema de vida, um grito desesperado e aterrador da pobre condição humana. A versão de tela inteira prejudica os enquadramentos e o resultado, mas a cópia é acima da média.

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