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"Quis fazer este filme por causa de tudo que testemunhei", diz Angelina sobre 1ª direção

Angelina estreia como roteirista e diretora em "In the Land of Blood and Honey" - Dan Kitwood/AFP
Angelina estreia como roteirista e diretora em "In the Land of Blood and Honey" Imagem: Dan Kitwood/AFP

Ana Maria Bahiana

Do UOL, em Los Angeles (EUA)

04/12/2012 05h00

Angelina Jolie tinha 17 anos quando a guerra na Bósnia começou, em 1992. Anos depois, em seu posto de embaixatriz das Nações Unidas, a atriz teve a oportunidade de viajar muitas vezes pelo país e conversar com sobreviventes do conflito e diplomatas que trabalharam diretamente para a resolução das hostilidades.

O resultado foi "In the Land of Blood and Honey", um roteiro escrito de modo quase catártico, sobre um casal, ele sérvio, ela bósnia, separado pela guerra, que se reencontra em circunstâncias dramáticas no auge do conflito, quando o estupro e o genocídio eram constantes. "Blood and Honey" não é apenas o primeiro trabalho de Jolie como roteirsta – também é sua estreia na direção.

Angelina recebeu o UOL em uma tarde de outono em Beverly Hills, resplandescente num vestido de renda azul marinho Dolce & Gabbana. Confira os principais trechos da entrevista:

UOL: O que motivou você a fazer este filme?
Angelina Jolie:
Eu quis fazer este filme por causa de tudo o que testemunhei nestes últimos 10 anos viajando por vários cantos do mundo, especialmente a partir do que comecei a ler e pesquisar sobre a antiga Iugoslávia. Quanto mais eu aprendia sobre o assunto, mais eu me emocionava e mais tinha vergonha de não saber quase nada. Como o ser humano pode ser tão primitivo, como pode haver tanta violência contra as mulheres, como a comunidade internacional pode virar as costas e permitir esse tipo de atrocidade? Não existe uma resposta lógica. Não faz sentido. Eu pelo menos tentei analisar a questão do ponto de vista humano, neste filme, mostrar como as pessoas vão se entortando ao viver numa situação dessas.

Você sempre pensou em ser diretora?
Nunca pensei em ser diretora. Na verdade, eu nem pensava que minhas ideias poderiam se transformar num filme enquanto escrevia o roteiro. Achei que seria uma meditação privada, um roteiro que eu ia pôr de lado e ninguém nunca mais veria. Foi a reação das pessoas do lugar, a tremenda boa vontade, o carinho com que receberam o projeto que me encorajou a ir adiante. Era uma história importante e eu devia ir em frente.

Como você se preparou para o trabalho de direção?
Pensei nos diretores com quem trabalhei e que foram as melhores experiências para mim. Pessoas como Clint Eastwood, para quem os sets são como uma casa e a equipe, uma familia. Ele trabalha apenas com pessoas ótimas. Não há egos, todos se respeitam, todos trabalham juntos. É claro que é preciso talento, mas igualmente importante é que, no fundo, você seja uma boa pessoa. Entre muitas outras coisas, isso faz sentido do ponto econômico, porque tudo é feito de forma eficiente, mais rápido e gastando menos. Eu também pensei muito em Michael Winterbottom, no trabalho que fiz com ele em "O Preço da Coragem", o modo como ele trabalha com os atores, fazendo tudo parecer o mais verdadeiro possível, sem deixar que a câmera atrapalhe.

Como diretora estreante lidando com uma questão extremamente complexa e trabalhando no lugar onde os acontecimentos se passaram, o que foi mais desafiador para você?
A parte mais difícil foi exatamente aquilo que tornava o projeto tão especial e importante para mim: o fato de eu ter reunido pessoas de todos os lados do conflito, no lugar onde os fatos haviam se passado, e estava pedindo para que elas revivessem e recriassem aquelas brutalidades, que fossem cruéis uns com os outros. Eu estava especialmente apreensiva com a cena do estupro, esperando uma manhã excepcionalmente difícil. Não posso dizer que foi fácil, mas vou muito melhor do que eu esperava. Foi comovente, quando eu gritei “corta”, ver os atores que faziam os papel dos soldados pegando as roupas das mulheres com todo cuidado, vestindo-as, pedindo desculpas…

Quando você ainda estava filmando houve um movimento contra seu projeto, na Bósnia, exatamente por você ficar no relacionamento entre uma vítima de estupro e seu algoz. Como você conseguiu superar essa oposição?
É claro que eu tinha consciência de que o filme tocava em temas extremaemente sensíveis. A guerra terminou 15 anos atrás e é claro que as sensibilidades ainda estão à flor da pele. Compreendo perfeitamente o nervosismo das pessoas. Mas ao mesmo tempo é frustrante quando as pessoas te julgam sem conhecer o trabalho ou suas intenções. Tudo o que você pode fazer é saber que seu coração está no lugar certo e seguir em frente. Assim que eu pude, mostrei o filme para um grupo de apoio às vítimas da guerra. E imediatamente todos compreenderam o que eu me propus a fazer.