Topo

Com ator de "Zorra Total", "O Casamento de Gorete" apresenta dramas de uma travesti

Ronaldo Pelli

Do UOL, em Barra do Piraí (RJ)

28/05/2013 05h00

A pequena cidade de Barra do Piraí, no sul fluminense, recebeu neste domingo (26) uma parada gay. Não era uma comemoração antecipada do Dia do Orgulho LGBT, mas sim as últimas cenas do filme “O Casamento de Gorete”, rodado na cidade durante cinco semanas e previsto para estrear em outubro.

“O Casamento de Gorete”, como o nome sugere, narra a história da radialista também travesti interpretada pelo ator Rodrigo Sant’Anna. Ela recebe uma herança do pai (interpretado por Ricardo Blat), com quem não falava desde criança, mas ele exige como condição que ela se case. Gorete, então, cria uma série de provas e competições para escolher o seu príncipe encantado, mas acaba reencontrando, no percurso, a grande paixão de infância, Bonitão, vivido pelo ator Carlos Bonow.

Produtora do filme, Letícia Spiller diz que quis lutar contra o preconceito

  • Antonio Scorza/UOL

    Além de produzir "O Casamento de Gorete", a atriz Letícia Spiller faz uma pequena participação como a drag queen Rochanna. "Eu não me considero musa dos gays, mas fiz personagens que criaram uma identificação com o público LGBT, como a Babalu", contou Letícia ao UOL, se referindo à personagem da novela "Quatro por Quatro" (1994-95).
    "É uma comédia para toda a família, com bastante humor. Mas é um filme engraçado de forma profunda", tenta explicar a atriz. O filme, segundo ela, também usa elementos de gêneros sérios, como o melodrama, para logo depois fazer comédia novamente.

No último dia de filmagens, o diretor Paulo Vespúcio contou que a produção do longa demorou oito anos até se concretizar, e que sua inspiração para a Gorete foi um radialista de Rio Branco, no Acre, chamado David Medeiros, que inventou uma personagem com este nome.

“Eu vejo esse preconceito desde o início do filme. Quando comecei a pensar em fazê-lo, o então secretário de cultura lá do Acre disse que não iria ajudar na produção porque era contra a origem da ideia”, explica o cineasta, em referência à personagem criada por Medeiros. O diretor estava em Rio Branco para gravar “Amazônia, de Galvez a Chico Mendes”, da TV Globo, em 2005, quando ouviu Medeiros, ou melhor Gorete, no rádio de um táxi.

O humorista David Medeiros, que também faz uma participação no longa, explicou que no dia que criou Gorete, os telefones da rádio não pararam de tocar. “Eu apresento até hoje as paradas gays de Rio Branco”, conta orgulhoso David, que foi depois descoberto por Tom Cavalcante.

No domingo, foram rodadas as cenas da parte final da produção. Em uma delas, Rodrigo Sant’Anna, sempre vestido como Gorete, de noiva, com um vestido longo, pesado, e carregado de maquiagem, coloca-se em cima de um pequeno carro alegórico em formato de bolo nupcial, ao lado de Bonitão.

Antes do grito de “ação” do diretor, Rodrigo, como pessoa física, agradece à cidade que os acolheu para logo se transformar em Gorete. Ela comanda a pequena multidão que se aglomera na ponte sobre o rio Paraíba do Sul. O ator, famoso na TV por personagens como Valéria Vasques e Adelaide, ambos do humorístico “Zorra Total”, da Globo, faz piada, solta bordões, entretém e comanda o público, que aguardou pacientemente os preparativos técnicos.

Já na segunda cena, sem a participação direta do público, Gorete, Bonitão e todo o elenco, incluindo Letícia Spiller totalmente montada de Rochanna, estão sobre um trio elétrico, desfilando pela ponte metálica da cidade fictícia de Pau Torto.

“Gorete tem mais drama que todos os meus outros personagens”, diz, sem titubear, um cansado e sério Rodrigo, durante a pausa do almoço, já depois das 16h. “Não que os meus outros personagens não tenham drama, mas que dessa vez é mais claro para os espectadores.”

Ele define Gorete como uma figura que já nasceu com uma essência feminina num corpo de homem. Ela usa o exagero – seja na maquiagem, nas palavras ou nas ações – como arma de defesa contra hostilidades, explica Rodrigo. “Temos que parar de segmentar, de dividir”, afirma o ator já durante o almoço, fazendo coro com os outros membros da produção: “Esse é um filme sobre o fim dos preconceitos”.