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Mostra em homenagem a Eduardo Coutinho percorre período mais rico de sua carreira

Cena de "Cabra Marcado para Morrer" (1984), de Eduardo Coutinho - Divulgação
Cena de "Cabra Marcado para Morrer" (1984), de Eduardo Coutinho Imagem: Divulgação

Sérgio Alpendre

Do UOL, em São Paulo

24/03/2012 07h00

A edição de 2012 do "É Tudo Verdade" traz uma retrospectiva diferente, com um dos diretores mais celebrados do cinema brasileiro: Eduardo Coutinho. A mostra revela o caminho percorrido entre o início das filmagens e a finalização de sua obra maior: "Cabra Marcado para Morrer" (1984). Originalmente uma ficção interrompida pelo governo militar e transformada em documentário anos depois, "Cabra" entrou para a história como um dos melhores documentários brasileiros.

Além desse filme emblemático, estão na programação quatro médias-metragens realizados nos anos 1970, dentro da primeira fase (mais independente) do programa "Globo Repórter". Os títulos são os que o próprio Coutinho considera o que de melhor ele produziu nesse período: "Seis Dias de Ouricuri" (1976), "O Pistoleiro da Serra Talhada" (1977), "Theodorico, O Imperador do Sertão" (1978) e "Exu, Uma Tragédia Sertaneja" (1979). Ele também já declarou em entrevistas que foi nesse período que ele se formou como cineasta do documentário.

Completando a curiosa retrospectiva, há "Coutinho Repórter", de Rená Tardin, filme de 2010 sobre essa experiência com o "Globo Repórter", além do clássico "Crônica de um Verão" (1961), de Jean Rouch e Edgar Morin, um dos pilares do chamado "cinema verdade", e um dos trabalhos que mais influenciaram o cinema de Eduardo Coutinho.

Não há dúvidas de que Coutinho seja nosso mais influente documentarista.  Desde o lançamento de "Cabra Marcado para Morrer" seu nome é sempre lembrado como diretor de primeiro time de nosso cinema, ao lado de Wladimir Carvalho e dos diretores que trabalharam sob a produção de Thomas Farkas (com destaque para Paulo Gil Soares, Geraldo Sarno e Maurice Capovilla).

FILMES DE ABERTURA

  • Divulgação

    "Tropicália", de Marcelo Machado. e "Jorge Mautner - O Filho do Holocausto", de Pedro Bial e Heitor D?Alincourt, abriram o festival É Tudo Verdade em São Paulo e no Rio, respectivamente

Na verdade, Coutinho não gosta de ser chamado de documentarista. Acha redutor. Prefere cineasta. Tem a ver com a afirmação do cineasta franco-suíço Jean-Luc Godard, para quem “todo grande documentário tende à ficção, e toda grande ficção tende ao documentário”. Mesmo não tendo realizado só documentários, foi dentro desse registro que o cineasta se transformou em um dos mais celebrados do Brasil.

Coutinho realizou três grandes documentários: o já mencionado "Cabra Marcado para Morrer", "O Fim e o Princípio" (2005) e "Moscou" (2009). Nesses três filmes a fórmula é subvertida por ele mesmo, causando um certo rebuliço narrativo que permite voos mais sinceros e arriscados. O diretor se oferece ao erro constantemente, e os filmes crescem com essa abertura.

Três de seus filmes, por outro lado, são superestimados, justamente porque neles o erro parece calculado (tudo, na verdade, parece calculado, pensado para agradar críticos e acadêmicos): "Santo Forte", inaugurador de uma fórmula que de certa forma é oportunista, "Edifício Master", que amplia essa fórmula para incluir a chantagem sentimental (chantagem que chegará ao ápice no mais recente "As Canções"), e "Jogo de Cena", experiência com atrizes representando depoimentos de pessoas comuns em que a única que sai ilesa é Andrea Beltrão.

Nada disso estará na retrospectiva promovida pelo "É Tudo Verdade". Melhor assim. São filmes sempre reprisados, todos lançados em DVD no Brasil. É preferível atentar para o lado mais rico e arriscado de sua produção, os anos que o levaram à concretização de sua obra máxima, "Cabra Marcado para Morrer", aqui exibido em versão restaurada pela Cinemateca Brasileira.

Os que endeusam cada nova empreitada de Coutinho deveriam (re) ver esses filmes com atenção para tomar consciência do que o cineasta já foi capaz de fazer e como hoje ele está bem longe do melhor que pode produzir.


Mostra "Coutinho: O Caminho até o 'Cabra'", no É Tudo Verdade 2012

São Paulo: de 22 de março a 1º de abril
Rio de Janeiro: de 23 de março a 1º de abril
Brasília: de 10 a 15 de abril
Programação: consulte os dias e horários de exibição neste link
Entrada Franca