Diretor de animação brasileira defende ousadia para "recontar" o Brasil
O diretor Luiz Bolognesi utiliza um herói que vive 600 anos no Brasil e enfrenta todo tido de adversidade para apresentar uma versão mais ousada sobre conflitos esquecidos pelos habitantes do país em "Uma História de Amor e Fúria", animação que será lançada em abril nos cinemas. "A história do Brasil é rica, cheia de episódios fantásticos, ideais para a dramaturgia", conta o diretor ao UOL durante tarde de entrevistas em São Paulo.
Filme com vozes de Selton Mello, Camila Pitanga e Rodrigo Santoro (leia mais sobre a opção pelo elenco aqui), a produção representa a colaboração de Bolognesi para um cinema que toque mais em feridas no Brasil. "A gente engatinha em termos de ousadia, ainda somos um pouco conservadores", afirma o diretor ao falar sobre as cenas fortes e polêmicas do filme, que chega a trazer a imagem do Cristo Redentor sem um dos braços. "Em 'Django Livre', nós temos a Casa Branca explodindo!", diz o diretor sobre uma cena do longa que se passa, na verdade, no sul dos Estados Unidos.
A referência à dramaturgia norte-americana não ocorre por acaso. Bolognesi relembra, pelo menos, outros três longas que abordam história, de forma romanceada ou não: "Lincoln", "Anna Karenina" e "Argo". Pouco comum no Brasil, a animação histórica de Bolognesi é ainda mais rara, na opinião do diretor, por conta da estética. "Um filme com desenhos adultos e com uma abordagem pop, era isso o que eu queria. Estou muito feliz com o resultado final: causar impacto e trazer reflexão."
Bolognesi apresenta no filme uma visão sobre revoltas ocorridas no passado e no futuro brasileiros, sempre a partir do ponto de vista do protagonista oprimido, um brasileiro que recebeu a dádiva de renascer como uma fênix para poder sempre lutar contra Anhangá, o espírito do mal que toma conta de autoridades e invadores. "Meu principal objetivo com esse filme é despertar o interesse sobre a história do Brasil e tirar o incômodo debaixo do tapete, colocar na mesa de jantar para todo mundo ver", diz o cineasta.
Onde a história oficial apresenta simplesmente a data da fundação do Rio de Janeiro, Bolognesi enxerga o massacre de índios tupinambás. Se livros e monumentos retratam Duque de Caxias como o patrono do Exército brasileiro, o diretor aponta, para cada medalha, um corpo de revoltoso caído nas diversas expedições das quais o militar participou.
O diretor afirma ter construído um "diagnóstico histórico" ao recontar cenas como a Confederação dos Tamoios e a Balaiada, mostrando esses acontecimentos como eventos que extrapolam a versão oficial abordada nas escolas.
"Fugi do desejo de querer ser didático neste filme. Esse termo é perigoso pois foi justamente esse formato que afastou as pessoas de nossa história", argumenta o diretor, esperando que o filme desperte no público a vontade de se informar mais sobre as tragédias que já aconteceram no país.
Já ao especular na última parte do filme sobre como seria o Rio de Janeiro em 2096, Bolognesi apresenta o local como um amontoado de prédios de altura "infinita", imersos em um ambiente controlado por milícias tornadas legítimas e com acesso limitado a água potável. "Foi a vez de fazer um prognóstico com base no que temos hoje. A gente montou um cenário assustador, no qual as milícias têm até ação na bolsa", conta o diretor.
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