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Tratamento dado a empregada em filme constrange, diz Regina Casé

Gabriel Mestieri

Do UOL, em São Paulo

18/02/2014 05h00

Protagonista do novo longa da diretora Anna Muylaert ("Durval Discos"), "Que Horas Ela Volta?", que mostra a relação entre uma empregada doméstica e seus patrões, Regina Casé acredita que o filme irá causar constrangimento. Não porque os donos da casa retratados no filme sejam cruéis, mas justamente pelo fato de serem patrões "gente fina".

Quando a pessoa quer fazer uma coisa muito autoral, sem nenhuma intervenção de outra pessoa, talvez eu não seja indicada

Regina Casé

"Ninguém fala 'eu sou filha da puta com a minha empregada'. Ninguém. Todo mundo acha que é legal, que é maneiro", afirmou a atriz em entrevista ao UOL durante um intervalo das filmagens. "Mas por mais que você seja fofinho com a sua empregada, como o filme é todo do ponto de vista dela, todo mundo fica com vergonha. A patroa não é um monstro, o patrão, são iguais a todo mundo, mas você vê como é terrível", diz.

O filme mostra a pernambucana Val (Casé), que foge da pobreza no Nordeste, deixando a filha, Jéssica (Camila Márdila), com a avó. Em São Paulo, como doméstica, cuida de Fabinho (Michel Joelsas). Anos depois, ela recebe uma ligação da filha, que quer prestar vestibular em São Paulo. Com o apoio dos patrões, Val se prepara para receber Jéssica.

Se os patrões são "gente fina", qual seria então o motivo do constrangimento? "Vergonha de por 30 anos ter dado de presente para ela uma nécessaire da TAM, do tamanho do quarto, do calor que faz lá. De não poder abrir a janela porque entra mosquito, do ventilador estar quebrado, da filha estar dormindo no colchão e nem conseguir colocá-lo inteiro no quarto, porque não cabe", diz.

Elogiada pelos colegas de elenco e pela diretora Muylaert pelo seu conhecimento do universo das domésticas e pela capacidade de improvisar, Casé diz que gosta de contribuir intensivamente com os projetos dos quais participa. "Sou muito autoral. Quando entro num projeto é porque eu gosto muito da ideia", diz. "Então também quero participar o máximo", diz.

  • Reprodução

    Regina Casé em foto sua com o filho Roque, adotado recentemente, publicada no Instagram

De acordo com a atriz, isso pode ter feito com que ela tenha perdido alguns papéis no cinema. "Quando a pessoa quer fazer uma coisa muito autoral, sem nenhuma intervenção de outra pessoa, talvez eu não seja indicada", diz.

Com Anna, conta, ocorreu o contrário. "Ela sabe que há pelo menos 30 anos eu vivo nas periferias das grandes cidades, que conheço muito essas empregadas, nas casas delas, no bar ou no pagode", diz. "Então acho que ela me chamou não só como atriz, mas por conta de toda essa contribuição, essa vivência", opina. "Me sinto muito à vontade de improvisar, e a Anna dá linha", completa.

Longe do cinema há 14 anos, desde "Eu, Tu, Eles", Regina Casé aproveitou as férias de "Esquenta", seu programa na TV Globo, para uma maratona na qual participou das filmagens de dois longas em que é protagonista em menos de três meses.

Em dezembro, antes de "Que Horas Ela Volta?", já havia filmado, no Rio, "Made In China", que tem direção do marido da atriz, Estevão Ciavatta. O filme mostra a chegada de comerciantes chineses à região do Saara, onde se concentram lojas populares no centro da capital fluminense.

"Ele [Estevão] pegou a parte pior, porque eu estava muito em outro ritmo, e como apresentadora gravo tudo quase ao vivo", diz. "Lá eu já peguei a manha e aqui já cheguei melhorzinha", afirma, bem-humorada.

Até a volta do "Esquenta", que ela começará a gravar novamente no dia 12 de março, a atriz e apresentadora ainda vai participar do desfile de duas escolas de samba e precisará organizar o batizado de Roque --garoto adotado recentemente por ela e Estevão que acompanhou a mãe durante as filmagens. "Estou bem cansada, mas acho que valeu a pena", diz.