Filme com arrastão de cães vence mostra e é mais comentado em Cannes
Num ano em que nenhum filme da competição provocou barulho de verdade, os cachorros tomaram conta. Tendo o labrador Hagen como estrela, o filme húngaro "White God" (em português, "deus branco") foi o filme mais comentado desta edição e conseguiu levar prêmios tão diferentes como o de melhor filme da mostra Un Certain Regard e a divertida Palm Dog, para o melhor cão atuando num filme do festival.
"White God" já abre com uma cena impressionante: uma menina anda de bicicleta por uma Budapeste deserta, quando uns 200 cães dobram a esquina e começam a correr atrás dela. A história então volta no tempo, e descobrimos que Hagen, o chefe da matilha, vive com sua dona, a menina Lili.
O pai da garota não surporta o cachorro e decide deixá-lo num canil. Hagen foge e começa toda uma jornada difícil: vai parar nas mãos de um mendigo, que o vende para um treinador de cães de briga, que faz dele uma máquina de matar. Quando consegue escapar, Hagen monta uma gangue gigantesca de “parceiros”. Furiosos, os 200 cães armam uma fuga em massa do canil e saem às ruas para buscar vingança de todos os que maltrataram Hagen, promovendo um verdadeiro arrastão por Budapeste.
O diretor húngaro Kornel Mundruczó usou dois labradores gêmeos, Luke e Body, para o papel de Hagen. Dezenas de treinadores de animais ajudaram a ensaiar as cenas supercomplicadas. “Foi uma experiência terapêutica. O filme é uma bela prova da cooperação singular entre duas espécies. E o mais extraordinário é que todos os cachorros usados vieram da Sociedade Protetora dos Animais, e no final do filme todos foram adotados”’conta o diretor.
A menina Lili, claro, será a única que poderá deter os cães, tocando o seu trompete numa versão moderna de "O Flautista de Hamelin". O último plano, com Lili deitada na rua ao lado dos 200 cães depois de acalmá-los com sua música, é um dos mais fortes vistos no festival.
“White God” --cujo deus branco do título é uma reverência ao homem-- remete a um clássico de Samuel Fuller, “Cão Branco” (1982), que também contava a história de um cão treinado para matar. Mas Mundruczó confirma o que é fácil ver na tela: o filme não é uma simples diversão e embute uma forte crítica social e política. “A história foi muito inspirada nas relações sociais inverossímeis e cada vez mais hostis dos dias de hoje. O senso de superioridade tornou-se um privilégio da civilização ocidental do qual é impossível não abusar. Em vez das minorias, escolhi os animais como tema do filme”, explicou.
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