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Após 32 anos, Turquia vence a Palma de Ouro com drama "Winter Sleep"

Thiago Stivaletti

Do UOL, em Cannes (França)

24/05/2014 14h18Atualizada em 24/05/2014 16h36

O filme turco "Winter Sleep", do premiado Nuri Bilge Ceylan ("Era uma Vez na Anatólia"), liderou a bolsa de apostas e ganhou a Palma de Ouro do festival de Cannes 2014, neste sábado.

“Dedico este prêmio a todos os jovens que perderam a vida ao longo do último ano”, agradeceu o diretor, referindo-se aos que morreram nos protestos contra o governo em Istambul. É a segunda fez que a Turquia leva o prêmio máximo do festival -- a primeira foi para “O Caminho”, de Yilmaz Guney e Serif Goren, em 1982, há 32 anos. O prêmio foi apresentado por Uma Thurman e Quentin Tarantino, comemorando os 20 anos da Palma de Ouro a “Pulp Fiction”.

Com três horas e quinze minutos de duração, “Winter Sleep” conta a história de Aydin, dono de um pequeno hotel na Anatólia. Ele escreve artigos sobre a moral, a religião e a busca da felicidade para um jornal local, mas sua jovem esposa Nihal e sua irmã Necla vão lhe mostrando pouco a pouco como ele é um sujeito egocêntrico e manipulador. O filme tem longos diálogos de mais de 20 minutos e é um belo conto sobre a complexidade e as contradições da alma humana, inspirado por Tchecov e Doistoiévski.

Depois da premiação, a diretora neozelandesa Jane Campion (“O Piano”) explicou a escolha do seu júri: “Quando li sobre o filme, fiquei com medo das três horas e quinze minutos. Pensei: meu deus, vou precisar de um banheiro! (risos). Mas o filme tem um ritmo tão bonito que me envolveu, eu podia ficar mais tempo ali. É como uma historia de Tchecov, com os personagens se torturando o tempo todo. Eu me vi em todos os personagens. É um filme muito sofisticado”, afirmou.

Atuação
Julianne Moore tirou o favoritismo das canadenses de “Mommy” e venceu a Palma de melhor atriz por seu papel de uma atriz neurótica atormentada pelo jovem fantasma da mãe em “Maps to the Stars”, de David Cronenberg. Moore não estava mais em Cannes para receber o prêmio.

Mais conhecido como o Wormtail da série “Harry Potter”, o britânico Timothy Spall ficou com a Palma de melhor ator pelo papel do pintor embrutecido de “Mr. Turner”, de Mike Leigh, sobre um grande pintor inglês precursor do impressionismo. O celular do ator tocou bem no momento em que ele agradecia o prêmio no palco, provocando risos na plateia. Spall lembrou que não pôde estar em Cannes quando Leigh ganhou a Palma de Ouro em 1996 com “Segredos e Mentiras” porque fazia um tratamento contra a leucemia.

O Grande Prêmio do júri, espécie de segundo lugar, ficou para "Le Maraviglie" (As Maravilhas), da italiana Alice Rohrwacher. O Prêmio do Júri, foi para o canadense “Mommy”, do jovem Xavier Dolan (25 anos), o mais novo cineasta da competição. Mas o júri também deu uma menção para “Adieu au Langage”, de Jean-Luc Godard, que, por sua vez, foi o cineasta mais velho entre os selecionados. O prêmio para Godard foi bastante vaiado pelos jornalistas na sala de imprensa. O pior é que o júri ignorou o pedido do próprio Godard, que declarou numa entrevista preferir não levar nenhum prêmio especial em reconhecimento da carreira.

O americano Bennet Miller (de "O Homem que Mudou o Jogo" e "Capote"), venceu o prêmio de melhor diretor por "Foxcather", que fez com que o Steve Carrell fosse cotado inclusive para o Oscar de melhor ator, pelo papel de John Du Pont, milionário que decide montar um centro de treinamento para lutadores em sua imensa propriedade na Pensilvânia e convidar para o projeto os irmãos Schultz, Mark (Channing Tatum) e Dave (Mark Ruffalo), medalhistas de vários campeonatos.

O russo “Leviathan”, sobre um homem comum que perde a casa e a família após uma série de contratempos, ficou com a Palma de melhor roteiro.

Em seu último ano à frente do festival, Gilles Jacob foi ovacionado de pé quando entrou no palco para apresentar o prêmio Caméra d’Or, para o melhor filme de estreia. O prêmio foi para o francês “Party Girl”, sobre uma ex-dançarina de boate aos 60 anos e sua família. Os papéis do filme são feitos pelas próprias pessoas que as inspiraram, e a protagonista é mãe de um dos diretores.

O prêmio de melhor curta ficou para "Leidi", do diretor colombiano Simón Mesa Soto. O francês "Aïssa" e o norueguês "Javi Elsker" receberam menções especiais do júri, presidido pelo diretor Abbas Kiarostami.

A cerimônia foi apresentada pelo ator francês Lambert Wilson, dos filmes da trilogia “Matrix” e “Homens e Deuses”. O júri que decidiu os prêmios foi presidido pela neozelandesa Jane Campion, diretora de “O Piano”, e incluía Willem Dafoe, Gael García Bernal, Sofia Coppola, Carole Bouquet, a atriz iraniana Leila Hatami (“A Separação”), o chinês Jia Zhang-Ke (“Um Toque de Pecado”), o dinamarquês Nicolas Winding Refn (“Drive”) e a atriz coreana Jeon Do-Yeon.

Un Certain Regard premia Salgado e cães
Depois de ser ovacionado por cinco minutos no Festival de Cannes, o documentário "O Sal da Terra", sobre o fotógrafo Sebastião Salgado, foi escolhido na sexta (23) para receber o prêmio especial do júri da mostra Un Certain Regard, presidido pelo cineasta argentino Pablo Trapero. O filme tem direção do alemão Wim Wender e de Juliano Salgado, filho de Sebastião.

O prêmio principal de melhor filme ficou com o húngaro "White Gods", longa que mostra ataques de cães selvagens pelas ruas de Budapeste, filmados com cães reais.

Confira a lista completa da 67ª edição do Festival de Cannes:

Palma de Ouro
"Winter Sleep" (Kis Uykusu), de Nuri Bilge Ceylan (Turquia)

Grand Prix
"Le Maraviglie", de Alice Rohrwacher (Itália)

Melhor diretor
Bennett Miller, por "Foxcatcher" (Estados Unidos)

Melhor ator
Timothy Spall, por "Mr. Turner" (Reino Unido)

Melhor atriz
Julianne Moore, por "Maps to the Stars" (Canadá)

Prêmio do júri
"Mommy", de Xavier Dolan (Canadá), e "Adieu au langage", de Jean-Luc Godard (França)

Melhor roteiro
Andrey Zvyagintsev e Oleg Negin, por Leviathan (Rússia)

Melhor curta
"Leidi", de Simón Mesa Soto (Colômbia) 

Menção do júri - Curta
"Aïssa" (França)
"Ja Vi Elsker" (Noruega)

Filme - Un Certain Regard
"White God", de Kornel Mundruczó (Alemanha/Hungria/Suécia)

Prêmio Especial do júri - Un Certain Regard
"O Sal da Terra", de Wim Wenders e Juliano Salgado (Brasil/França/Itália)

Prêmio do júri - Un Certain Regard
"Turist", de Ruben Östlund (Dinamarca/França/Noruega/Suécia)

Ator - Un Certain Regard
David Gulpilil - "Charlie's Country" (Austrália)

Conjunto - Un Certain Regard
Marie Amachoukeli, Claire Burger e Samuel Theis - "Party Girl" (França)