Rihanna diz que interpreta a si mesma em animação que discute imigração
“Cada um na Sua Casa”, a partir de quinta-feira (9) nos cinemas brasileiros, é o título traduzido da mais recente animação em 3D da Dreamworks, um sucesso nos EUA há muito buscado pelo estúdio, cujo último hit original (excluindo as sequências) foi “As Aventuras de Peabody & Sherman”, lançado em março do ano passado.
Se o nome em português enfatiza o conflito entre moradores do planeta Terra e alienígenas, a alma do filme está mais próxima do título original: “Home”. Inspirado no livro de Adam Rex, o filme trata do que significa, afinal de contas, sentir-se em "casa", a partir das desventuras de dois adolescentes --a muito humana Tip (vivida por Rihanna no original, e, na versão dublada para o Brasil, por Carina Eiras) e o ET Oh (na voz original de Jim Parsons, com Raphael Rossatto dublando no Brasil).
O grande trunfo do filme, que discute também de forma original temas como a superação de medos no caminho para a vida adulta e o valor real das grandes amizades, é o elenco amealhado pelo diretor Tim Johnson. Especialmente Rihanna na pele de Tip, Jim Parsons (o Sheldon da série “The Big Bang Theory”) na de Oh e um inspirado Steve Martin se divertindo como a voz do atrapalhadíssimo vilão alienígena Capitão Smek. Jennifer Lopez não faz feio como Lucy e ela e Rihanna colaboram com a trilha musical na medida certa.
"A Tip definitivamente se sente como muitos imigrantes da vida real. Ela vê, por exemplo, sua família ser separada à força, a mãe sendo levada para local um desconhecido. O filme, definitivamente, mexe com temas importantes e atuais, e eu me achei a cara dela, ou melhor, ela é a minha cara, né? Exatamente como a Tip, eu me senti a ‘diferente’ muitas vezes na minha vida. Quando eu deixei Barbados e me mudei para os EUA afim de avançar em minha carreira musical, gente, eu tinha apenas 16 anos, né? Nossa, a Tip sou eu!", diz a atriz e cantora do hit "Umbrella".
"O que me fez querer dirigir o filme foi a multiplicidade de elementos. Você pode tirar várias ideias desta história, incluindo uma discussão sobre a imigração, além de se tratar, claro, também, de uma trama divertida para crianças de todas as idades, diz Johnson, de “FormiguinhaZ” e, mais recentemente, “Os Sem-Floresta”.
Rihanna
A Tip definitivamente se sente como muitos imigrantes da vida real. Ela vê, por exemplo, sua família ser separada à força. O filme mexe com temas importantes e atuais. Exatamente como a Tip eu me senti a 'diferente' muitas vezes. Quando eu deixei Barbados e me mudei para os EUA afim de avançar em minha carreira musical, gente, eu tinha apenas 16 anos, né? Nossa, a Tip sou eu!
O filme começa com a chegada dos Boovs, que construíram uma civilização especializada em escapar de seus inimigos ocupando planetas nos cantos mais escondidos do universo. Eles acabam parando na Terra e o processo de colonização se dá da pior maneira possível para os humanos, confinados em residências improvisadas na Austrália. Por um capricho dos deuses, e com uma providencial ajuda de seu gato de estimação, Tip escapa do exílio involuntário, mas se vê separada de sua mãe, Lucy. E acaba, por outras artimanhas do destino, sendo ajudada na tarefa de restaurar sua pequena família pelo mais desajustado dos boovs, Oh.
"O filme é, para mim, uma grande metáfora para a situação dos imigrantes em geral, não apenas nos EUA. No filme, eles são alienígenas, mas em vários serviços de imigração mundo afora quem não é do país natal recebe esta alcunha, de ‘alien’, pelos serviços oficiais responsáveis pelo sistema de imigração. 'Cada um na sua Casa' ainda tem outra enorme vantagem, o fato de não se falar em ‘país’. Todos se identificam como ‘terráqueos’, o que sublinha ainda mais os problemas com fronteiras, identidades, nacionalismos", filosofa Steve Martin.
O desenho mostra detalhadamente Paris, alçada ao posto de capital planetária pelos alienígenas, e Nova York, onde vive Tip, e oferece algumas pinceladas de metrópoles mundo afora, incluindo o Rio de Janeiro. Curiosamente, sabe-se que Lucy e Tip são imigrantes de Barbados, tentando se adaptar à vida novaiorquina, com seu corre-corre e inverno longo, com o milagre e a inconveniência das inevitáveis nevascas.
Para o filme, Rihanna, 27 --cujas participações anteriores em Hollywood se deram na megaprodução “Battleship: a Batalha dos Mares” e, ano passado, no revival do musical “Annie”--, resolveu oferecer, quando o trabalho de dar voz a Tip já estava no meio do caminho, a inspirada canção “Towards the Sun”, que ela compôs com Gary Go e o português Tiago Carvalho.
Letra e música, ela conta, acabaram sendo feitas com Tip na cabeça, e o resultado é uma canção de superação, que casa bem tanto em grandes estádios quanto no filme, com os conselhos motivadores “fixe seu olhar no sol e deixe as sombras da vida para trás, se seguir mirando o futuro, elas jamais a encontrarão”.
Uma das cenas mais divertidas é justamente a que Tip tenta ensinar Oh a curtir o ritmo da música pop terráquea. É difícil, na versão original, não imaginar que, dentro do pequeno carro voador usado pela dupla para cruzar o Oceano Atlântico, em uma viagem inesquecível de Nova York a Paris, não seja a própria suingada Rihanna quem esteja ensinando o mais durão Jim Parsons as vantagens de um belo requebrar.
"Poxa, mas eu canto a música dela com a maior alegria, olha só (começa a entoar o refrão de 'Towards the Sun' com um agudo para lá de exagerado), retruca Parsons, para receber um "é, ficou lindo" da cantora, usando seu lado atriz ao oferecer uma expressão de concordância.
Steve Martin
O filme é, para mim, uma grande metáfora para a situação dos imigrantes em geral, não apenas nos EUA. No filme, eles são alienígenas, mas em vários serviços de imigração mundo afora quem não é do país natal recebe esta alcunha, de "alien", pelos serviços oficiais responsáveis pelo sistema de imigração
Rihanna também se arrisca a dizer que a Tip do filme é um belo modelo para adolescentes mundo afora, fãs ou não de sua música. No “New York Times”, o crítico Neil Genzlinger elogiou o filme, mas lembrou que adultos podem se fixar em uma possível mensagem velada pró-imigração, tema quente nos EUA, onde cerca de 12 milhões de não-documentados, em sua maioria esmagadora contribuintes, com impostos pagos em dia, aguardam uma reforma política afim de deixarem de ser cidadãos de segunda classe.
No agregador de resenhas Rotten Tomatoes o filme recebeu aprovação de apenas 47% dos críticos norte-americanos. Mas, curiosamente, os críticos que gostaram da aventura de Tip e Oh estão concentrados nas principais publicações de âmbito nacional e de cunho mais liberal, como os jornais “New York Times”, “Washington Post” e as revistas “New York” e “Entertainment Weekly”. Já na chamada América Profunda, o nariz torcido apareceu significativamente mais amiúde.
"Quando eu finalmente vi o filme, senti que a mensagem era muito clara. 'Cada um na sua Casa' trata do encontro de dois seres completamente diferentes, com ideias pré-concebidas sobre o mundo do outro. Aos poucos eles vão percebendo, no entanto, que têm muito mais em comum um com o outro do que eles imaginavam. Na viagem de carro por sobre o Atlântico, eles vão se conhecendo, os pré-julgamentos vão se dissipando e uma grande amizade se forma. E aí você não consegue deixar de pensar o quanto a gente julga os outros, ao invés de tentar entendê-los. É isso", diz Rihanna.
É impossível não deixar de pensar em Rihanna quando o título do filme volta a martelar na cabeça do público. Para a atriz multi-cultural, exposta à musicalidade caribenha, americana, britânica e latina desde cedo, uma pop star sem medida, uma das atrações confirmadas da próxima edição brasileira do Rock in Rio, no segundo semestre, onde fica a "casa"?
"Ah, em Barbados, sempre. Casa, para mim, é onde eu me sinto, ao mesmo tempo, em segurança, confortável, em família. Lá eu tenho minhas praias de estimação, a temperatura ideal, sempre tropical, a culinária, a musicalidade. Lá eu me sinto em casa, sempre."
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