Brasil faz passagem discreta e sem exaltação pelo Festival de Veneza
Respeitosa, mas sem exaltação. Assim foi a recepção da imprensa a “Mate-me por Favor”, terror cômico da carioca Anita Rocha da Silveira, que encerra a participação do Brasil no Festival de Veneza. Como também já havia sido a acolhida ao outro longa brasileiro no evento, o drama nordestino “Boi Néon”, do pernambucano Gabriel Mascaro.
Os dois filmes não disputam o Leão de Ouro e fazem parte da mostra Horizontes, a segunda mais importante, reservada a filmes com “novas tendências estéticas e expressivas”, mas sem o mesmo apelo midiático da principal. O curta, “Tarântula”, de Aly Muritiba e Marja Calafange, compôs o trio nacional em passagem discreta pelo Lido.
Esta é a sétima vez consecutiva que o Brasil não consegue emplacar um longa na disputa pelo prêmio mais relevante no evento italiano –o último a concorrer foi “Terra Vermelha” em 2008, coprodução com a dona da casa Itália, dirigida pelo chileno Marco Bechis.
Dizer que Veneza tem “birra” com o cinema nacional talvez seja um exagero, mas o festival definitivamente não parece dar tanto peso a nossa produção mais recente –ao menos na mostra principal como alguns outros do circuito top. Mesmo nas paralelas, por vezes Veneza ignora quase que por completo nossos filmes; no ano passado, só um curta, “Castillo y el Armado”, do gaúcho Pedro Harres, fez parte da programação.
Berlim e Toronto
O Festival de Berlim, por exemplo, parece ter mais simpatia pelo Brasil. O evento incluiu um filme brasileiro na competição principal ainda no ano passado: “Praia do Futuro”, de Karim Aïnouz. E o país ainda teve a honra de deixar duas competições não tão distantes assim, em 1998 e 2008, levando para casa o prêmio máximo berlinense, o Urso de Ouro, com “Central do Brasil”, de Walter Salles, e “Tropa de Elite”, de José Padilha.
O país também tem tido presença nas disputas de outros festivais de peso, como os de Locarno (Suíça), Roterdã (Holanda) e San Sebastián (Espanha). E não deixa de ser curioso que o de Toronto, que já há alguns anos tem sido a principal “pedra no sapato” de Veneza, já que acontece quase na mesma época (e atrai mais estrelas), escolheu para a sua competição principal deste ano o mesmo “Boi Néon”, que os italianos deixaram para a Horizonte.
“A política curatorial de cada festival é singular e não podemos tratar isso como algo generalista, de que ‘o Brasil não emplaca filmes em mostras competitivas’”, diz Gabriel Mascaro. “Toronto resolveu posicionar o ‘Boi Néon’ de forma diferente de Veneza, arriscando apostar no filme para a competição principal, ainda que a Horizontes seja incrível”, conclui o cineasta.
A direção do Festival de Veneza não quis falar à reportagem do UOL, alegando que um pretenso desinteresse pelo cinema nacional “não se aplica” à edição atual do evento.
Já a de Toronto, ao contrário, parece ter orgulho em explicar os motivos por optar pelo filme de Mascaro na seleção competitiva. “Eu vi ‘Boi Néon’ no Brasil e fiquei sem palavras. Tem uma voz nova e original. É muito peculiar, sublinhado por uma textura suave e delicada”, diz Diana Sanchez, programadora da mostra canadense, especializada na produção latino-americana. “Trouxe o filme para Toronto e, felizmente, todos nós concordamos que Gabriel Mascaro é um cineasta que nós temos o interesse de apoiar –já estou curiosa para ver a trajetória da carreira dele”, diz ela, destacando que a produção nacional recente tem diversos outros talentos de peso, como Fernando Coimbra, Sandra Kogut e Marcelo Gomes .“Além, é claro, de Walter Salles”, diz.
Escolhas
As escolhas curatoriais de um festival costumam levar em conta fatores muito variados e díspares. Há pressões de todos os lados. Uma preocupação que costuma ser comum aos principais eventos cinematográficos diz respeito à opção por tornar o evento o mais geograficamente acolhedor possível, de preferência com produções de países de todos os continentes; passa-se, assim, a ideia de uma mostra global, sem preconceitos de origem.
As escolhas também passam por conversas do festival com grandes estúdios (para garantir a ida de estrelas, principal catapulta para a divulgação das mostras em jornais e sites) e diálogos com outros festivais, em uma espécie de negociação informal no melhor estilo “me dá esse filme, que eu te dou aquele”. Mas, obviamente, o que define tudo, por fim, é mesmo a preferência estética da equipe de curadores, o que, além de variar segundo gostos pessoais, depende muito do calor do momento –anos com questões políticas mais sérias, por exemplo, tendem a preferir produções mais politizadas.
Algumas outras estratégias mais pontuais podem ajudar filmes a irem a festivais –as coproduções internacionais, por exemplo. Ter um bom agente de vendas também ajuda. Foi, aliás, tendo como preocupação ampliar esse processo de “internacionalização” dos nossos filmes que a Secretaria do Audiovisual criou, em 2006, uma agência específica para isso, chamada Cinema do Brasil.
“A participação tem sido crescente. Se você olhar há dez anos, quando tinha um filme numa seleção paralela era uma grande novidade. Nos últimos anos, isso tem aumentado”, diz André Sturm, diretor da agência. “Em todas as seleções de Berlim, Roterdã, San Sebastián, Locarno e Toronto, temos pelo menos um filme nos últimos três anos. Neste ano, após uma ausência longa, temos dois em Veneza. Ainda não é o que desejamos, mas está maior o interesse dos Festivais. Estamos otimistas de que crescerá a participação a cada ano”, completa Sturm.
Os três filmes brasileiros, ainda que não briguem pelo Leão de Ouro, estão concorrendo aos prêmios específicos da mostra Horizontes. A entrega será no próximo sábado (12), mesma data em que o vencedor do Leão de Ouro também será conhecido.
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