Com Jean Wyllys, "Entre Homens de Bem" mostra bastidores do Congresso
Durante algum tempo, o documentário teve como título “Eu Jean Wyllys” mas, por sugestão do próprio personagem do projeto, passou a se chamar “Entre Homens de Bem”. “Achei esse título um horror. Não queria que fosse batizado com o meu nome”, explicou o próprio deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) na noite desta sexta-feira (23), após a concorrida estreia do longa-metragem na mostra paralela "A Política no Mundo e o Mundo da Política", do 49º Festival de Brasília, após a qual o parlamentar foi recebido pelo público como estrela de cinema.
Dirigido por Carlos Juliano Barros e Caio Cavechini, o filme é um passeio pelas entranhas conservadoras do Congresso Nacional, e tem como guia o próprio deputado, único parlamentar gay assumido e porta-voz da causa LGBT. “O título é muito bacana, porque tem a ver com a citação que faço à (fisólofa política alemã) Hannah Arendt, que diz que a ‘política nasce entre os homens’, e ala conservadora diz que eles são os homens de bem, e que nós, que defendemos a inclusão social é que somos maus”, disse Wyllys.
Ao longo de três anos, a equipe de Carlos Juliano e Caio acompanhou os passos de Jean Wyllys em casa, nas ruas e, principalmente, pelos corredores da Câmara dos Deputados, até as eleições de 2014, quando foi reeleito para um segundo mandato com cerca de 145 mil votos. No ano seguinte, a revista britânica “The Economist” o colocou entre as 50 maiores personalidades do mundo que lutam pela diversidade, mas entre os seus colegas de orientação religiosa ele é chamado de “canalha” e “pervertido”.
Os ataques dentro do parlamento, que encontraram eco nas redes sociais, acabaram levando a pauta política para as ruas, e Wyllys virou uma estrela da mídia. “Ao longo dos anos (os diretores) puderam acompanhar como fui construído publicamente pelo fundamentalismo religioso, que tem dinheiro para convencer as pessoas, inclusive que julgamos inteligente e bem informadas, de que sou uma ameaça. Disseram que eu queria mudar a Bíblia, que eu xingava cristãos”, lembrou o deputado.
O filme abre com Wyllys em um ritual de descarrego numa casa de umbanda, às vésperas das eleições. Retrocede aos bastidores da quinta edição do Big Brother Brasil (2005), de onde o então jovem professor baiano saiu vitorioso, e vai até a cidade natal, Alagoinhas (BA), reencontrar a família e amigos. No Congresso, é frequentemente abordado por pessoas que lhe pedem dinheiro para comprar a passagem para voltar para casa e por um pastor anônimo que o aconselha que ele está lutando por uma causa errada, pervertida. “Perversão é pedir o código do cartão do banco durante o culto”, reage o deputado do PSOL.
Mais adiante, “Entre os Homens de Bem” mostra um vídeo em que o deputado federal Marcos Feliciano (PSC/SP), pastor de uma igreja neopentecostal ligada à Assembleia de Deus, aparece zombando de um fiel que entregou o cartão do banco sem o código de acesso. A plateia do Cine Brasília reage com gargalhadas quando Feliciano diz que “há uma ditadura gay em curso, que é um movimento mundial, que vem da ONU (Nações Unidas) para cá”.
O filme flagra provocações de parlamentares dentro da Câmara, e exibe depoimentos de outros rivais ferrenhos às políticas de Jean Wyllys, como o Pastor Eurico (PHS/PE) e Jair Bolsonaro (PSC/RJ), feroz opositor do projeto que previa a discussão sobre gênero e diversidade nas escolas, apelidado de “kit gay”. O filme acompanha a polêmica indicação de Feliciano para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara, em 2015, mostra cultos evangélicos dentro do Congresso, e exibe a preocupação do deputado do PSOL com o crescente número de ameaças de morte.
“Percebo um significado por trás de tudo disso, um golpe contra um único homem que tem atrás de mim um movimento de muita boa vontade, que o LGBT, que envolve também feministas, negros e negras, o povo de santo, uma grande multidão que quer um pais melhor para nossos filhos. Os fundamentalistas religiosos acharam que poderiam que encarar esse vespeiro sem nenhuma conseqüência”, disse Wyllys.
“Entre Homens de Bem” é um projeto que já nasceu polêmico. Quando o projeto veio a tona, Jean Wyllys chegou a ser acusado de que estaria fazendo um filme sobre si mesmo com dinheiro público. Logo no início do filme, uma cartela avisa que a produção não utilizou de leis de incentivo ou qualquer outra fonte governamental, mas com recursos de um financiamento coletivo, que arrecadou cerca de R$ 130 mil. Os nomes das cerca de 1500 pessoas que contribuíram para o projeto são listados nos créditos finais.
“Não queríamos fazer um filme panfletário”, avisou o codiretor Carlos Juliano, após a projeção. “Hesitei bastante quando eles falaram que queria fazer um filme sobre mim”, lembrou Wyllys. “Não gostava da ideia de ter uma câmera às minhas costas, me acompanhando aonde quer que eu fosse, por tanto tempo. Mas a gente conversou bastante e eles me explicaram que queriam fazer sobre o momento atual do país, de crise de representatividade e polarização ideológica, e foi com esse argumento que eles me convenceram”.
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