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Diretores se retiram de festival após anúncio de filme "conservador"

Produtor Matheus Bazzo, o protagonista do filme, Olavo de Carvalho, e o diretor Josias Teófilo durante filmagem de "O Jardim das Aflições", que integra a competição principal do Cine PE - Divulgação
Produtor Matheus Bazzo, o protagonista do filme, Olavo de Carvalho, e o diretor Josias Teófilo durante filmagem de "O Jardim das Aflições", que integra a competição principal do Cine PE Imagem: Divulgação

Do UOL, em São Paulo

10/05/2017 17h02

Sete cineastas selecionados para a 21ª edição do Cine PE retiraram seus respectivos filmes da competição. A decisão de se abrir mão da competição foi tomada em conjunto após o anúncio completo da programação do festival.

Segundo os realizadores, a presença de alguns filmes “favorece um discurso partidário alinhado à direita conservadora e grupos que compactuaram e financiaram o golpe ao Estado democrático de direito ocorrido no Brasil em 2016”, diz a carta. 

Programado para acontecer entre os dias 23 e 29 de maio, em Recife, a 21ª edição do festival havia anunciado o documentário “O Jardim das Aflições”, sobre o filósofo conservador Olavo de Carvalho, na principal competição.

Ao UOL, no ano passado, o diretor Josias Teófilo reclamou da recusa dos festivais em selecionar seu filme. "Os critérios exclusivamente políticos se mesclam com julgamentos estéticos", defendeu.

No lugar do incentivo público, "O Jardim" conta com cotas de patrocínio de uma editora --que prepara uma biografia do deputado Jair Bolsonaro-- e de um site que defende o ensino domiciliar, longe das escolas, uma das bandeiras mais caras do conservadorismo.

Além do filme sobre Olavo, o festival anunciou a exibição fora da competição de “Real- O Plano por Trás da História”, de Rodrigo Bittencourt, que resgata a criação da moeda em 1993, no governo Itamar Franco.

"Não imaginei que a seleção do festival fosse dar espaço a filmes claramente alinhados com uma direita extremista", disse ao UOL Arthur Leite, diretor do curta "Abissal", um dos dissidentes. "Esse foi o fato que nos levou a retirar nossos filmes do Cine PE. Não quero ter meu nome e meu filme associados a essas obras, nesse momento tão anormal e sensível em que vivemos."

Com o protesto, o documentário pernambucano “O silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras”, de Petrônio Lorena, deixa de concorrer diretamente com “O Jardim das Aflições”. A competição de curtas, no entanto, é a que mais foi esvaziada. Além de “Abissal”, “A Menina Só”, de Cíntia Domit Bittar, “Não Me Prometa Nada”, de Eva Randolph, e “Vênus – Filó a Fadinha Lésbica”, de Sávio Leite, não fazem mais parte da competição.

“Baunilha”, de Leo Tabosa, e “Iluminadas”, de Gabi Saegesser, dois selecionados para a mostra competitiva de curtas pernambucanos, completam a lista.

Procurado pelo UOL, o Cine PE ainda não se manifestou sobre o caso.

Segue a nota na íntegra divulgada pelos realizadores:

Decidimos tornar pública a decisão, conjunta, de retirar nossas obras da seleção do XXI Cine PE Festival Audiovisual, a ser realizado entre os dia 23 e 29 de maio de 2017, na cidade de Recife. Apenas no dia 08 de maio, através de veículos de imprensa, tomamos conhecimento da grade completa dos filmes que foram selecionados para o festival.

Constatamos que a escolha de alguns filmes para esta edição favorece um discurso partidário alinhado à direita conservadora e grupos que compactuaram e financiaram o golpe ao Estado democrático de direito ocorrido no Brasil em 2016. Para nós, isso deixa claro o posicionamento desta edição, ao o qual não queremos estar atrelados.

Reconhecemos a importância do Cine PE Festival Audiovisual, do qual muitos de nós já participaram em edições anteriores. Esperamos poder participar de edições futuras e mais conscientes, condizentes com sua grandeza histórica e relevância para a formação de público do cinema brasileiro.

Assinam os representantes dos filmes abaixo listados:

“Abissal” – Ceará
“A Menina Só” – Santa Catarina
“Baunilha” – Pernambuco
“Iluminadas” – Pernambuco
“Não me Prometa Nada” – Rio de Janeiro
“O silêncio da Noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras” – Pernambuco
“Vênus – Filó a fadinha lésbica” – Minas Gerais