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No papel de Itamar Franco no cinema, ator tira sarro de Temer no YouTube

Cena de "Real - O Plano por Trás da História" - Divulgação
Cena de "Real - O Plano por Trás da História" Imagem: Divulgação

Tiago Dias

Do UOL, em São Paulo

23/05/2017 04h00

Eterno Bafo de Bode de "Tieta", Bemvindo Sequeira vira youtuber da terceira idade para fazer o que mais gosta: Falar de política e fazer graça

Ele já foi o maltrapilho falastrão Bafo de Bode em “Tieta”, e fez o bandido caricato Zebedeu ser adorado pelas crianças em “Mandacaru”, mas só agora, aos 69 anos, Bemvindo Sequeira faz uma importante estreia solo: a de youtuber da terceira idade.

Há um ano, o ator criou o canal para se comunicar com idosos, mas acabou usando o espaço para duas de suas predileções: Falar de política e fazer graça. Nos vídeos, com pouco recurso e edição, ele destila piadas para ilustres, como o prefeito de São Paulo, João Dória, a quem daria uma multa por jogar no chão as flores recebidas por uma ciclista. “Já fui pai de santo. Flor não pega macumba”, aconselha no vídeo.

Na última semana, imaginou uma conversa por telefone com o presidente Michel Temer. “Michel, muito aqui entre nós... Fodeu”. Para a Operação Lava-Jato, disse que tinha uma informação quente para o “detetive com nome de xarope” [O procurador Deltan Dallagnol]: “Foi o Lula quem inventou o Levy Fidelix”, diz ao telefone. “Eu não tenho provas, mas tenho convicção”.

As piadas irônicas caíram no gosto na internet. “Não gosto quando o humor é escroto, quando diz que uma mãe que está amamentando é uma vaca leiteira”, disse ao UOL, entre uma gravação de TV e outra de vídeo – que ele faz sozinho em sua casa com ajuda de um aplicativo de edição o celular. “Não gosto disso, humor tem que ter elegância.”

Bemvindo Sequeira como Itamar Franco em "Real": "Só humoristas conseguem fazer bem drama" - Divulgação - Divulgação
Bemvindo Sequeira como Itamar Franco em "Real": "Nós comediantes somos muito bons no drama"
Imagem: Divulgação
Os vídeos ganharam maior dimensão ao ser compartilhado por perfis mais alinhados à esquerda, mas junto com a visibilidade, veio também as críticas. “Petralha” é o comentário mais leve. “Você não faz ideia do que me xingam no canal”, ele comenta. “E nem petralha eu sou”.

Mal sabem eles que o ‘marxista’, como se define, vai invadir as telas na próxima quinta-feira (25) na pele (e no topete) de Itamar Franco, no filme “Real – O Plano por Trás da História”, de Rodrigo Bittencourt, um filme tido por muitos como “conservador”.

Mas como é possível um ‘petralha’ dar uma ‘guinada’ à direita’ dessa forma? Ele solta uma das muitas gargalhadas que pontua por toda a entrevista: “É um vírus. Pegou no [historiador Leandro] Karnal quando ele foi tomar vinho com [Sérgio] Moro, e no Chico Alencar que beijou o Aécio [Neves]. É um vírus que está rolando por aí.”

Quando o humor dá um tempo, ele desfaz a pecha de filme tucano. “Não posso negar que Dom Pedro I foi quem fez a Independência. Queria eu que fosse o povo do Brasil, mas foi um português. A história é a história, não tem para onde correr”, defende. “Talvez eu não fizesse a [série] ‘Lava-Jato’ do [José] Padilha’. Algo partidário eu não faria. O roteiro colocava o Itamar como o pai do Plano real e achei justo. Eu não vi mentiras no roteiro. Para mim é uma honra”, orgulha-se.

Bemvindo Sequeira vive Itamar Franco em "Real"; veja trecho

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Acabou a graça

A imagem de Itamar sempre foi um prato cheio para os humoristas na época em que assumiu a presidência e não foi diferente para Bemvindo. A versão do ex-presidente para a ficção vem sendo construída pelo ator desde quando ele integrou o humorístico “Escolinha do Professor Raimundo” no papel de Brasilino Roxo, um patriota alienado e exacerbado que usava um colete militar. “Ele tinha o topete e o jeito do Itamar”, conta. A transição para um papel mais sóbrio foi tranquila, garante o ator: “Nós comediantes somos muito bons no drama”.

Seu Brasilino, personagem de "Escolinha do Prof. Raimundo", tinha inspiração no presidente-tampão - Reprodução - Reprodução
Seu Brasilino, personagem de "Escolinha do Prof. Raimundo": Inspiração no presidente-tampão
Imagem: Reprodução

Na vida real, no entanto, Bemvindo diz que o tom trágico do noticiário político o fez perder a graça. “A desgraça é muito grande. E o que é a desgraça se não a perda da graça?”, observa. “A sem-graceza do Temer é uma coisa notória. Alguém que não ri, engasga”.

O sentimento piora conforme os comentários vão pingando no seu canal: “Acho que a gente vive um momento muito polarizado, qualquer coisa é motivo de ódio, raiva. A gente precisa ter muito cuidado com o sectarismo”, explica.  “Querendo ou não você entra no chamado campo inferior”. E termina a entrevista dizendo que isso o faz pensar em desistir do seu canal.

Dois dias depois, no entanto, ele subiu um novo vídeo no canal: Era mais uma ligação imaginária para Temer, desta vez dando como certa a delação de Joesley Batista, da JBS: “Você sabe, se for Friboi, pode confiar”.