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José Padilha refilma "Robocop" com tensão, mas sem personalidade

Neusa Barbosa

Do Cineweb, em São Paulo*

20/02/2014 16h15Atualizada em 20/02/2014 19h49

Ao dirigir a aguardada refilmagem de "Robocop", sua estreia em Hollywood, que chega aos cinemas nesta sexta (21), o premiado diretor brasileiro José Padilha, vencedor do Urso de Ouro em Berlim em 2008 por "Tropa de Elite", confirma suas qualidades e defeitos habituais.

Ou seja, mostra energia, agilidade e também mão pesada ao retratar ação e violência. Também não escapa do maniqueísmo na direção de atores e na abordagem da política --como aconteceu, aliás, na sequência "Tropa Elite 2 - O Inimigo Agora é Outro", de 2010.

Foi tumultuada a produção de "Robocop", refilmagem da celebrada aventura de 1987 do diretor Paul Verhoeven. Padilha nem foi a primeira opção, mas acabou realizando o filme, com orçamento estimado em 140 milhões de dólares, boa parte deles gastos em muitos efeitos especiais.

Mais uma vez, o cenário é Detroit, mas a cidade norte-americana mais parece um genérico de toda e qualquer grande metrópole do mundo, abalada pelo descontrole do crime.

No exterior, uma grande empresa norte-americana, a Omnicorp, fatura alto com seus drones e robôs, que comandam a segurança em países ocupados pelos EUA - na sequência inicial, eles são mostrados em ação em Teerã, um toque político nada sutil em relação a um dos países com quem os EUA mantém uma relação mais complicada.

O sonho da Omnicorp é usar estes robôs dentro dos EUA, mas é impedida por leis e senadores preocupados com a falta de limites e sentimentos das máquinas. Uma brecha surge quando o empresário Raymond Sellars (Michael Keaton) dobra os pruridos éticos do médico Dennett Norton (Gary Oldman), convencendo-o a transformar um policial quase morto numa explosão, Alex Murphy (Joel Kinnaman), num ciborgue.

Mais máquina do que homem, agora conhecido como Robocop, o policial cibernético conquista instantaneamente a adoração popular em Detroit por sua capacidade de acumular fichas policiais e mandados de prisão em sua memória eletrônica, localizando e prendendo criminosos com a velocidade da luz, a bordo de uma possante motocicleta. Ainda por cima, ele é praticamente invulnerável.

Com montagem rápida (do também brasileiro Daniel Rezende e de Peter McNutty) e muito barulho, por seus seguidos tiroteios, o filme derrapa toda vez que tenta aprofundar algum aspecto ético de suas situações. A grande questão, se Alex/Robocop ainda é humano, é tratada de maneira um tanto vaga, com o doutor Dennett abrindo mão um pouco rápido demais de suas preocupações morais.

Michael Keaton, como sempre, está vários tons acima na interpretação do vilão do pedaço, o empresário inescrupuloso, desmentindo a velha máxima de que os malvados são os personagens mais interessantes. Mulher do Robocop, Abbie Cornish aparece mais do que a esposa no filme de 1987, mas pouco mais faz do que chorar.

Neste mundo muito maniqueísta, quase de histórias em quadrinhos, a melhor coisa é mesmo Pat Novak (Samuel L. Jackson). Na pele de um apresentador de TV reacionário e militarista, ele dá seu habitual show de ironia, carregando a faixa da discussão sobre o fascismo implícito no pensamento de Sellars e sua gangue --que está contaminando, aliás, boa parte do mundo contemporâneo.

Ensurdecedor e sem alma, "Robocop" parece ter sido feito na gigantesca linha de montagem chinesa que fabrica em série os robôs da Omnicorp.

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb