Comédia mexicana "Paraíso" discute padrões estéticos e sociais
Não é só por eleger como sua musa uma heroína bem fora dos padrões estéticos e esquálidos vigentes que a comédia dramático-romântico mexicana "Paraíso", que estreia nesta quinta (7), se desvia das formulações quase inevitáveis do gênero.
Sem dúvida, é a joia do filme ter acertado com uma atriz tão natural e carismática quanto a estreante Daniela Rincón para interpretar sua rechonchuda protagonista, Carmen. Casada com um namorado da adolescência, Alfredo (Andrès Almeida), ela encarna com ele um protótipo de felicidade suburbana.
Comilões, gorduchos e apaixonados, eles moram em Satélite, um subúrbio da capital mexicana, têm um cachorro e uma árvore plantada no jardim. Ela trabalha no negócio de refeições dos pais.
Quando ele consegue um novo emprego numa grande empresa na Cidade do México, acena-se para uma perspectiva de ascensão social. Mas também de total mudança de parâmetros. Literalmente, o chão parece sair debaixo dos pés de Carmen, especialmente. Afinal, é ela quem será privada do trabalho familiar, do cachorro e das relações que a sustentavam até ali.
A inadequação da bagagem que os dois trazem para o novo apartamento é simbolizada pela imensa geladeira —que não cabe na porta e tem que ser despachada de volta. Fora isso, é a própria figura física deles que não se ajusta ao figurino de sua nova classe social.
Numa festa da empresa do marido, Carmen ouve sem querer colegas dele cochichando sobre a gordura dos dois, descrevendo-os como dois "fugitivos de uma exposição de Botero" —artista colombiano que, inclusive, Carmen só vai descobrir quem é pela Internet.
A dieta torna-se uma urgência para Carmen, levando-a a convencer o marido a acompanhá-la, mesmo relutante, às frenéticas reuniões de uma espécie de ?Vigilantes do Peso?. No processo, as posições se invertem e é ele quem se entusiasma bem mais pelo emagrecimento, descobrindo uma nova vaidade, um novo figurino, novos hábitos. E instala-se a crise no casamento feliz entre o par que se chamava entre si de "gordo" e "gorda".
Diretora que estreou em longas de ficção com o ótimo "Cinco Dias sem Nora" (2008), Mariana Chenillo, que adapta neste roteiro um conto de Julieta Arévalo, tem um olhar fino para as contradições humanas, os relacionamentos amorosos e também as expectativas da classe média, que é retratada em seus dois filmes.
Singelo na aparência, "Paraíso" coloca em questão muito mais do que a obsessão pela boa forma ou os limites da vida familiar e dos papeis sexuais, explorando o que é realmente felicidade ao colocar em xeque as fórmulas socialmente impostas de realização, sucesso e mesmo de emagrecimento, como se pudessem servir indiscriminadamente a todos, só restando aos "desviados da norma" a exclusão.
Por sua ternura com os personagens e um humor sutil, "Paraíso" remete, às vezes, à comédia alemã "Sugar Baby" (1985), de Percy Adlon —em que a heroína de formas generosas, Marianne Sägebrecht, foi uma precursora da nova musa mexicana, Daniela Rincón.
*As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.