9 Canções (2004)

Edilson Saçashima

Da redação 03/03/2011

Nota 4

''Nove Canções'' trilha dois caminhos que parecem que jamais vão se cruzar. De um lado, o filme de Michael Winterbottom mostra cenas de sexo explícito, o que é um prato cheio para acusar o trabalho de pornográfico. De outro lado, o inglês filma shows de algumas bandas de destaque da cena contemporânea, como Franz Ferdinand, The Dandy Warhols e Primal Scream, em um estilo documental. Enfim, dois assuntos que, aparentemente, soam tão distantes. No entanto, é exatamente à distância em todos os seus sentidos que forma o tema principal do filme.

O assunto está colocado desde o início, quando o protagonista britânico Matt (Kieran O'Brien) vai parar na Antártida, um lugar longe de tudo. Ali, ele irá lembrar do seu romance com a americana Lisa (Margo Stilley). O caso amoroso entre os dois irá durar uma temporada regada a (muito) sexo, (algumas) drogas e (muito) rock'n'roll.

O filme não é muito mais que uma sucessão de transas do casal intercaladas por cenas de shows de bandas que o casal presenciou. No entanto, em um determinado momento, há uma pequena mudança que prenuncia o fim do relacionamento do casal. Um dia, Matt vê Lisa se masturbando.

A cena revela um primeiro sinal do distanciamento entre os dois. Até então, havia uma aproximação pelo desejo carnal, que no filme dá a entender ser o único vínculo existente entre Matt e Lisa. A cena de masturbação é um sinal que este elo está se perdendo.

A opção do sexo explícito para retratar o relacionamento do casal serve para mostrar a proximidade física dos dois, mas ao mesmo tempo o distanciamento emocional que separa os dois.

Processo oposto ocorre na relação com as bandas retratadas no filme. O vínculo que se estabelece entre o público, da qual faz parte Matt e Lisa, e a banda é de distanciamento físico (e Winterbottom reforça essa impressão ao filmar as apresentações musicais sempre do ponto de vista da plateia), mas de proximidade emocional.

Winterbottom trabalha a questão do distanciamento físico e emocional ao associar dois tipos de envolvimentos afetivos. Um deles é carnal e está relacionado ao sexo. O outro é idealizado, como na nossa relação com uma banda que gostamos.

''Nove Canções'' teve boa participação em festivais de cinema, incluindo Sundance, Toronto e San Sebastian, mas apanhou da crítica. O jornal americano The Washington Post, por exemplo, cravou que o sexo é a parte mais chata do filme. Faz sentido. Por um lado, tornar o sexo mecânico, como nos filmes pornográficos, tira o encanto da transa. Por outro, Winterbottom é diretor de ''24 Hour Party People'', sobre o cenário musical de Manchester entre Joy Division e Happy Mondays, e tem trabalhos de cunho social que flertam com o documentário. Esse know-how é perceptível nas cenas documentais dos shows em ''Nove Canções'' e dá mais ''calor'' às seqüências musicais. Nessa ousada tentativa de unir os desiguais, o sexo acabou em desvantagem.