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Ficha completa do filme

Documentário

Rua de Mão Dupla (2004)

Resenha por Márcio Ferrari

Márcio Ferrari

Da redação 23/04/2010
Nota 4
Rua de Mão Dupla

O artista plástico, cineasta e fotógrafo Cao Guimarães costuma transitar em espaços paralelos às salas de exibição cinematográfica. No entanto, graças à exuberância visual, não há lugar melhor para ver alguns de seus longas, como ''Acidente'' e ''Andarilho'', do que a tela grande. Pela própria natureza do projeto, isso não se aplica a ''Rua de Mão Dupla'', lançado em áreas de exposição de artes plásticas e que sai agora em DVD. É curioso, talvez irônico, que venha a ser visto em aparelhos de televisão, sendo uma obra que fica muito próxima desse inesperado lugar onde as vanguardas audiovisuais se encontraram com a TV de massa: o reality show.

A ideia do realizador foi convidar pessoas a trocarem de casa com um desconhecido durante 24 horas. Cada participante, num total de três pares, recebeu uma câmera de vídeo para registrar uma hora de imagens da casa onde está hospedado. Elas são o único acesso que o espectador tem ao local. Ao fim da experiência, os participantes dizem como imaginam o dono da casa. Não se sabe se por orientação do realizador ou não, todos acabaram agindo como num jogo de detetives, procurando fios de cabelos em escovas e tirando conclusões a partir das roupas guardadas nos armários.

A primeira dupla é formada por aparentes opostos: um produtor musical bagunceiro e uma oficial de justiça organizada. As outras duas parecem, em princípio, ter mais afinidade: um ''construtor'' (engenheiro?) e um arquiteto e uma poeta e um escritor; mas chega a ser cômico o modo como ''se estranham'' mesmo sem se conhecer.

Os seis personagens moram sozinhos, todos em Belo Horizonte. É razoável supor que cederam à curiosidade voyeurística pela intimidade alheia, talvez esquecidos de que a prática pode gerar prazer mas também repulsa. O filme funciona em parte como um documentário sobre isso tudo: viver sozinho, espionar, investigar, conhecer alguém. No fim, Guimarães dedica a obra ''ao outro''. O aspecto informativo é confundido propositalmente: o espectador tem sua fruição mediada pelo personagem que escolhe as imagens e pelo cineasta que as selecionou na edição, um procedimento que ''didatiza'' a experiência de assistir a Big Brother e outros programas semelhantes.

''Rua de Mão Dupla'' foi encomendado e produzido pela 25ª edição da Bienal de São Paulo, que deu carta branca a Guimarães para fazer o que quisesse. Originalmente, as imagens passavam em dois monitores separados. Em DVD, a tela é dividida em duas e os registros das duplas de ''jogadores'' são vistos simultaneamente. O som (vale dizer que ignorado como recurso expressivo por todos os envolvidos) é o do microfone da câmera, cheio de ruídos. O DVD traz também duas entrevistas, de cerca de 15 minutos cada uma, com o crítico de arte e curador da 25ª Bienal, Agnaldo Farias, e com a pesquisadora Consuelo Lins, que praticamente esgotam todas as questões sobre o filme.

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