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Ficha completa do filme

Drama

Abril Despedaçado (2001)

Resenha por Rubens Ewald Filho

Rubens Ewald Filho

Especial para o UOL Cinema 01/01/2003
Nota 4
Abril Despedaçado

O primeiro trabalho de Walter Salles depois do sucesso mundial de "Central do Brasil", o filme já chegou derrotado e mal falado, ainda que injustamente. Até porque, depois de um grande êxito, as pessoas ficam preparadas para assistir a queda. É humano e cruel, mas esperado.

Embora Waltinho seja uma pessoa que não tema desafios (veja sua ousadia em aceitar fazer uma biografia de Che Guevara), não foi uma boa idéia topar adaptar para o Brasil um livro de Ismail Kadaré (que ainda por cima já havia sido feito para o cinema antes). Dá até para aceitar que uma situação acontecida nos Balcãs suceda de forma semelhante no nordeste brasileiro, mas isso não é desculpa para as falhas.

Um simples letreiro informa que é 1910 no Nordeste. Não ficamos sabendo mais nada. Não temos uma visão mais clara da época, do lugar, da situação, deixando até a dúvida se a fita é uma parábola. Ao contrário de Central, que mais do que uma história sobre uma velha aposentada e um menino, era também um retrato de todo o país, aqui o caso parece isolado. E por demais conhecido: quantas histórias de vinganças familiares já foram contadas? Francamente não era preciso recontar a mesma história de novo.

É verdade que o filme é extremamente bem realizado, tem uma fotografia (de Walter Carvalho) magnífica, dentro do padrão que o próprio Waltinho nos acostumou. O problema básico é que o projeto não precisava ser feito. Não acrescenta muito nem à sua carreira, nem ao tema. Por vezes mesmo a miséria parece bonita demais (e curiosamente o filme é frio, distanciado, com pouca emoção). Basicamente é a história (velha) de duas famílias que vivem se matando e não fazem nada para mudar a situação. Agora chegou a hora de Tonho, o filho mais velho da família mais pobre, vingar a morte do irmão e ele resignadamente cumpre sua missão (as datas são marcadas pelas manchas dos ferimentos da camisa - quando o sangue amarelar, é o momento certo. Isso dá margem à belas imagens).

Aliás, a cena em que ele vai atrás de sua vítima é da melhor qualidade. Também é interessante a forma como que ele vai ao enterro do homem que matou e depois como se prepara para se tornar a vítima, a presa que será caçada. Novamente, Waltinho se confirma como um notável diretor de crianças. Aqui a história é narrada pelo irmão mais novo de Tonho, Pacu, feito com total sensibilidade por Ravi Ramos Lacerda. Por outro lado, o filme já não tem o mesmo rigor de Central, onde todo o elenco era perfeito. Desta vez há falhas gritantes e que prejudicam o resultado. Principalmente a mãe (um papel que poderia ter sido muito bem de Fernanda Montenegro), que deixa muito a desejar.

Há outras falhas no elenco (a irmã da vítima da outra família, a própria vítima que falha no derradeiro olhar, o patriarca cego que tem um bom tipo mas não tem carisma). Talvez pudessem ter fugido um pouco mais do original (além do final). Tonho apenas escapa de casa para acompanhar um circo (levando o irmão que fica fascinando com um livro de histórias). Mas nem tenta escapar de seu destino, no máximo vai atrás de dois atores mambembes (Luiz Carlos Vasconcellos e a novata Flavia Marco Antonio), com uma vaga possibilidade de experimentar o amor carnal. E o clímax é pouco (a seqüência dele andando no balanço, que por sinal foi reduzida depois da exibição controversa no Festival de Veneza).

Colocando "os pingos no is, "Abril Despedaçado" não é um novo "Central do Brasil". Não é uma nova obra-prima. Mas é uma fita de qualidade, com excepcional fotografia, que confirma o talento e exigência do diretor. Só não acrescenta muito. Há um bom livro sobre as filmagens da fita disponívelnas boas livrarias.

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