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24/05/2009 - 18h33

Júri de Cannes quis agradar a muitos filmes, mas acertou no principal

THIAGO STIVALETTI
Colaboração para o UOL, de Cannes
Foi um trabalho difícil para Isabelle Huppert. Enquanto Sean Penn não teve nenhuma obra-prima nas mãos no ano passado, e teve de esperar até o último dia de competição para encontrar a sua Palma de Ouro (o francês "Entre os Muros da Escola"), ela tinha em mãos dois filmes elogiados por unanimidade entre os cinéfilos, profissionais de cinema e jornalistas que circularam em Cannes.
  • Divulgação

    Cena do filme "Das Weisse Band" de Haneke, vencedor da Palma de Ouro

Muito se vai discutir se o alemão "Das Weisse Band", de Michael Haneke, merecia mais a Palma do que o francês "Un Prophète", de Jacques Audiard, mas o fato é que ambos seriam boas escolhas. Todos que conhecem Huppert, pelo gênio forte que exibe em suas entrevistas há mais de 20 anos, já sabiam que ela não teria o menor pudor em premiar um filme com medo de ser acusada de protecionismo - ela trabalhou em dois filmes de Haneke, e ganhou um de seus dois prêmios de melhor atriz com ele em "A Professora de Piano". Foi uma decisão corajosa, para um filme com muitos méritos.

No geral, foi uma premiação espalhada, que procurou agradar a muita gente - dos 20 filmes da seleção, quase metade (nove) saiu premiado.

O prêmio de melhor atriz para Charlotte Gainsbourg em "Anticristo", de Lars Von Trier, também parece guardar uma forte empatia para Huppert. Ninguém melhor do que ela para entender toda a violência e sofrimento a que uma atriz pode se submeter ao trabalhar com um grande cineasta.

Charlotte em "Anticristo", Huppert em "A Professora de Piano", ambas atuaram acima de qualquer limite, em cenas violentas e de mutilação genital, sem medo da exposição e dos comentários. Pode-se discutir as qualidades de um filme como "Anticristo", mas não a atuação de Charlotte. E se ela foi uma ótima atriz, é porque havia um ótimo personagem, e portanto o filme não pode ser visto simplesmente como trash, como querem alguns.

Já o austríaco Christoph Waltz, o implacável coronel Landa de "Bastardos Inglórios", de Quentin Tarantino, deve emplacar ainda uma indicação ao Oscar de melhor coadjuvante no ano que vem. "Quentin, você me devolveu a minha vocação de ator", agradeceu o ator no palco do Palais des Festivals.

Mais tarde, ele explicou a frase: "Tenho 30 anos de carreira. Nos primeiros anos, era tudo maravilhoso, mas chega um momento em que você se vê em um limbo, não sabe que rumo tomar, não sabe se vale a pena. Tarantino me mostrou que, ao contrário do que pensava, minha carreira não está perto do fim".

De resto, como todo ano, sempre se pode achar um grande injustiçado. Se no ano passado foi a animação israelense "Valsa com Bashir", este ano um ótimo filme que não deveria ter saído sem prêmio foi o palestino "The Time That Remains", de Elia Suleiman. Ele merecia mais o prêmio de direção do que o filipino Brillante Mendoza, por "Kinatay".

Mas essa foi certamente uma decisão política do júri. Rodar um longa-metragem nas Filipinas é quase um milagre, e Mendoza faz um filme forte conduzido com estilo. Em entrevistas aqui no festival, o cineasta contou que põe uma cópia do filme debaixo do braço e vai ele mesmo exibi-lo em universidades, já que não encontra distribuidor no país.

Outra crítica pode ser feita ao prêmio de melhor contribuição artística para Alain Resnais - mesmo prêmio que foi dado no ano passado a Clint Eastwood e Catherine Deneuve. O prêmio foi para o diretor, e não para o filme - e "Les Herbes Folles" bem que merecia um reconhecimento, um filme de ideias jovens feito por um cineasta de 87 anos. O próprio Resnais ironizou de leve no palco: "Já que este é um prêmio excepcional, me sinto obrigado a aceitá-lo".

Cannes 2009 foi um ano de melhores filmes do que em 2008, com a presença de mais diretores veteranos, e um conjunto de filmes mais violentos que os do ano passado. Parece que o diretor artístico Thierry Frémaux sabia o que vinha por aí e escolheu a dedo uma presidente do júri habituada a filmes fortes.

O mundo pode andar em crise, mas como o cinema de autor vive mais de ideias do que de dinheiro, a seleção deste ano foi fértil em muitos sentidos.

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