O diretor tailandês Apichatpong Weerasethakul participa de coletiva do filme "Uncle Boonmee Who Can Recall his Past Lives"
Com um nome quase impronunciável, o tailandês Apichatpong Weerasethakul é adorado pelos cinéfilos e um dos cineastas mais cultuados pela revista “Cahiers du Cinéma”. Seus filmes guardam uma relação profunda e misteriosa com a natureza. Depois de “Blissfully Yours” (2002) e “Tropical Malady” (2004), que venceu o Prêmio da Crítica na Mostra de São Paulo, ele apresentou ontem o filme “Ovni” da competição, o fascinante “Uncle Boonmee Who Can Recall his Past Lives” (Tio Boonmee que pode se lembrar de suas vidas passadas).
O tio Boomme vive nas profundezas da floresta tailandesa com a cunhada. Ele sofre de crise renal e deve morrer em breve. Um dia, o fantasma da mulher falecida aparece, e seu sobrinho morto retorna na forma de um macaco-fantasma negro de olhos vermelhos reluzentes. Logo, Boomme começa a recordar suas vidas passadas – não necessariamente como homem, mas como peixe e outras formas da floresta. O filme é livremente inspirado no relato de um homem que viveu em um monastério no nordeste da Tailândia. Com esse enredo, o filme poderia ser ridículo, mas não é: o som que mistura ruídos estranhos e barulhos da natureza, como as folhas ao vento e a água da cachoeira, criam um encantamento único.
“Uncle Boonmee”, o filme, é uma extensão de um projeto maior de Apichatpong, que envolve também uma série de fotografias e uma instalação que será exibida na Bienal de São Paulo em outubro, em paralelo a uma retrospectiva de seus filmes.
“Herdamos uma influência forte da cultura do Camboja sobre a transmigração das almas, a ideia que os humanos trocam de lugar com os animais ao longo da existência”, contou o diretor. “Muitos tailandeses acreditam em fantasmas, e eu também. Uma vez, em Paris, uma mulher apareceu para mim ao lado da minha cama e depois desapareceu. Mas não tenho nenhum medo deles.”
Por pouco Apichatpong não conseguiu vir a Cannes para apresentar seu filme. No momento, Bangkok está tomada por uma guerra civil, com protestos violentos contra o governo no centro da cidade. “Eu precisava retirar meu passaporte na região mais violenta da cidade e não consegui, tive que apelar para várias embaixadas para estar aqui. O país é controlado por um grupo de máfias, e há uma multidão enfurecida destruindo e queimando a cidade. Temos um grande fosso separando os ricos dos pobres, e isso está explodindo agora. É uma situação política violenta, um momento importante da história tailandesa, e creio que tudo isso vai unir o país no longo prazo”.