Berlim, 11 fev (EFE).- Com 60 edições, 15 mil filmes e uma infinidade de momentos importantes ao longo de sua trajetória, o Festival de Berlim completa neste ano o 60º aniversário se consolidando como um expoente mais atípico da tríade de grandes festivais europeus, que se completa com Cannes e Veneza.
A incorreção política e a rebeldia marcaram a história da competição que surgiu durante a militância anticomunista das potências aliadas, quando em 1951 instauraram no setor ocidental de Berlim um aparelho de contrapropaganda frente à República Democrática Alemã (RDA).
Isolado no coração da RDA, a ilha democrática que foi Berlim Ocidental utilizou o Festival de Berlim para projetar filmes ocidentais, apenas a poucos quilômetros da divisa invisível que separava da "outra" Berlim e só dois anos após sobreviver ao bloqueio soviético que os isolou dos aliados.
O infame Muro de Berlim, que marcaria durante décadas a vida da cidade, seria construído dez anos depois.
As autoridades não demoraram a reagir e a criar sua própria variante comunista, com o festival dos filmes democráticas do povo, que logo caiu no esquecimento.
A aparência política do concurso, que não abandonou o Festival de Berlim durante os 60 anos, se soma à personalidade atípica: ocorre nas últimas décadas durante o inverno berlinense afastado do monopólio e do imperativo de elegância de seus concorrentes.
Romy Schneider, Cary Grant, James Stewart e Sophia Loren lideraram a interminável lista de estrelas que caminharam sobre o tapete vermelho do festival, que em sua 60ª edição receberá a nova geração do cinema como Leonardo DiCaprio, Ewan McGregor e Renée Zellweger.
Madonna, The Rolling Stones e Patti Smith dominaram nas últimas edições a trilha sonora do Festival de Berlim, após anos em que atores como Richard Gere e George Clooney utilizaram a tribuna para atacar à administração de George W. Bush.
O compromisso político é, ano após ano, marca registrada de parte dos filmes que competem no festival que, em 1970, viveu um de seus escândalos mais famosos: o júri abandonou o Festival de Berlim, após a exibição de um filme considerado antiamericano, em plena Guerra do Vietnã.
"O.K." de Michael Verhoeven, que contava a violação de uma menina vietnamita por parte de soldados americanos, sacudiu o festival e nove anos depois os países do bloco comunista protestaram pelo excessivo americanismo de "O Franco Atirador" com Robert De Niro.
A história de Festival de Berlim foi escrita ao compasso dos novos tempos e da Guerra do Iraque e das consequências dos atentados de setembro de 2001 que deixaram suas marcas no festival.
De "Um lugar nesse mundo" sobre a guerra do Afeganistão, com a qual Michael Winterbottom ganhou o Urso de Ouro, em 2003, ao documentário "Procedimento Operação Padrão" de Errol Morris, sobre as torturas na prisão iraquiana de Abu Ghraib, o Festival de Berlim demonstrou sua afinidade com os cineastas comprometidos.
Winterbottom é um dos vencedores do Urso de Ouro que competem neste ano na competição oficial, junto de outros grandes do cinema contemporâneo como Zhang Yimou e Roman Polanski.
Rainer Werder Fassbinder, Ingmar Bergman e Jean-Luc Godard também entraram no festival berlinense ao longo de seis décadas, que também deixaram resquícios de frivolidade, com Jack Nicholson mostrando o traseiro nu e o Urso de Ouro de 2001 a "Intimidade" do francês Patrice Chéreau, acusado de pornográfica.
A neve e as baixas temperaturas que castigam Berlim não impedirão à vinda das centenas de jornalistas que a cada fevereiro tomam as imediações da Postdamer Platz, ávidos por bom cinema, com os 400 filmes inscritos.