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06/02/2009 - 10h18

A Dinamarca coloca o Oriente Médio e a guerra ao terror no mapa do Festival de Berlim

ALESSANDRO GIANNINI
Enviado Especial a Berlim
Segundo filme em competição a ser exibido aos jornalistas aqui em Berlim, "Little Soldat", da dinamarquesa Annette Olensen, colocou o Oriente Médio e a guerra contra o terror no mapa do festival. O filme conta a história de uma veterana que volta do front e tem que lidar com uma série de ressentimentos. Portanto, a idéia de que há apenas uma crise rondando Potsdamer Platz não é verdadeira. Há várias crises tematizadas nos filmes em competição. E a financeira é apenas uma delas.

Olensen é, ela própria, uma veterana em Berlim. Desde 2002, quando estreou no longa metragem com "Minor Mishaps", premiado com o Blue Angel Award, participa regularmente do festival. Em 2005, concorreu ao Urso de Ouro com "Nas Suas Mãos", certificado número 34 do Dogma 95, sobre uma prisão feminina na Dinamarca. "Little Soldat", terceiro filme de sua lavra, volta à mostra competitiva. A julgar pela receptividade dos jornalistas, que terminaram a sessão especial para a imprensa aplaudindo o filme discretamente, não deve extrair muito do júri.

Na entrevista coletiva, realizada logo após a sessão, Olensen disse que a motivação inicial era fazer um filme sobre a relação entre pai e filha na idade adulta. "Trina [Dyrholm, atriz principal] e eu conversamos sobre isso faz tempo", disse ela. "Queríamos fazer um filme de gângster, então, resolvemos colocar a questão do tráfico de prostitutas. Conversamos com uma soldado que havia servido no Iraque e ficou claro que tínhamos mais um elemento. Pensamos em como juntar tudo isso e vimos que havia um tema comum: salvação."

No filme, Lotte (Trina Dyrholm) dá baixa do serviço militar dinamarquês e volta para casa assombrada por uma série de traumas causados por aquilo que testemunhou na linha de frente da "guerra contra o terror". O pai, dono de uma empresa de transporte que também trafica prostitutas nigerianas pela Europa, procura-a para compensar a ausência nos tempos de infância. Trata-a como um menino, um rapazote que inicia a vida. E lhe dá emprego como motorista de uma das mulheres que explora, a mesma que considera sua protegida.

Lily (a inglesa Lorna Brown) é uma nigeriana que deixou a filha de 9 anos em Lagos. Entre Lotte e Lilly cria-se uma relação. Ambas querem se libertar do passado, mas somente a "pequena soldado", como chamam-na as meninas que trabalham para o pai dela, quer fazer isso por meio do assistencialismo. Ela quer salvar a amiga das garras do pai falsamente bonachão sem saber se a nova amiga quer qualquer tipo de ajuda. "A questão principal do filme é essa, como salvar alguma coisa, uma pessoa ou um pais", explica Olensen. "Como fazer isso sem colocar as motivações pessoais na frente de seu objetivo."

A metáfora é obvia. Por meio da relação de Lotte e Lily, o filme fala sobre a guerra contra o terror de Bush e as invasões no Afeganistão e Iraque. Segundo um dos produtores do filme, a Dinamarca foi um dos países que integraram a coalizão liderada pelo Exército americano e ainda tem um pequeno contingente no Oriente Médio. Para Trina Dyrholm, uma veterana do cinema dinamrquês que trabalhou com Thomas Vinterberg em "Festa de Família" (1998) e também esteve em "Nas Suas Mãos", a questão é simples: "Quando você tenta salvar alguém, está tentando salvar a si mesmo", disse ela sobre sua personagem no filme. "Com Lotte, é isso que acontece."

Embora tenha participado do movimento Dogma 95, Olensen faz questão de dizer que "Little Soldier" não segue os mandamentos do manifesto criado por Vintergerg e Lars von Trier. Um exemplo está na música, que aparece às vezes com muita ênfase para pontuar algumas cenas. "Eu e o compositor [da trilha] decidimos nos divertir um pouco", diz ela. "Sempre fui comedida ao usar música, mas dessa vez decidi me aventurar um pouco mais nessa área."

"Little Soldat" termina em aberto, sem apontar soluções para as questões que coloca, o que não é necessariamente ruim. "Não queremos impor uma resposta", disse Olensen, ao comentar o desfecho. "Queremos que o público saia do cinema para refletir sobre o que viu." Para complementar, o roteirista do filme, Kim Fupz Aakenson, saiu com a seguinte anedota: "O cinema americano tem as respostas; o cinema europeu tem perguntas. Esse é um autêntico filme europeu". Se não for verdade, a tirada é muito boa.

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