A cidade de São Paulo novamente será o painel do cinema contemporâneo a partir desta quinta (22), quando se abre a 33ª Mostra Internacional de Cinema, numa sessão apenas para convidados da comédia dramática "À Procura de Eric". O filme do inglês Ken Loach, que concorreu à Palma de Ouro em Cannes este ano, foi produzido e protagonizado pelo jogador de futebol francês Eric Cantona, conhecido por suas jogadas brilhantes e pavio curto - o que lhe rendeu uma suspensão de nove meses depois de agredir um torcedor -, além de uma carreira concluída no clube inglês Manchester United, em 1997.
"À Procura de Eric" é a nona parceria entre o diretor e o roteirista Paul Laverty, que juntos assinaram filmes como "Ventos da Liberdade" (2006), Palma de Ouro em 2006, "Pão e Rosas" (2000) e "Meu Nome é Joe" (1998). Quem acompanha a filmografia da dupla sabe que as questões sociais - especialmente da Europa contemporânea - dão o tom ao seu trabalho. Por isso, no começo, "À Procura de Eric" parece um estranho no ninho. Mas ninguém perde por esperar. Este é um legítimo filme de Ken Loach e, ao longo de quase duas horas, seu tema-chave vai emergir.
A presença de Cantona no filme é charmosa, carismática e enigmática. Ele é o ídolo de um carteiro também chamado Eric, interpretado por Steve Evets. Aí reside uma dubiedade do título, que tanto se refere ao ex-jogador de futebol quanto ao personagem, cuja vida cheia de problemas precisa de uma guinada.
Eric, o carteiro, foi casado mais de uma vez, mas seu grande amor ainda é sua primeira mulher, Lily (Stephanie Bishop), mãe de sua filha mais velha. O ex-casal não se fala há décadas, mas agora a filha precisa da ajuda de ambos para cuidar de seu bebê enquanto termina os estudos. Num momento de solidão e reflexão, entra em cena Eric, o ex-jogador, que começa a dar conselhos preciosos ao xará.
A materialização do futebolista é uma espécie de fantasia do carteiro, que sempre viu nele um cara sem limitações - não por acaso, chamado de Rei Eric por seus fãs. As frases do jogador para seu discípulo poderiam ter saído de qualquer manual de autoajuda. Mas a forma como Cantona se 'interpreta' com sagacidade transforma seus comentários em verdadeiras pérolas de sabedoria e humor.
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Há também um episódio famoso e curioso, envolvendo Cantona numa coletiva de imprensa quando ele conta uma história sobre gaivotas. Esta cena está integralmente nos créditos finais do longa. É com a ajuda dessa sabedoria irônica de Cantona que o carteiro Eric tentará resolver seus problemas, o amoroso - a paixão incurável por Lily - e o familiar, quando um de seus enteados envolve-se com um gângster.
A dupla Loach- Laverty novamente lança um olhar amoroso sobre as classes mais baixas. O carteiro e colegas de trabalho - que mais tarde se revelam amigos preciosos - são o retrato bem-humorado de uma parcela da classe trabalhadora que, no fim, representa uma máxima típica dos filmes do diretor: o coletivo é mais forte do que o individual.
Novidades em terras brasileiras Até o próximo dia 5 de novembro, 25 salas de cinema de São Paulo mais o vão livre do MASP exibirão a programação da Mostra, que inclui filmes premiados nos principais festivais de cinema do mundo e alguns inéditos no Brasil - como é o caso de "Lebanon", Leão de Ouro em Veneza, em setembro passado, e "Samsoon e Delilah", que levou o Caméra D'Or, em Cannes.
Como todos os anos, a Mostra tem cardápios para todos os gostos. Aqueles que pretendem montar uma programação temática não terão dificuldades em encontrar filmes que compartilhem algumas coisas. Poetas apaixonados estão em alta em "Brilho de uma Paixão" e "Amor Extremo"; a relação entre cães e homens está na animação "My Dog Tulip" e "Hachiko: Sempre ao Seu Lado"; o futebol é o tema de vários filmes, como o citado "À Procura de Eric" e "Futebol Brasileiro", dirigido por uma cineasta japonesa, e "Maradona", documentário de Emir Kusturica sobre o polêmico ex-jogador, agora técnico da seleção argentina.
Adaptações literárias também entram na seleção da mostra, como é o caso do alemão "Buddenbrooks", baseado em Thomas Mann; do russo "Enfermaria No. 6", inspirado em Anton Tchekov; e "Amerika", baseado num livro inacabado de Kafka.
Muitos dos filmes da Mostra acabam entrando em circuito pouco depois do festival - especialmente os mais badalados como "Abraços Partidos", de Pedro Almodóvar, "O Fantástico Sr. Raposo", de Wes Anderson, e "Aconteceu em Woodstock", de Ang Lee. Por isso, a Mostra pode ser a oportunidade para conhecer filmes que ainda não tem distribuidores no Brasil e, por isso, podem nem entrar em cartaz, como "Alga Doce", de Andrzej Wajda, "Shirin", de Abbas Kiarostami, "Perseguição", de Patrice Chéreau, e dois filmes de Amos Gitai, "Carmel" e "A Guerra dos Filhos da Luz Contra os Filhos das Trevas". Gitai, aliás, é um dos convidados esperados em São Paulo.
O homenageado deste ano é o cineasta grego Theo Angelopoulos, que também deverá vir à cidade. A Mostra exibirá oito filmes do diretor, entre eles o premiado "A Eternidade e um Dia" e o inédito "Trilogia II: A Poeira do Tempo". Outro foco da Mostra deste ano é a cinematografia da Suécia, representada no evento por diretores como Arne Sucksdorff, Jan Troel e Hasse Ekman.
O Brasil está representado com produções inéditas que concorrem ao Prêmio Itamaraty que distribuirá R$ 90.000,00. Entre os filmes selecionados estão os novos trabalhos de diretores como Beto Brant ("O Amor Segundo B.Schianberg"), Suzana Amaral ("Hotel Atlântico"), Daniela Thomas e Felipe Hirsch ("Insolação"), Karim Aïnouz e Marcelo Gomes ("Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo"), Eliane Caffé ("O Sol do Meio-Dia") e Sergio Bianchi ("Os Inquilinos"). Além deles, também serão exibidos clássicos brasileiros restaurados, como "A Hora da Estrela", de Suzana Amaral, e "Terra em Transe", de Glauber Rocha.
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