Com uma exibição do drama de guerra israelense "Lebanon", de Samuel Maoz, Leão de Ouro no Festival de Veneza 2009, termina hoje à noite a 33ª Mostra Internacional de Cinema. A sessão acontece na Cinemateca, logo após a divulgação dos premiados com o troféu Bandeira Paulista. A cerimônia de encerramento começa às 21h.

Dentro da programação do último dia, está prevista a última sessão do mais recente trabalho do iraniano Bahman Ghobadi, "Ninguém Sabe dos Gatos Persas", que levou o Prêmio Especial do Júri na seção Un Certain Regard, no Festival de Cannes, em maio passado, é um manifesto pela liberdade de expressão, pela livre manifestação artística e por tantos outros direitos negados aos iranianos. Ghobadi é um veterano da Mostra e já foi premiado duas vezes: "Canções da Terra da Minha Mãe - Exílio no Iraque" (2002), prêmio do júri de melhor longa de ficção, e "Tartarugas Podem Voar" (2004), prêmio do público de melhor filme estrangeiro e menção especial do júri. Em seu novo filme, o cineasta mais uma vez faz um trabalho que fala direto ao coração, à emoção, sem deixar de lado a inteligência, a sagacidade e um comentário político sobre um Irã conturbado.

Em "Ninguém Sabe dos Gatos Persas", a ação se passa em Teerã e tem como centro um casal de jovens músicos que pretendem sair do país para tocar na Inglaterra. Antes disso, eles mergulham no submundo musical da capital do país, tentando montar uma banda e conseguir no mercado negro os documentos necessários para a viagem.

Alguns tipos de música - especialmente aquelas influenciadas pelos ritmos ocidentais, como rock e solos femininos - são proibidos no Irã, o que obrigou diversos músicos a trabalharem escondidos. A jovem Negar (Negar Shaghaghi) e seu namorado Ashkan (Ashkan Koshanejad) querem, antes de viajar para Londres, fazer uma apresentação em seu país. Nader (Hamed Behdad) é a pessoa que os ajudará a formar a banda e obter os documentos para viajar para o exterior. Ele é uma espécie de agente, cheio de contatos em todas as áreas.

Ghobadi filma a jornada desse grupo com paixão, não apenas musical, mas principalmente pelas pessoas e sua luta pela liberdade. Desse anseio surgem momentos memoráveis, como um grupo de rock pesado que é obrigado a ensaiar num curral, ao lado de vacas, porque na cidade incomodavam os vizinhos que chamavam a polícia.

O rock indie iraniano, tão pouco conhecido no ocidente, brilha em "Ninguém Sabe dos Gatos Persas". Há no país uma grande diversidade de bandas e músicos - inclusive rappers - que apresentam seu trabalho ao longo do filme. As performances servem de trilha para montagens documentais que mostram as ruas, o cotidiano de Teerã, com sua impressionante pobreza. Nas letras das canções, os jovens soltam a voz e protestam.

Creditada como produtora executiva e corroteirista, a jornalista Roxana Saberi, namorada do diretor, foi presa no começo de 2009, acusada de espionagem. Em abril, Ghobadi publicou uma carta aberta, em defesa de Roxana, que foi libertada em maio, pouco antes do início do Festival de Cannes.

Brilho de uma paixão

Outro filme que foi destaque na competição do último Festival de Cannes é o drama "Brilho de uma Paixão", da neozelandesa Jane Campion - Palma de Ouro por "O Piano" (1993) - sobre o poeta John Keats e a grande paixão de sua curta vida, Fanny Browne, interpretados, respectivamente, por Ben Whishaw ("O Perfume") e Abbie Cornish ("Candy").

A vida e obra de Keats (1795-1821) são, na verdade, um pretexto para Campion, que também assina o roteiro, abordar um tema que permeia toda a sua obra: a condição e a posição social da mulher em seu meio e tempo. Fanny é uma jovem que não se encaixa nos moldes da sociedade inglesa em que vive. Gosta de costurar e é uma espécie de estilista, embora o termo nem fosse empregado ainda. Ela mesma cria suas roupas, todas bastante diferentes dos vestidinhos das moças que encontra nos bailes e chás da tarde.O roteiro teve como base as cartas de amor e poemas de Keats - um dos mais famosos, que começa com o verso "Bright Star! Would I were stedfast as thou art", dá o título original ao longa ("Bright Star"). A relação amorosa entre os dois personagens é o combustível e a inspiração para o poeta criar algumas de suas obras mais marcantes no final de sua vida - quando ele pensava que seria esquecido logo depois de sua morte. A maior oposição que Fanny encontra no relacionamento com Keats é o amigo do rapaz e também poeta Charles Brown (Paul Schneider), que protege o colega de todas e quaisquer pessoas que se aproximem dele.

A maioria dos filmes sobre poetas acaba caindo num tom reverencial, transformando o artista numa espécie de criador inatingível e distante, com uma aura de sofrimento e paixão. Aqui, Campion está na contramão, pois o seu Keats é, acima de tudo, humano. A poesia é a sua arte, mas ela é retratada com naturalidade. A própria Fanny confessa que encontra dificuldades para entender poemas.

Fanny é uma personagem complexa e fascinante. A atriz Abbie Cornish desponta como uma séria candidata ao Oscar na categoria, fazendo uma interpretação com nuances de uma personagem tão forte quanto difícil - algo comum na obra de Campion. Outro destaque de "Brilho de uma Paixão" é a reconstituição de época, que nunca chama demais a atenção para si, integrada à atmosfera do filme, assim como a trilha sonora.

NINGUÉM SABE DOS GATOS PERSAS
UNIBANCO ARTEPLEX 1 - 05/11/2009 - 12:00 - Sessão: 1351 (Quinta)

BRILHO DE UMA PAIXÃO
CINEMA DA VILA - 05/11/2009 - 17:40 - Sessão: 1378 (Quinta)

Para mais informações, visite o Especial da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, onde se encontra a cobertura completa do evento com notícias, vídeos, fotos e serviços. Para a programação completa da Mostra, acesse o site oficial.

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