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Ficha completa do filme

Drama

A Paixão de Cristo (2004)

Rubens Ewald Filho

Rubens Ewald Filho

Especial para o UOL Cinema
Nota: 2

Sai em versão simples, sem qualquer extra (a não ser o som DTS) para aluguel e para venda este polêmico filme de Mel Gibson que custou aproximados US$ 30 milhões e rendeu, só nos EUA, mais de US$ 370 milhões -no Brasil, depois de 23 semanas em cartaz, o filme arrecadou R$ 45 milhões, atrás apenas da bilheteria de "Homem-Aranha 2".

Mas cuidado ao comprá-lo, porque tudo indica que ainda virá uma outra edição mais incrementada.

Quanto ao filme propriamente dito, é outra questão. Acho suspeitas as declarações de Mel Gibson, que age como se tivesse uma linha direta e exclusiva com Cristo. Geralmente isso é um mau sinal (outra prova de seu descontrole é o fracasso de sua produção seguinte, "Paparazzi", que ele confiou a seu barbeiro!).

Sou de opinião de que religião não se discute, se respeita. E qualquer filme que chega com uma mensagem de discórdia, desunião e preconceito não é bem-vindo, mesmo sendo sucesso de bilheteria em grande parte do mundo ocidental.

Isso só demonstra que Gibson, o diretor e financiador do filme, é um homem mais esperto e malandro do que deixava transparecer. Melhor marqueteiro do que realizador, ele fez um filme fundamentalista e violento, que não funciona em muitos aspectos. Talvez não seja tão anti-semita quanto se temia -até porque foi cortada a cena mais contundente, aquela em que se dizia que o sangue de Cristo poderia cair sobre os judeus, culpados sobre sua morte-, mas deixa as coisas no ar por uma razão muito simples: nada é explicado, aprofundado.

O filme tem clima de trailer, clipe, MTV. Começa já em plena ação e não explica nada. Não coloca nenhum contexto histórico social-econômico da época. Prega para os já iniciados. Quando os judeus começam a pedir a morte de Cristo diante de Pilatos, isso faz pouco sentido porque não vimos a briga de Cristo no templo, nem conhecemos as razões por que desejam matá-lo a qualquer custo.

Nenhum dos personagens tem existência humana e verossímil. Nenhum ensinamento é aprofundado (ainda que ocorram alguns rápidos flashbacks, eles são inconsistentes). E as cenas de violência acabam se tornando banais e por vezes até ridículas, quando, por exemplo, fica evidente que o corpo do ator está coberto por uma "armadura" de látex, que simula ferimentos e o deixa desengonçado.

Mesmo a Ressurreição, que pensei que fosse a apoteose do diretor, é tratada com ligeireza. As bilheterias do filme vieram provar uma velha lição: nada como ameaçar proibir um filme para torná-lo um sucesso, embora não haja dúvida da existência de um consumidor ávido por esse tipo de produto de fundo religioso.

Suas opções de realizador são curiosas. Fez o filme em línguas mortas, os soldados romanos falam latim popular e todo mundo mais fala aramaico. Como se tratam de línguas mortas, que todos aprenderam foneticamente, fica difícil falar em interpretação (tudo é histérico, gritado, declamado, para dar pausas, sem esquecer o uso intrusivo de uma trilha musical constante).

A fita usa sempre câmera na mão, luz escura (do grande fotógrafo Caleb Deschanel), com Cristo em crise e observado por um diabo andrógino (a bela Celentano), que nada tem a ver com a história, está ali só para dar um toque pessoal do diretor. Enfim, Cristo já está sendo traído por Judas e logo começará sua Paixão.

A verdade é que os romanos são, por menos razões, tão violentos e cruéis quanto os judeus, ou até piores, pura selvageria. As cenas não me comoveram, talvez por precisar estar mais envolvido com os personagens e ter mais tempo para entrar na história, ou simplesmente porque tudo me pareceu falso e por vezes caricatural.

Na Via Crucís, a situação não melhora muito (o personagem mais bem desenvolvido é Cirineu, que ajuda Cristo). O elenco é feito por italianos ou atores do leste europeu, o que faz Poncio Pilatos é o melhor, embora seja ridículo ter uma cena, sem mais nem menos, em que ele quer discutir com a mulher o que é a verdade!

Maria é uma atriz romena que não tem maior luz, enquanto a linda Monica Bellucci faz figuração de luxo como Maria Madalena. Não consigo falar em interpretação de Jim Caviezel como Cristo, porque seu olhar foi modificado na pós-produção (taparam-lhe logo de cara um olho e o outro ficou cor de mel), seu corpo ficou recoberto de chagas de látex e com nariz falso. Ou seja, é um Cristo convencional, bonitão, caucasiano, acima de polêmicas. Justo o contrário do filme, que resulta menos do que prometia.

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