O conflito pela independência da Argélia ainda é uma ferida não cicatrizada que provoca mal estar à França. O filme "Fora da Lei", de Rachid Bouchareb, é um exemplo disso. No Festival de Cannes de 2010, sua exibição para a imprensa teve segurança reforçada, o que incluía duas revistas de bolsa e a proibição de entrar com garrafa d?água. Após a exibição do filme, fica a dúvida se era preciso tanta precaução.
É verdade que o filme toca em assuntos que podem soar tabus para a sociedade francesa, como a atuação da "Mão Vermelha" (Le Main Rouge), um grupo secreto que tinha a conivência do governo de Paris para matar líderes argelinos. Mas os aspectos políticos ficam perdidos em uma trama indecisa entre o melodrama e o drama político.
"Fora da Lei" acompanha uma geração de argelinos a partir da trajetória de três irmãos e sua mãe. Said (Jamel Debbouze) emigra para a França junto com sua mãe e inicia uma vida de pequenos golpes. Abdelkader (Sami Bouajila) é preso durante uma manifestação que se transformou em um massacre de argelinos, em 1945, e, mais tarde, ingressa na luta armada. Messaoud (Roschdy Zem) luta na guerra da Indochina e, após retornar à França, se une a FLN (Frente de Libertação Nacional), grupo armado que defende a independência da Argélia.
O combate à margem da lei francesa dá a "Fora da Lei" um ar de filme de gângster. No entanto, a condução da relação entre os irmãos e entre eles e a mãe é carregado de tons dramáticos, o que tira a força do recado político de Bouchareb.
O filme deixa notar duas principais fontes de inspiração: "A Batalha de Argel", de Gillo Pontecorvo, e "Rocco e Seus Irmãos", de Luchino Visconti. De Pontecorvo, Bouchareb buscou o retrato das massas oprimidas sendo transformadas em forças revolucionárias e, de certa forma, fadadas ao fracasso. Não soa por acaso que as primeiras manifestações de protesto vão ocorrer entre operários da fábrica de carros Renault.
A influência social na desestruturação da família é a contribuição de "Rocco e Seus Irmãos" ao filme. No caso, por mais alienado que seja, Said será sempre influenciado pelo movimento político em torno do futuro da Argélia e dos argelinos.
No entanto, falta ao filme de Bouchareb algum elemento que torne sua estrutura mais coesa. Irregular, o filme foi lembrado pelo Oscar e concorreu a melhor filme estrangeiro.