A diretora Sofia Coppola (centro), que participa de Veneza com ''Somewhere'', posa para foto com os atores Stephen Dorff e Elle Fanning (3/09/2010)
Nem a tempestade que desabou sobre o Lido por volta do meio-dia, provocando falta de luz, inundação do histórico prédio do Cassino, sede do festival de Veneza, abalou a passagem de Sofia Coppola e seu novo drama, “Somewhere”, por aqui.
A diretora norte-americana de 39 anos desembarcou na coletiva do filme com um pequeno atraso – causado pela forte chuva - como a primeira favorita a levar o Leão de Ouro 2010. Foi aplaudidíssima pelos jornalistas presentes, que não fizeram reparos ao quarto longa-metragem da filha do todo-poderoso Francis Ford Coppola – que assina, mais uma vez como produtor executivo, o novo trabalho da herdeira.
Aliás, segundo a própria Sofia, o pai aprovou “Somewhere”. “Papai viu, gostou e disse que só eu podia ter feito este filme”, confidenciou. O filme, de todo modo, tem profundos traços autobiográficos, ao retratar a trajetória de um ator consagrado em Hollywood, Johnny De Marco (Stephen Dorff), que mora em um hotel de Los Angeles – o famoso Chateau Marmont, endereço com enorme história com o show business e onde morreu, em 1982, de overdose de heroína e cocaína, o ator John Belushi.
Sofia lembrou ter crescido em hoteis, acompanhando justamente o pai cineasta, que cuidava de alguma filmagem. Sendo assim, há muito dela mesma na outra protagonista da história, a menina Cleo (Ella Fanning), de 11 anos. Ela interpreta a filha do ator que interrompe sua rotina, até então marcada por excessos, relacionamentos fugazes com mulheres e um profundo vazio pessoal.
A diretora achou interessante ter um protagonista masculino nesta história de cunho pessoal até “por ser diferente”. Ela revela que gosta de “personagens em transição”, uma nítida característica de seu cinema, marcado por títulos como “Maria Antonieta” (2006), “As Virgens Suicidas” (1999) e “Encontros e Desencontros”- este último, exibido em Veneza, há 7 anos.
As raízes italianas do clã Coppola também batem na tela, de um modo bastante satírico, quando De Marco vai receber um prêmio em Milão, no programa “Telegatti” – literalmente, “Telegatos”, com direito à entrega de um troféu na forma do animal. Aliás, em que pese a estranheza, trata-se de um programa verídico.
Diplomática e delicada, como é seu estilo, Sofia justificou essa inserção, negando ter tido uma intenção crítica específica diante da mídia italiana: “Quis apenas mostrar o contraste entre esse mundo do show business de Johnny e o mundo de sua filha. Aliás, há shows desse tipo em todos os países”.
Longe de ser um astro e conhecido por filmes como “Blade” (1998), onde interpretou um vampiro, e “Inimigos Públicos” (2009), Dorff admitiu: “Este é o papel de minha vida”. Ella Fanning, irmã menor de Dakota Fanning, por sua vez, tem apenas 12 anos mas já é uma veterana. Estreou com apenas 3 anos, no drama “Meu nome é Sam”, ao lado da irmã e de Sean Penn. A garota também se credencia como forte candidata ao prêmio Marcello Mastroianni, concedido a atores jovens no festival.
Troca de casais
Diretor com curta filmografia,o francês Antony Cordier renovou o tema da troca de casais em seu drama erótico “Happy Few”, um concorrente ao Leão de Ouro que dividiu bastante as opiniões entre os críticos. Chegou a receber algumas vaias em uma sessão vespertina ontem, em que havia não apenas jornalistas, mas também representantes da indústria cinematográfica.
Os casais são a designer de bijuterias Rachel (Marina Foïs) e o massagista Franck (Roschdy Zem, de “Dias de Glória”), de um lado, e, do outro, a intérprete Teri (Elodie Bouchez, de “A Vida Sonhada dos Anjos”) e o web designer Vincent (Nicolas Duvauchelle). Eles se conhecem, sentem-se atraídos, criam um pacto de encontros regulares trocando parceiros, a princípio sem regras. Num determinado momento, ciúme, e desconfiança contaminam uma situação que, até então, parecia ideal para todos.
Na coletiva do filme, alguns jornalistas lembraram da Nouvelle Vague e de títulos como “Jules e Jim – Uma Mulher para Dois” (1962), de François Truffaut. O diretor Cordier ressaltou as diferenças em relação àquela época: “Meu filme não é ‘Jules e Jim’. No meu, há uma utopia conjugal que não estava lá. Retrato a geração dos anos 2000, que evolui das experiências libertárias de 1968, da liberdade sexual. E também não se trata meramente de adultério burguês”.
Para Cordier, seu filme é “muito obsessivo” mas isto nada tem a ver com o tema abordado. “Para mim, é uma história banal, sobre coisas que acontecem a muitas pessoas, em muitos lugares. Por isso, quis falar disso”.