Conheça o 'esquisitão' por trás dos sucessos mais emocionantes da Pixar
Você gostou de "Toy Story"? E de "Monstros S.A."? E "Up - Altas Aventuras"? Sabe o que eles têm em comum com "Divertida Mente", nova animação da Pixar, que estreia nesta quinta (18)? A resposta é: um dedo --e o coração-- do diretor Pete Docter.
Pete é um dos três animadores que estão na Pixar desde 1990, junto com John Lasseter e Andrew Stanton, quando o trio deu início a "Toy Story", primeiro longa de animação computadorizada da história.
Lá atrás, Pete era um jovem de 22 anos, que nunca havia feito um longa-metragem, mas ajudou a criar a história e a supervisionar a animação daquele que se tornaria o primeiro filme animado a ser indicado ao Oscar de roteiro. 25 anos depois, aos 46, ele tem um Oscar de melhor animação (por "Up") e cinco outras indicações no currículo, é o vice-presidente de criação da Pixar e também o profissional que esteve envolvido no maior número de filmes da casa.
Dos 15 longas já lançados pela Pixar, Docter participou de dez: além de dirigir "Monstros S.A.", "Up" e "Divertida Mente", ajudou a criar as histórias de "Toy Story", "Toy Story 2" e "Wall-E"; fez storyboards para "Vida de Inseto"; emprestou a voz para personagens secundários de "Os Incríveis" e "Wall-E"; e produziu "Valente" e "Universidade Monstros".
Esquisitices
Com feições quase caricaturais, 1,94 m de altura, jeito informal e talento de dublador, Docter poderia ele mesmo ter saído de um desenho animado. E essas "esquisitices" acabam transparecendo em seus filmes, que também são os que mais exemplificam a receita de sucesso do estúdio, conhecida como "cultura Pixar": histórias inusitadas, para não dizer esquisitas, centradas nas relações humanas e na emoção.
"Entrar na mente é uma ideia estranha", comenta ele, em entrevista ao UOL, sobre a trama de "Divertida Mente", que tem como protagonistas as emoções de uma garota no início da adolescência. "Ou mesmo 'Up': voar em uma casa para a América do Sul. Não sei se há muitas pessoas que tentariam vender essa ideia. Acho que se eu fosse para Hollywood e dissesse: 'Tenho uma ideia ótima: um velho vê a mulher dele morrer. Daí ele faz sua casa flutuar', eles diriam 'O quê? Saia daqui'", comenta, aos risos.
A emoção também é algo muito presente nos trabalhos de Docter, como aponta Cláudio de Oliveira, animador brasileiro que trabalhou em "Divertida Mente". "Algo que é bem peculiar a ele, e que podemos sentir em 'Up', é sua sensibilidade para emoções. Ou seja, 'Divertida Mente' é um prato cheio, preparado por um especialista no assunto, o chef Pete Docter", diz, rindo.
Docter concorda. "Quando olho para os meus filmes, as coisas das quais eu sinto mais orgulho são as ideias únicas, esquisitas e divertidas e, mais que isso, as relações entre os personagens. Sinto que, no fim das contas, é por isso que vamos ao cinema. O que é importante para nós na vida são os relacionamentos que temos com as pessoas que amamos. E, nesse filme, pessoas de quem tivemos raiva, com quem ficamos tristes", explica.
Inspiração na filha
Esse lado emocional e a "esquisitice" de Docter são coisas que contribuíram não só para seu filme mais recente, mas também para sua entrada no mundo da animação.
"Eu ainda tenho algumas questões remanescentes por ter passado por momentos difíceis na escola", contou ele em uma entrevista recente. "Acho que, até certo ponto, é por isso que estou na animação, sabe, porque era tão difícil falar com outras pessoas. É muito mais fácil sentar no meu quarto e desenhar, porque também tenho algo a dizer…"
Isso se combinou com outra experiência para fazer de "Divertida Mente" "um filme muito pessoal": observar sua filha Elie, aos 11 anos, começar a mudar de personalidade com a chegada da adolescência.
"Eu estava pensando em ideias para usar. Por algum motivo, pulei para emoções como personagens e pensei: 'isso seria divertido'", contou ele ao UOL, mostrando em seguida seu talento de dublador e imitando as vozes dos personagens Raiva e Medo: "'Vamos bater nele!', ou 'Corram'! Parecia divertido, cômico, personagens que funcionariam bem para animação. Percebi que, claro, teria que dizer algo mais consistente. E minha filha, que fez a voz de Elie [em 'Up'], começou a mudar um pouco, e eu me perguntava o que se passava na cabeça dela. Essas duas coisas pareceram se encaixar bem".
Docter tem dúvidas de que Elie, que hoje tem 16 anos, tenha compreendido o quanto contribuiu para "Divertida Mente". "Eu mais observei ela do que realmente interagi. Não sei se ela mesma sabia o que estava acontecendo. Naquela idade, eu não sabia. Você apenas passa por aquilo e as coisas acontecem com você. Na verdade, acho que uma das coisas principais de crescer é perceber que posso controlar um pouco isso. Se sinto raiva, não significa que eu tenha que agir", acredita.
E Elie não se incomodou em ver sua adolescência inspirando um filme? "Eu tenho consciência do problema (risos), estou aqui falando com vocês e pensando: 'Hum, não sei o que a Elie acharia disso'. Mas acho que ela está em parte lisonjeada de que estejamos falando dela, e em parte com vergonha", diz Docter. E ela gostou do filme? "Ela subestimou. Disse: 'É, legal, pai…'. Acho que ela gostou. Dei para ela uma das camisetas e ela usa bastante". "Ela diz isso agora", acredita o produtor de "Divertida Mente", Jonas Rivera. "Quando tiver 19 ou 20 anos, vai pensar 'Ai meu deus!', vai derreter! (risos)".
Cultura Pixar
Para Docter, só um estúdio que cresceu sob as asas de Steve Jobs (que comprou a Pixar em 1986, quando ela ainda era apenas uma empresa de computação) teria a ousadia de criar uma cultura onde filmes "esquisitos" como os seus são possíveis.
"Steve Jobs, que tinha um foco na tecnologia, abraçou esse estranho sonho de fazer histórias contadas através de animação computadorizada. Ele também confiou nos cineastas para comandar esse estúdio. O fato de ser John [Lasseter, um dos fundadores da Pixar] quem decide quais filmes serão feitos é muito especial, não há nenhum outro estúdio no mundo que seja comandado por um cineasta", diz.
É claro que o fato de ter lucrado mais de US$ 8,5 bilhões com a bilheteria de seus filmes e pertencer à gigante Disney desde 2006 transformou a Pixar em algo um pouco diferente do que era no início.
"Com certeza mudou muito", diz Docter. "É um estúdio muito maior do que jamais foi. Quando eu comecei, tinha umas 50 pessoas na empresa e uma equipe de 150 fazendo 'Toy Story'. Agora são mais de mil. No comecinho, eu sabia o que estava acontecendo com todo mundo. E hoje tem gente que eu pergunto 'Você é novo?', e ele já trabalha aqui há cinco anos. Não estou dizendo que uma coisa é melhor que a outra, só é um ambiente diferente. Temos um ótimo afluxo de pessoas novas muito talentosas. Vejo alguns dos desenhistas de storyboards e fico muito contente de não estar procurando um emprego agora, porque eu nunca seria contratado", conclui, sorrindo.
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